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Relatório de Estabilidade Financeira — Maio 2024

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Sumário acessível_infografia e ícones_Mai2024

 

Sumário executivo

Os riscos para a estabilidade financeira resultam, em grande medida, das potenciais consequências que as tensões geopolíticas e o prolongamento da restritividade das condições monetárias possam ter sobre a atividade económica. No último semestre, observou-se uma redução das vulnerabilidades em resultado da melhoria das condições económicas. Perspetiva-se que a inflação prossiga a trajetória de redução e o crescimento económico em Portugal se mantenha positivo e superior ao da área do euro. De acordo com as mais recentes projeções do Banco Central Europeu e do Banco de Portugal, a inflação em 2024 deverá descer para 2,3% na área do euro e para 2,4% em Portugal, atingindo os 2% em 2025. A economia crescerá em torno dos 2% em Portugal e 0,6% na área do euro em 2024, com projeções mais favoráveis para os dois anos seguintes, com Portugal a crescer acima de 2,2% ao ano, em ritmo superior aos 1,5% e 1,6% previstos para a área do euro.

No plano internacional, o contexto geopolítico tenso, com a manutenção dos conflitos militares na Ucrânia e no Médio Oriente, condiciona os fluxos de comércio internacional e impacta a atividade económica. Assumem especial relevância as considerações de segurança estratégica que podem suportar a fragmentação económica e financeira da economia mundial e pôr em causa um processo de re-globalização mais inclusiva. Acresce o risco de que o ajustamento em curso do mercado imobiliário na China possa ter impacto negativo mais pronunciado na sua economia, com repercussões para a economia global.

A manutenção de condições monetárias restritivas por mais tempo e/ou com efeitos mais prolongados do que antecipado impacta as condições económico-financeiras. A condução da política monetária deverá ter em conta as sinergias conseguidas através da resposta globalmente coordenada, mas deverá também atender à realidade subjacente a cada área económica, o que pode requerer respostas diferenciadas, que reduzam os riscos de uma restritividade excessiva.

No plano nacional, destaca-se um cenário de maior incerteza no processo de decisão política, no quadro de um novo modelo de regras orçamentais europeias, que colocarão novos desafios à condução da política orçamental.

Uma eventual deterioração das condições macroeconómicas que potencie correções abruptas nos preços dos ativos financeiros pode exacerbar os riscos para a estabilidade financeira. Um quadro de deterioração das condições económicas potencia reduções de valor de ativos e o agravamento do serviço da dívida dos setores residentes, embora, nos últimos anos, seja de realçar a consolidação de mitigantes, como a redução do endividamento.

Os riscos associados à situação financeira das administrações públicas têm vindo a diminuir graças à consolidação orçamental e à consequente trajetória de descida do rácio de dívida pública em percentagem do PIB, interrompida apenas pela crise pandémica, quando atingiu um máximo de 138% mas retomada logo de seguida, com o rácio nos 112% no final de 2022 e baixando para 99% em 2023. Esta trajetória de desalavancagem teve reflexo na correspondente melhoria do rating da República. Contudo, a dívida é ainda elevada. Desta forma, as administrações públicas estão expostas à persistência de taxas de juro mais elevadas e à volatilidade nos mercados financeiros internacionais, podendo repercutir-se nos restantes setores residentes pelo contágio nas respetivas avaliações de risco.

As empresas continuaram a melhorar a autonomia financeira e a reduzir o endividamento. O rácio de alavancagem médio, que mede o peso da dívida no total de capital próprio e dívida financeira, desceu em 2023 para 41,3% (42,2% em 2022). Em ano de crescimento da economia, os rácios de endividamento em percentagem do PIB, bruto e líquido de depósitos, reduziram-se para 82% (89% em 2022) e 56% (59% em 2022), respetivamente. A rendibilidade das empresas resistiu ao aumento do serviço da dívida. O EBITDA representou em média 9% do ativo, apenas 0,2 pontos percentuais (pp) abaixo do valor de 2022, máximo desde a crise financeira. No último ano, não se observou uma subida material das insolvências e a qualidade do crédito concedido a empresas não tem apresentado deterioração, o que se reflete na descida do rácio de non-performing loans (NPL) para 5,0%, (6,5% em 2022). Em todo o caso, o efeito acumulado da manutenção de taxas de juro elevadas na atividade económica e nos custos de financiamento, em conjunto com eventuais subidas dos custos de produção e perturbações nas cadeias de abastecimento, poderão potenciar a materialização de risco de crédito, em particular nas empresas mais vulneráveis.

As famílias também registaram uma redução no rácio de endividamento, seguindo a tendência observada desde 2010 e atingindo 85% no final do ano (91% em 2022). A melhoria do perfil de risco do crédito a particulares tem beneficiado da Recomendação macroprudencial introduzida em 2018, que contempla limites à taxa de esforço como um dos critérios de aprovação de novos créditos. Num quadro de subida das taxas de juro, a contenção do incumprimento dos particulares beneficiou ainda da robustez do mercado de trabalho e do aumento do rendimento disponível real. O aumento contido, de 0,2 pp, nos NPL dos empréstimos à habitação levou o segmento dos particulares a apresentar um rácio de NPL de 2,4%, superior em 0,1 pp ao de 2022.

Um cenário de prolongamento da restritividade de política monetária e de agravamento das condições económicas poderá também originar uma redução dos preços no mercado imobiliário, por via do seu impacto sobre a procura. Contudo, os efeitos sobre o sistema bancário nacional deverão ser contidos. Apenas 5% da carteira de crédito à habitação dos bancos tem rácios loan-to-value (LTV) superiores a 80%, o que mitiga o impacto de uma potencial descida dos preços deste mercado. No segmento comercial, a exposição do setor bancário é contida.

O setor financeiro não bancário internacional encontra-se exposto ao risco inerente ao seu modelo de negócio, que tem uma menor disponibilidade de instrumentos e de mecanismos de salvaguarda de liquidez em situações de stress. Em Portugal, o setor não acumulou vulnerabilidades.

O setor bancário português continuou a melhorar a sua situação, caracterizada por níveis de capital, de liquidez e de rendibilidade mais elevados. Foi uma fonte de estabilidade, contribuindo para garantir a regularidade do financiamento da economia. A rendibilidade do setor subiu para 1,28% do ativo (0,69% em 2022), com reflexo positivo nos rácios de capital. Os rácios de fundos próprios totais e de fundos próprios principais de nível 1 (CET1) aumentaram 1,5 e 1,7 pp, respetivamente, situando-se em 19,6% e 17,1%. Os indicadores de liquidez permaneceram elevados e acima dos níveis de 2022, com o rácio de cobertura de liquidez (LCR) a chegar aos 255% e o rácio de financiamento estável líquido (NSFR) aos 151%.

Caso se materializem condições adversas, nomeadamente na atividade económica, com implicações sobre o desemprego, poderemos assistir a uma deterioração da qualidade de crédito. Ainda que o rácio total de non-performing loans (NPL) tenha continuado a diminuir em 2023, de 3,0% para 2,7%, verificou-se um aumento de empréstimos com deterioração do risco de crédito (stage 2). O rácio de empréstimos a particulares em stage 2 aumentou 2,2 pp para 10,4%, com o contributo dos empréstimos à habitação, maioritariamente a taxa variável, o que reflete um aumento do risco de crédito associado ao maior peso do serviço da dívida no rendimento das famílias mais vulneráveis.

A preservação da margem financeira dos bancos é muito relevante para sustentar a geração de capital de forma orgânica, via que tem sido privilegiada na criação de buffers de capital. Num quadro de redução das taxas de juro e subsequente aperto da margem financeira, importará que os bancos portugueses consigam encontrar mitigantes, dada a sua importância na estrutura de resultados.

Perspetiva global da estabilidade financeira

Vulnerabilidades, riscos e política macroprudencial

Principais riscos e vulnerabilidades

Os riscos para a estabilidade financeira resultam, em grande medida, das potenciais consequências que as tensões geopolíticas e o prolongamento da restritividade das condições monetárias possam ter sobre a atividade económica. No último semestre, observou-se uma redução das vulnerabilidades em resultado da melhoria das condições económicas. Perspetiva-se que a inflação prossiga a trajetória de redução e o crescimento económico em Portugal se mantenha positivo e superior ao da área do euro.

No plano internacional, o contexto geopolítico tenso, com a manutenção dos conflitos militares na Ucrânia e no Médio Oriente, condiciona os fluxos de comércio internacional e impacta a atividade económica. Assumem especial relevância as considerações de segurança estratégica que podem suportar a fragmentação económica e financeira da economia mundial e pôr em causa um processo de re-globalização mais inclusiva. Acresce o risco de que o ajustamento em curso do mercado imobiliário na China possa ter impacto negativo mais pronunciado na sua economia, com repercussões para a economia global.

A manutenção de condições monetárias restritivas por mais tempo e/ou com efeitos mais prolongados do que antecipado impacta as condições económico-financeiras. A condução da política monetária deverá ter em conta as sinergias conseguidas através da resposta globalmente coordenada, mas deverá também atender à realidade subjacente a cada área económica, o que pode requerer respostas diferenciadas, que reduzam os riscos de uma restritividade excessiva.

No plano nacional, destaca-se um cenário de maior incerteza no processo de decisão política, no quadro de um novo modelo de regras orçamentais europeias, que colocarão novos desafios à condução da política orçamental.

Uma eventual deterioração das condições macroeconómicas que potencie correções abruptas nos preços dos ativos financeiros pode exacerbar os riscos para a estabilidade financeira. Um quadro de deterioração das condições económicas potencia reduções de valor de ativos e agravamento do serviço da dívida dos setores residentes, embora nos últimos anos seja de realçar a consolidação de mitigantes, como a redução do endividamento.

Os riscos associados à situação financeira das administrações públicas têm vindo a diminuir graças à consolidação orçamental e à consequente trajetória de descida do rácio de dívida pública em percentagem do PIB, com reflexos na correspondente melhoria do rating da República. Contudo, a dívida é ainda elevada. Desta forma, as administrações públicas estão expostas à persistência de taxas de juro mais elevadas e à volatilidade nos mercados financeiros internacionais, podendo repercutir-se nos restantes setores residentes pelo contágio nas respetivas avaliações de risco.

As empresas continuaram a melhorar a autonomia financeira e a reduzir o endividamento. A rendibilidade das empresas resistiu ao aumento do serviço da dívida. No último ano, não se observou uma subida material das insolvências e a qualidade do crédito concedido a empresas não tem apresentado deterioração. Em todo o caso, o efeito acumulado da manutenção de taxas de juro elevadas na atividade económica e nos custos de financiamento, em conjunto com eventuais subidas dos custos de produção e perturbações nas cadeias de abastecimento, poderão potenciar a materialização de risco de crédito, em particular nas empresas mais vulneráveis.

As famílias também registaram uma redução no rácio de endividamento, seguindo a tendência observada desde 2010. A melhoria do perfil de risco do crédito a particulares tem beneficiado da Recomendação macroprudencial introduzida em 2018, que contempla limites à taxa de esforço como um dos critérios de aprovação de novos créditos. Num quadro de subida das taxas de juro, a contenção do incumprimento dos particulares beneficiou ainda da robustez do mercado de trabalho e do aumento do rendimento disponível real.

Um cenário de prolongamento da restritividade de política monetária e de agravamento das condições económicas poderá também originar uma redução dos preços no mercado imobiliário, por via do seu impacto sobre a procura. Contudo, os efeitos sobre o sistema bancário nacional deverão ser contidos. A percentagem da carteira de crédito à habitação dos bancos que tem rácios loan-to-value (LTV) elevados é reduzida, o que reduz o impacto de uma potencial redução dos preços deste mercado. No segmento comercial, a exposição do setor bancário é contida.

O setor financeiro não bancário internacional encontra-se exposto ao risco inerente ao seu modelo de negócio, que tem uma menor disponibilidade de instrumentos e de mecanismos de salvaguarda de liquidez em situações de stress. Em Portugal, o setor não acumulou vulnerabilidades.

O setor bancário português continuou a melhorar a sua situação, caracterizada por níveis de capital, de liquidez e de rendibilidade mais elevados. Foi uma fonte de estabilidade, contribuindo para garantir a regularidade do financiamento da economia.

Caso se materializem condições adversas, nomeadamente na atividade económica, com implicações sobre o desemprego, poderemos assistir a uma deterioração da qualidade de crédito. Ainda que o rácio total de non-performing loans (NPL) tenha continuado a diminuir em 2023, verificou-se um aumento de empréstimos com deterioração do risco de crédito (stage 2), nomeadamente nos empréstimos à habitação, maioritariamente a taxa variável, o que reflete um aumento do risco de crédito associado ao maior peso do serviço da dívida no rendimento das famílias mais vulneráveis.

A preservação da margem financeira é muito relevante para sustentar a geração de capital de forma orgânica, via que tem sido privilegiada na criação de buffers de capital. Num quadro de redução das taxas de juro e subsequente aperto da margem financeira importará que os bancos portugueses consigam encontrar mitigantes, dada a sua importância na estrutura de resultados.

Enquadramento macroeconómico e de mercados

Em 2023, a economia portuguesa cresceu 2,3% em termos reais (9,6% em termos nominais) e o mercado de trabalho permaneceu resiliente. Após dois trimestres de estagnação, a economia portuguesa recuperou no quarto trimestre, alicerçada no consumo privado, que beneficiou do crescimento dos salários reais, e nas exportações, num quadro de melhoria da procura externa e de ganhos de quota adicionais. A dinâmica no último trimestre do ano justificou em grande medida a revisão em alta, face a dezembro de 2023, das previsões da atividade económica para 2024. O mercado de trabalho manteve-se resiliente, com aumento do emprego e manutenção da taxa de desemprego num patamar reduzido, 6,5%, 0,4 pp acima de 2022. O crescimento económico manteve um diferencial positivo face à área do euro, de 1,8 pp, reforçando a convergência da economia portuguesa (Quadro I.1.1).

A taxa de inflação reduziu-se ao longo de 2023, atingindo 1,9% em dezembro (2,9% na área do euro) e resultando numa inflação anual de 5,3% (-0,1 pp que a área do euro). Esta evolução refletiu, em larga medida, a dissipação do forte aumento dos preços dos bens energéticos e alimentares registados nos dois anos anteriores. No início de 2024, como esperado atentos os eventos base, a inflação interrompeu temporariamente a tendência de redução, fixando-se em 2,6% no final do primeiro trimestre, com 2,4% na área do euro. Excluindo os produtos alimentares e energéticos, o IHPC em Portugal atingiu uma variação homóloga de 3,2% em março (3,3% no final de 2023), superior em 0,2 pp à taxa correspondente para a área do euro (diferença de -0,1 pp em dezembro de 2023). Os preços têm crescido nos últimos meses de forma mais significativa na componente dos serviços, em Portugal e na área do euro.

  1. Projeções para PIB e inflação 2024–26 | Taxa de variação anual em percentagem

 

Março 2024

Dezembro 2023

 

2023

2024(p)

2025(p)

2026(p)

2023

2024(p)

2025 (p)

2026(p)

Área do euro

 
 
 

 

 
 
 
 

PIB

0,5

0,6

1,5

1,6

0,6

0,8

1,5

1,5

Inflação (IHPC)

5,4

2,3

2,0

1,9

5,4

2,7

2,1

1,9

Portugal

 
 
 

 

 
 
 
 

PIB

2,3

2,0

2,3

2,2

2,1

1,2

2,3

2,0

Inflação (IHPC)

5,3

2,4

2,0

1,9

5,3

2,9

2,0

2,0

Taxa de desemprego (% pop. ativa)

6,5

6,5

6,5

6,5

6,5

7,1

7,3

7,2

Balança corrente e de capital (% PIB)

2,7

3,6

3,9

4,1

3,0

3,5

3,7

4,0

Fontes: BCE (Projeções macroeconómicas de março de 2024) e Banco de Portugal (Boletim Económico de março de 2024). | Nota: p ― projetado.

Em Portugal, o crescimento anual da economia deverá situar-se em 2,0% em 2024, 2,3% em 2025 e 2,2% em 2026, tendo sido revisto em alta face às projeções de final de 2023, sobretudo para 2024 (+0,8 pp). A economia portuguesa continuará com um crescimento superior ao da área do euro, e com um dinamismo próximo do potencial. A projeção incorpora os efeitos positivos da menor inflação, do impacto expansionista das medidas adotadas no Orçamento do Estado de 2024 e da aceleração prevista para a procura externa. A execução financeira do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e dos restantes fundos europeus, assim como a redução gradual da restritividade das condições monetárias e financeiras beneficiarão também a atividade económica. Neste quadro, o mercado de trabalho deverá manter uma posição favorável, projetando-se acréscimos de emprego, após os máximos atingidos em 2023, aumento dos salários reais e uma estabilização do desemprego.

Estes desenvolvimentos deverão ocorrer num quadro de manutenção dos equilíbrios macroeconómicos fundamentais, em termos de contas públicas e de contas externas. A economia deverá apresentar uma capacidade de financiamento média de 3,9% do PIB em 2024–26, a mais elevada desde o início da área do euro, refletindo a redução adicional do endividamento dos setores residentes.

A inflação deverá continuar a diminuir em Portugal, para 2,4% em 2024 (revisão de -0,5 pp face às projeções de dezembro), 2% em 2025 e 1,9% em 2026. Na área do euro, antecipa-se que a progressiva redução das pressões sobre os custos e o impacto da política monetária do BCE se traduza em reduções adicionais da inflação, para 2,3% em 2024, 2,0% em 2025, e 1,9% em 2026, níveis compatíveis com o objetivo de estabilidade de preços de médio prazo definido pelo BCE.

Os riscos para a atividade económica e para a trajetória da inflação, a nível internacional, estão associados à persistência de condições monetárias restritivas, com efeitos que excedam os antecipados pelas autoridades. Essa restritividade é condicionada pela resiliência da economia dos Estados Unidos superior ao esperado, que adia a redução das taxas de juro oficiais pela Reserva Federal Americana, com impacto nas taxas de câmbio e nas condições de financiamento internacionais. Um diferencial acrescido entre as taxas de juro na área do euro e nos Estados Unidos poderá facilitar a expansão da atividade económica na área do euro, mas propiciar a importação de inflação por via do efeito cambial.

A persistência e a possibilidade de escalar das tensões geopolíticas, a par do ciclo eleitoral em diversos países com peso relevante na economia mundial ao longo do ano, constituem outra fonte de risco macroeconómico. No curto prazo, podem impactar os fluxos de comércio internacional, também penalizados por alterações da confiança dos agentes económicos, e, num prazo mais longo, reforçar uma tendência de fragmentação económica e financeira a nível global. Os choques que podem ser originados nesta esfera têm o potencial de condicionar os preços das matérias-primas e perturbar as cadeias de abastecimento, podendo originar pressões inflacionistas e afetar a atividade económica a nível internacional, tornando mais complexa e incerta a condução da política monetária nas principais economias.

Em sentido contrário, a confirmação da moderação do crescimento salarial e menores lucros unitários, com abrandamento da procura mundial — por exemplo, com a possibilidade de um choque negativo caso o atual ajustamento no mercado imobiliário na China tenha maior impacto no conjunto da sua economia, — deverão conter as pressões inflacionistas.

A nível nacional, acrescem os riscos associados a eventuais atrasos na execução dos fundos europeus e a um cenário de maior incerteza na condução da política económica, num contexto de novas regras orçamentais europeias.

Na reunião de 11 de abril, o Conselho do BCE manteve inalteradas as taxas diretoras reiterando a sua manutenção em níveis suficientemente restritivos durante o tempo que for necessário. A última subida de taxas de juro pelo BCE teve lugar em setembro de 2023. O BCE continuará a seguir uma abordagem dependente dos dados no que respeita às decisões de política monetária. Nos últimos meses, os mercados financeiros têm vindo a atualizar a trajetória futura esperada para as taxas de juro de curto prazo, nomeadamente diminuindo o valor esperado de redução das taxas. As expetativas dos investidores acerca das taxas de juro do mercado interbancário, implícitas nos futuros da Euribor a 3 meses, apontam para uma redução de aproximadamente 60 pb entre 15 de maio (data de fecho dos dados deste relatório) e dezembro de 2024 (Gráfico I.1.1).

Após uma redução no último trimestre de 2023, os custos de financiamento de mercado dos soberanos e do setor privado aumentaram ligeiramente desde o início do ano, tendo o spread face à Alemanha verificado alguma compressão (Gráfico I.1.2). No mesmo período, as taxas de rendibilidade de obrigações de empresas não financeiras e de bancos na área do euro aumentaram 30 e 10 pb, fixando-se em 3,6% e 3,8%, respetivamente.

  1. Taxa de juro implícita nos contratos de futuros sobre a Euribor a 3 meses | Em percentagem

  1. Taxas de rendibilidade da dívida soberana a 10 anos (Portugal e Alemanha) e de obrigações de empresas e bancos na área do euro | Em percentagem

Fonte: Refinitiv (cálculos do Banco de Portugal). | Nota: última observação: 15 de maio de 2024.

Fonte: Refinitiv. | Nota: última observação: 15 de maio de 2024.

A expetativa de redução da restritividade da política monetária global contribui para um aumento da confiança dos investidores e um impulso do apetite pelo risco. A redução progressiva, e mais rápida do que esperado, da inflação tem criado expetativas sobre o início da redução das taxas de juro de referência. Estes desenvolvimentos contribuíram para o aumento do apetite pelo risco por parte dos investidores e, consequentemente, para o melhor desempenho recente de ativos com risco mais elevado (Gráfico I.1.3). Nos EUA, o forte desempenho do mercado acionista nos últimos meses levou a uma maior concentração do mercado, com as maiores empresas a representar uma percentagem historicamente elevada da capitalização bolsista, gerando receios sobre a potencial sobrevalorização dos ativos, em particular os relacionados com a inteligência artificial.

A baixa volatilidade implícita nos mercados acionistas poderá estar a subestimar vulnerabilidades e a levar à tomada excessiva de riscos. Desde o início de 2023, os índices de volatilidade acionista nos EUA e na Europa têm permanecido ligeiramente abaixo das respetivas médias de longo prazo, o que poderá indiciar uma avaliação benigna dos riscos por parte dos investidores (Gráfico I.1.4). Os baixos níveis de volatilidade poderão ser explicados inter alia por: (i) melhor proteção que as ações oferecem contra a inflação, (ii) ausência de contração económica durante o processo de redução da inflação, e (iii) hipótese de que os bancos centrais têm atualmente mais margem para flexibilizar a política monetária em caso de necessidade (Financial Stability Review, maio 2024, BCE). Nos mercados obrigacionistas, a volatilidade tem-se mantido acima da média histórica, em linha com a reação dos investidores à evolução das expetativas acerca das trajetórias de inflação e das taxas de juro diretoras.

A possibilidade de correções abruptas no valor dos ativos financeiros permanece elevada, especialmente se se verificar a deterioração das condições macroeconómicas ou um processo de desinflação menos previsível. O preço de algumas matérias-primas, como a energia e o petróleo, tem vindo a aumentar desde o início de 2024 refletindo as tensões no Médio Oriente. Estes desenvolvimentos poderão originar reavaliações mais acentuadas dos preços dos ativos financeiros, nomeadamente caso se alterem as expetativas de mercado quanto à redução da restritividade da política monetária.

  1. Taxas de rendibilidade por classe de ativos | 16-11-2023 – 15-05-2024

  1. Volatilidade nos mercados acionista e de dívida | Desvios face às médias de longo prazo (em pontos)

Fonte: Refinitiv. | Notas: BTC e ETH referem-se às criptomoedas Bitcoin e Ethereum, S&P500, STOXX EUROPE 600 e FTSE All World aos índices acionistas norte-americano, europeu e mundial, High yield bond ao índice iBoxx EUR Liquid High Yield.

Fonte: Refinitiv. | Notas: Volatilidades implícitas em opções. “VSTOXX” refere-se ao Euro Stoxx 50, “VIX” ao S&P500, “MOVE” à US treasury curve. Última observação: 15 de maio de 2024.

Análise de risco setorial

Administrações públicas

Em 2023, a dívida pública atingiu 99,1% do PIB, registando uma redução de -13 pp face a 2022. Esta evolução resultou da combinação da redução da dívida pública (-4 pp) e, tal como nos dois anos anteriores, da variação positiva do PIB (Gráfico I.1.5). Considerando a dívida pública líquida de depósitos, reduziu-se 12 pp face a 2022, para 95% do PIB. No final de 2023, os depósitos das administrações públicas atingiram 4,3% do PIB, nível semelhante ao verificado no período prévio à crise financeira internacional, e que representou uma diminuição de 1,4 pp face ao final de 2022.

O rácio de dívida pública deverá continuar a diminuir nos próximos anos, contribuindo para a redução da vulnerabilidade do país a choques adversos e melhoria das condições de financiamento externo. Nas projeções de abril de 2024, o Fundo Monetário Internacional (FMI) antecipou para os próximos anos reduções adicionais do rácio, atingindo níveis inferiores à média da área do euro a partir de 2026 (Gráfico I.1.6).

  1. Rácio de dívida pública portuguesa

  1. Projeções do FMI para a evolução da dívida pública | Em percentagem do PIB

Fontes: Banco de Portugal e INE.

Fonte: FMI. | Nota: Projeções de abril de 2024.

O custo das novas emissões de dívida do Estado duplicou face a 2022, atingindo 3,5% em 2023 (Gráfico I.1.7). O aumento do custo foi transversal aos principais instrumentos emitidos, nomeadamente bilhetes do Tesouro (BT) e obrigações do Tesouro (OT). Contudo, a transmissão do aumento das taxas de juro das novas emissões às despesas totais em juros foi contida, tendo o custo do stock de dívida passado de 1,7% para 2,1%. Tal refletiu o montante elevado do stock emitido a taxas fixas e a maturidade média da dívida, que permaneceu ligeiramente acima de 7 anos. As emissões de dívida de médio e longo prazo tiveram uma maturidade original superior a 15 anos. No final de março de 2024, as amortizações de dívida calendarizadas ainda para 2024 representavam 2,5% do stock total de dívida. Para 2025 e 2026, as amortizações calendarizadas de dívida de médio e longo prazo ascendem a cerca de 8% do stock (18 mil milhões de euros) em cada ano, mantendo-se em consonância com anos anteriores. Este perfil reflete o esforço da Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública (IGCP) em alisar o perfil temporal dos vencimentos, evitando concentrações excessivas e, portanto, reduzindo o risco de refinanciamento. Esta atuação ganha importância acrescida quando é expectável que uma parcela crescente da dívida seja colocada nos mercados internacionais, à medida que prossegue a redução do balanço do Eurosistema. No final de 2023, o Eurosistema mantinha 32,1% do stock de dívida soberana nacional (Gráfico I.1.8), em resultado das operações de política monetária não convencionais, intensificadas com o Pandemic Emergency Purchase Programme (PEPP).

  1. Custo e maturidade da dívida pública portuguesa

  1. Estrutura de detentores de dívida pública portuguesa | Em percentagem

Fontes: Banco de Portugal, IGCP e INE. | Notas: O custo médio implícito do stock de dívida corresponde ao rácio entre a despesa com juros e o stock médio de dívida. O custo da dívida emitida em cada período é ponderado por montante e maturidade e compreende BT, OT, OTRV e MTN emitidos no ano correspondente. A maturidade média da dívida de médio e longo prazo emitida inclui emissões de OT e MTN ocorridas no ano correspondente.

Fontes: BCE, Banco de Portugal e IGCP. | Nota: Dados em fim de período.

Assinala-se a trajetória de melhoria da notação de crédito da República portuguesa por parte de todas as principais agências de rating internacionais. No início de março de 2024, concretizou-se o upgrade do rating de longo prazo da Standard & Poors, de BBB+ para A.

Os riscos associados ao desempenho e à situação financeira das administrações públicas têm vindo a diminuir. Todavia, a dívida permanece elevada, apresentando valores comparáveis aos de 2010, apesar de um panorama muito diferente no que toca ao saldo orçamental. Assim, não obstante o ajustamento da dívida pública registado na última década, somente perturbado pelas consequências orçamentais e económicas da pandemia de COVID-19, o seu elevado nível expõe as administrações públicas a flutuações do sentimento nos mercados financeiros internacionais. Contudo, é de referir que existem alguns elementos mitigantes, como seja a maturidade mais longa da carteira de títulos de dívida, bem como o papel estabilizador do BCE, em particular por via do novo TPI (Transmission Protection Instrument).

A possibilidade de um contexto macroeconómico mais adverso, associado, por exemplo, à manutenção de uma política monetária restritiva por um período superior ao atualmente antecipado, amplificaria o custo do serviço da dívida. Os riscos associados à evolução da atividade económica e a um eventual aumento da despesa pública constituem um elemento de pressão adicional. A gestão destas dimensões deve ser assegurada numa perspetiva de sustentabilidade inter-temporal e à luz das regras orçamentais da União Europeia, recentemente revistas. A prossecução da redução da dívida pública é, assim, importante para a dinâmica de crescimento económico e sua resiliência, num contexto em que as taxas de juro deverão situar-se acima das prevalecentes antes da pandemia. Os restantes setores residentes da economia estão sujeitos a efeito de contágio do risco da República nas respetivas avaliações de risco.

Particulares

O rendimento disponível das famílias continuou a crescer, sustentado pela robustez do mercado de trabalho. O rendimento disponível nominal aumentou 6,5% (8,2% em 2022), refletindo o contributo das remunerações dos empregados (Gráfico I.1.9). O crescimento continuado do emprego e dos salários reais tem contribuído para a melhoria da situação financeira das famílias, que registaram aumentos do rendimento disponível real nos últimos três anos (1,9% em 2023).

  1. Variação do rendimento disponível nominal dos particulares e contributos | Em percentagem e pontos percentuais

Fontes: Banco de Portugal e INE. | Nota: (a) Líquidas de transferências em espécie.

Em 2024 o rendimento das famílias deverá continuar a evoluir favoravelmente. Em particular, num contexto de descida da inflação, estima-se que o rendimento disponível real cresça 4%, refletindo o crescimento dos salários e a contenção do desemprego.

A taxa de poupança continua baixa em termos históricos e internacionais, 6,3% do rendimento disponível (Quadro I.1.2). As famílias continuaram a preferir o investimento em ativos reais, em larga medida em habitação, que ascendeu a 5,3% do rendimento disponível (5,8% em 2022). A aquisição de ativos financeiros reduziu-se para 1,4% do rendimento disponível (4,4% em 2022) e teve por base a realocação expressiva de aplicações em depósitos para subscrições de certificados de aforro, concentrada nos 2 primeiros trimestres. As aplicações em certificados de aforro totalizaram 10,2 mil milhões de euros e representaram 5,8% do rendimento disponível (o que compara com 2,7% em 2022, concentrados no quarto trimestre). A capacidade de financiamento dos particulares ascendeu a 1,5% do rendimento disponível (0,9% em 2022) e a taxa de poupança ficou abaixo do máximo observado no período pandémico e é ainda inferior à do período pré-pandémico.

  1. Origem e aplicação de fundos dos particulares | Em percentagem do rendimento disponível

 

2018

2019

2020

2021

2022

2023

Poupança corrente em Portugal

6,8

7,2

11,9

10,6

6,3

6,3

Ativos

7,5

8,4

14,6

13,4

9,8

6,2

Investimentos em ativos reais (a)

4,8

5,0

5,1

5,6

5,8

5,3

Saldo das transferências de capital

-0,6

-0,4

-0,4

-0,5

-0,4

-0,5

Aquisições líquidas de ativos financeiros

3,3

3,8

9,9

8,2

4,4

1,4

Numerário e depósitos em bancos residentes

3,7

3,6

8,3

6,9

5,7

-1,2

Certificados de aforro/tesouro

0,9

0,5

0,5

0,3

2,7

5,8

Ações e outras participações

-0,6

0,8

2,2

2,2

-2,4

-0,4

Regimes de seguros, pensões e garantias

-0,1

1,6

-1,4

-0,5

-0,5

-2,7

Outros

-0,6

-2,7

0,3

-0,7

-1,1

-0,1

Passivos

0,7

1,2

2,8

2,8

3,5

-0,1

Dívida financeira (b)

0,4

1,0

1,5

3,1

2,9

-0,6

Outros passivos financeiros (c)

0,3

0,2

1,2

-0,4

0,6

0,5

Fontes: Banco de Portugal e INE. | Notas: Valores consolidados em termos nominais. (a) Corresponde à soma de formação bruta de capital fixo, variação de existências, aquisições líquidas de cessões de objetos de valor e aquisições líquidas de cessões de ativos não financeiros não produzidos; (b) Corresponde à soma de empréstimos e títulos de dívida; (c) Os outros passivos financeiros incluem os passivos associados a todos os instrumentos financeiros, definidos em sede de contas nacionais financeiras, com exceção de empréstimos e títulos de dívida (dívida financeira); inclui também a discrepância estatística entre os saldos da capacidade/necessidade de financiamento apurada no âmbito da conta de capital e da conta financeira.

O rácio de endividamento dos particulares continuou a reduzir-se. No quarto trimestre de 2023, o endividamento dos particulares foi 85% do rendimento disponível (Gráfico I.1.10). Esta evolução refletiu o aumento do rendimento disponível e um abrandamento do crédito a particulares (Secção 2.2). O rácio de endividamento dos particulares reduziu-se consideravelmente desde 2010, sendo inferior ao da média da área do euro desde 2019, e encontra-se próximo do observado em 2001. Esta redução foi transversal a todas as classes de rendimento, mas mais acentuada nas famílias de menor rendimento. Em Portugal, o peso do crédito à habitação no rendimento disponível das famílias também se encontra abaixo da média da área do euro, 57% em Portugal e 61% na área do euro no final de 2023 (Gráfico I.1.11).

  1. Rácio de endividamento dos particulares | Em percentagem do rendimento disponível

  1. Rácio entre o stock de crédito à habitação e o rendimento disponível | Em percentagem

Fontes: Banco de Portugal e Eurostat (cálculos do Banco de Portugal). | Notas: Valores não consolidados da dívida total. A área cinza corresponde ao intervalo entre o terceiro e o primeiro quartil da distribuição para um conjunto de países da área do euro (Alemanha, Áustria, Bélgica, Eslovénia, Espanha, Finlândia, França, Irlanda, Itália, Países Baixos e Portugal).

A evolução das taxas de juro refletiu-se numa subida relevante dos encargos com o crédito à habitação para a maior parte das famílias endividadas, com aumento do rácio loan-service-to-income (LSTI), que mede o valor da prestação em percentagem do rendimento. A taxa de juro média do stock de empréstimos à habitação aumentou significativamente desde 2022, atingindo 4,7% no final de 2023, valor máximo desde 2009 (Gráfico I.1.12). Neste contexto, observou-se um aumento da percentagem de contratos com LSTI superiores a 50%, que foi acentuado no caso das famílias de menor rendimento, para as quais as medidas excecionais de apoio governamental foram especialmente dirigidas. De notar que o peso das famílias com rendimentos mais baixos no stock de empréstimos à habitação é atualmente reduzido, como observado noutros países da área do euro. Em agosto de 2023, os contratos associados ao 1.º quintil de rendimento representavam apenas 9% do stock de empréstimos à habitação em Portugal. Quase 70% dos contratos terão continuado a ter um LSTI igual ou inferior a 30% (Quadro I.1.4, Relatório de Estabilidade Financeira de novembro de 2023).

Não se registou uma materialização relevante do risco de crédito das famílias. Apesar da rápida subida das taxas de juro, o rácio de NPL do crédito a particulares manteve-se relativamente estável, não obstante o aumento do rácio dos empréstimos em stage 2, de 2,2 pp em 2023, para o que contribuíram a resiliência do emprego e do rendimento disponível real, as renegociações e as medidas de apoio governamentais (Capítulo 2). A melhoria do perfil de risco dos novos mutuários observada nos últimos anos, em consequência da Recomendação macroprudencial introduzida em 2018 relativa aos novos créditos à habitação e ao consumo, também contribuiu para reduzir o incumprimento dos particulares.

A redução das taxas de juro de curto prazo e da taxa de inflação, em conjugação com a robustez do mercado de trabalho, contribuirão para que o incumprimento das famílias continue contido. A perspetiva de redução gradual das taxas Euribor ao longo de 2024 e de 2025, após subidas de 4,6/4,7 pp, nos diferentes prazos, entre o final de 2021 e outubro/novembro de 2023 (Gráfico I.1.13), antevê uma melhoria da capacidade de serviço da dívida das famílias. O peso das novas operações de crédito com fixação da taxa de juro aumentou de 17% em 2022 para 47% em 2023, o que reduz a incerteza no valor do serviço da dívida. A concentração do crédito à habitação e, em menor medida, do crédito ao consumo em famílias de classes de rendimento mais elevado, que têm maior facilidade em acomodar o aumento das prestações dos empréstimos, contribui para mitigar o risco de incumprimento das famílias. Contudo, a potencial materialização de um cenário económico mais adverso, em particular com aumento do desemprego, e a manutenção de taxas de juro elevadas por mais tempo do que atualmente antecipado poderão diminuir a capacidade dos particulares para servir a dívida, potenciando uma maior materialização do risco de crédito.

  1. Evolução da taxa de juro média do stock de empréstimos à habitação | Em percentagem

  1. Expetativas de mercado para evolução das taxas Euribor | Em percentagem

Fonte: BCE (cálculos do Banco de Portugal). | Notas: A área cinza corresponde ao intervalo entre o percentil 10 e 90 da distribuição para um conjunto de países da área do euro (Alemanha, Áustria, Bélgica, Eslovénia, Espanha, Finlândia, França, Irlanda, Itália, Países Baixos e Portugal). Última observação: dezembro de 2023.

Fonte: Refinitiv (cálculos do Banco de Portugal). | Nota: A informação até abril de 2024 diz respeito a dados observados. De maio de 2024 em diante as séries referem-se às expetativas dos agentes de mercado do dia 15 de maio de 2024.

Sociedades não financeiras

Os indicadores financeiros das sociedades não financeiras (SNF) têm vindo a melhorar de forma contínua desde a crise de dívida soberana, destacando-se o aumento da autonomia financeira (i.e., proporção do ativo financiado com capitais próprios). Esta tendência é comum a todos os setores de atividade (Gráfico I.1.14). Destaca-se a evolução da autonomia financeira das pequenas e médias empresas que, desde 2012, registou um aumento de 19 pp, face a uma relativa estabilidade das grandes empresas, que registaram um incremento no último trimestre de 2023 de 3,8 pp.

  1. Autonomia financeira das SNF em Portugal | Em percentagem

Por setor de atividade

Por dimensão da empresa

Fonte: Banco de Portugal. | Notas: A autonomia financeira mede a percentagem do ativo das empresas que é financiada por capitais próprios. Um aumento da autonomia financeira sugere um reforço da capitalização das empresas. A linha a ponteado corresponde ao total das SNF. São utilizados os Indicadores económico-financeiros trimestrais das empresas da central de balanços. O rácio trimestral corresponde ao valor apurado para o ano acabado no trimestre. Última observação: dezembro 2023.

A rendibilidade do ativo das empresas manteve-se elevada, embora interrompendo a trajetória de aumento observada desde 2012, apenas perturbada pela crise pandémica em 2020. A rendibilidade aferida pelo EBITDA cifrou-se em 9% do ativo, reduzindo-se 0,2 pp face a 2022 (Gráfico I.1.15).

  1. Rendibilidade e custos de financiamento: por setor de atividade | Em percentagem

Rendibilidade do ativo das SNF (a)

Custo dos financiamentos obtidos (b)

Fonte: Banco de Portugal. | Notas: (a) Rendibilidade média do ativo definida como o rácio entre o EBITDA e o ativo médio do período. EBITDA, sigla inglesa para resultados antes de depreciações e amortizações, juros suportados e impostos. (b) Os custos de financiamentos obtidos incluem os custos associados a empréstimos bancários, títulos de dívida e outros empréstimos. São utilizados os Indicadores económico-financeiros trimestrais das empresas da central de balanços O rácio trimestral corresponde ao valor apurado para o ano acabado no trimestre.

Estes desenvolvimentos ocorrem no contexto do abrandamento da atividade económica em Portugal e, principalmente, nos seus parceiros comerciais. O índice de volume de negócios da indústria registou uma redução de 3,3% em 2023. No entanto, em conexão com o dinamismo no turismo, este índice aumentou 9,9% nos serviços. De forma transversal aos diversos setores de atividade, o aumento de 6,6% em 2023 do custo do trabalho por unidade produzida (0,5% em 2022), contribuiu para a redução da rendibilidade do ativo das SNF. Não obstante, a evolução dos custos de produção foi heterogénea entre setores, tendo o índice de preços na produção industrial permanecido estável e o índice dos custos de construção registado um aumento médio de 3,9% em 2023.

O aumento das taxas de juro de mercado foi transmitido de forma quase integral aos custos de financiamento das empresas, que passaram de um mínimo de 2,7% no ano terminado em março de 2022 para 4,0% em dezembro de 2023. O predomínio dos empréstimos a taxa variável e o refinanciamento promoveram a transmissão do aumento das taxas de juro de mercado aos custos de financiamento. A eventual substituição futura de empréstimos com taxa fixa contratados no período anterior ao início da subida das taxas de juro levará a um impacto adicional nos custos de financiamento das empresas (Gráfico I.1.16).

  1. Caracterização do stock de empréstimos a SNF | Em percentagem

De acordo com o indexante (Dez. 23)

De acordo com a maturidade residual e o tipo de taxa

Fonte: Banco de Portugal. | Notas: Exposição de empréstimos a SNF segundo a Central de Responsabilidades de Crédito. Dados os arredondamentos, nalgumas discriminações, a soma das parcelas pode diferir ligeiramente do total apresentado.

O rácio de cobertura de custos de financiamento (RCGF) desceu, mas para valores ainda acima dos níveis pré-pandemia. Em média, o EBITDA cobriu 8 vezes os gastos financeiros das empresas (versus 10 vezes em 2022). Apesar da descida, o RCGF manteve-se acima do observado em 2019, de forma generalizada, exceto na indústria e no comércio, setores em que a redução foi mais acentuada (-5). O único setor em que este rácio aumentou foi na eletricidade, gás e água (+3), onde os ganhos em termos de rendibilidade mais do que compensaram o aumento do custo dos financiamentos obtidos.

O aumento de 1,3% da dívida total em 2023 refletiu o financiamento por não residentes. Tal como nos anos anteriores, o crédito externo esteve concentrado num pequeno número de empresas com acesso a este tipo de financiamento. A variação dos empréstimos obtidos junto do setor financeiro residente foi virtualmente nula (Gráfico I.1.17).

Os rácios de endividamento, bruto e líquido de depósitos, reduziram-se 6,7 pp e 3,0 pp, respetivamente, face a 2022 situando-se em 82,3% e 55,5%. Dado o aumento da dívida, o crescimento do PIB nominal constituiu o principal contributo para esta evolução. Os depósitos das empresas reduziram-se 3,8%. Não obstante, o montante de depósitos de SNF manteve-se acima do observado em 2019 (+43%) (Gráfico I.1.17).

  1. Evolução da dívida total e dos rácios de endividamento, bruto e líquido de depósitos

Contributos para a variação da dívida total (a)

Evolução do rácio de endividamento líquido de depósitos (b)

Fonte: Banco de Portugal. | Notas: Valores consolidados. (a) Os valores do rácio de endividamento das SNF em percentagem do PIB são apresentados no topo de cada barra. (b) O rácio de endividamento líquido de depósitos corresponde ao quociente entre a dívida total das SNF deduzida de depósitos e o PIB. (c) Consideram-se no crédito externo os passivos relativos a empréstimos e a títulos de dívida na posse de não residentes. (d) Inclui títulos de dívida em carteira de residentes, créditos abatidos ao ativo no balanço de instituições financeiras monetárias residentes, empréstimos de particulares, créditos comerciais e adiantamentos e outras variações de volume e valor.

O rácio de alavancagem médio, que mede o peso da dívida no total de capital próprio e dívida financeira, desceu em 2023 para 41,3% (42,2% em 2022) confirmando a evolução positiva de posicionamento face à área do euro. Esta convergência observou-se também no que toca à evolução do rácio de endividamento, aferido em percentagem do PIB, que desceu de 89% em 2022 para 82% em 2023 (Gráfico I.1.18).

  1. Evolução da estrutura de financiamento em Portugal e na área do euro (a)

Rácio de alavancagem (b)| Em percentagem

Rácio de endividamento (c)| Em percentagem do PIB

Fontes: Banco de Portugal e Eurostat. | Notas: (a) Valores consolidados. Última observação para Portugal: dezembro de 2023. As séries da área do euro têm periodicidade anual. Última observação para a série da área do euro: dezembro de 2022. A sombreado é representado o intervalo interquartis, apurado com base na distribuição dos rácios de alavancagem das SNF nos países da área do euro, ou seja, corresponde à área definida pelo valor do país identificado como percentil 75 e o valor do país identificado como percentil 25. (b) O rácio de alavancagem é definido como o quociente entre a dívida financeira e a soma do capital próprio com a dívida financeira. O valor da dívida financeira corresponde ao stock de empréstimos e títulos de dívida, enquanto o valor do capital corresponde ao stock de ações e outras participações (passivos) das SNF. (c) O rácio de endividamento corresponde ao quociente entre a dívida total e o PIB do país. Valores apurados com base nas Contas Nacionais Financeiras. Os instrumentos financeiros cotados, de acordo com a metodologia das contas nacionais, estão valorizados a valor de mercado.

A redução das vulnerabilidades estruturais das SNF portuguesas tem-se traduzido numa maior resiliência do setor aos choques a que as economias têm sido sujeitas nos últimos anos, não tendo ocorrido materialização de riscos com relevância sistémica para o sistema financeiro nacional. Em particular, não se observou uma subida material do número de insolvências declaradas de SNF (+73, totalizando 473), mantendo-se em número inferior à média observada no biénio 2018–19 (558). De igual forma, a qualidade do crédito bancário concedido a empresas não tem apresentado deterioração (Secção 2.3).

Não obstante, a atividade das empresas e a sua situação financeira poderão ser afetadas pelo efeito acumulado da manutenção de taxas de juros elevadas sobre a atividade económica e os custos de financiamento, em conjunto com eventuais subidas dos custos de produção e/ou perturbações nas cadeias de abastecimento. Nas empresas mais vulneráveis ou mais expostas a choques específicos, estes desenvolvimentos poderão levar à materialização de situações de incumprimento. Estima-se que a percentagem de empresas em situação de vulnerabilidade financeira (com RCGF inferior a 2) tenha aumentado em 2023 e estabilize em 2024, próximo de 18%, embora para valores inferiores ao observado durante a crise de dívida soberana (cerca de 29%). A heterogeneidade setorial na proporção de empresas em vulnerabilidade, mais elevada nos setores da construção e atividades imobiliárias (Caixa 2), assim como dentro de cada setor, recomenda um acompanhamento próximo da situação financeira destas empresas por parte das instituições de crédito.

Mercado imobiliário residencial e comercial

Mercado imobiliário residencial

O crédito doméstico a particulares garantido por imóveis representa 25,5% do ativo do setor bancário português. O peso desta rubrica justifica um acompanhamento cuidado da evolução do mercado imobiliário residencial e dos riscos e vulnerabilidades a que pode expor o sistema financeiro.

Os preços da habitação começaram a cair na área do euro. Os preços dos imóveis residenciais reduziram-se em 1,1% na área do euro, em 2023, uma correção de preços que se verifica pela primeira vez desde 2013. Alguns países registaram correções significativas, como a Alemanha e a Finlândia, onde os preços das habitações transacionadas se reduziram em 8,4% e 5,6% respetivamente. Noutros, como a Croácia e Portugal, os preços da habitação continuaram a subir, respetivamente 11,9% e 8,2%. A redução no número de transações de habitação é transversal a todos os países (Gráfico I.1.19). Se em 2021, a generalidade dos países registou um crescimento dos preços e do número de transações de habitação, já em 2022, a maioria dos países observou uma redução na quantidade de habitações transacionadas, apesar do aumento dos preços se manter. Em 2023, o ajustamento do mercado continuou e a queda do número de transações de habitação foi agora acompanhada por uma correção nos preços (Gráficos I.1.20 e I.1.21).

  1. Índice de Preços e número de transações de habitação na área do euro | Em percentagem

Fonte: Eurostat. | Notas: O gráfico inclui apenas os países da área do euro para os quais existe informação comparável de preços e transações de habitação (Bélgica, Dinamarca, Irlanda, Espanha, França, Luxemburgo, Países Baixos, Áustria, Eslovénia e Finlândia). Cada ponto no gráfico corresponde a um país.

Os preços da habitação cresceram 8,2% em Portugal, menos 4,4 pp que em 2022. Após um crescimento trimestral de 3,1% no segundo trimestre de 2023, os preços desaceleraram na segunda metade do ano (taxa de variação em cadeia de 1,8% e 1,3%, nos terceiro e quarto trimestres). O preço das habitações existentes aumentou 8,7%, acima do observado para as habitações novas, 6,6%.

Transacionaram-se 136 499 habitações, num total de 28 mil milhões de euros, representando quedas de 18,7% e 11,9%, respetivamente, face a 2022. A queda no número de transações foi mais acentuada para as habitações existentes, 21,4% (redução de 16,5% em valor), do que nas habitações novas, 6,1% (aumento de 2,6% no valor). As transações de habitações existentes representaram 80% do total de transações de habitação. Tipicamente, o preço e a quantidade transacionada nesse mercado apresentam variações mais acentuadas do que os das novas habitações.

  1. Índice de Preços e número de transações de habitação novas e existentes | Em percentagem

  1. Variação dos preços e das transações de habitação — total | Em percentagem

Fonte: INE.

Fonte: INE.

O valor mediano das transações de habitação continuou a aumentar. No quarto trimestre de 2023, o valor mediano por m2 aumentou 7,9% em termos homólogos em Portugal, 7,5% na região da Grande Lisboa e 7,7% no Algarve. As regiões da Grande Lisboa e do Algarve apresentam o valor mediano da habitação mais elevado, sendo superior ao valor associado ao 3.º quartil das vendas a nível nacional. O valor mediano de avaliação bancária na habitação também continuou a aumentar, 5,3% no final de 2023.

O tempo médio de venda de um imóvel estabilizou em torno de 6 meses. As habitações novas, muitas vezes colocadas no mercado numa fase inicial da construção ou em planta, têm um tempo de absorção superior ao das habitações existentes (em 2023, 11 meses por comparação com 5 meses), mas que se reduziu ligeiramente nos últimos trimestres (Gráfico I.1.22). Até 2021, o número de fogos para habitação disponíveis para venda apresentou uma tendência decrescente, mais importante no segmento de imóveis usados. Em 2022 e 2023 verificou-se um aumento do stock de fogos em oferta (na ordem dos 5 mil fogos por ano), para o que terá contribuído a redução das transações de imóveis residenciais (Gráfico I.1.23).

  1. Tempo de absorção | Em meses

  1. Oferta de fogos para habitação | Em milhares

Fonte: Confidencial Imobiliário (cálculos do Banco de Portugal). | Notas: Estes dados compreendem apenas as transações realizadas através de agentes imobiliários. Tempo de absorção é o número médio de meses que medeia entre a colocação em oferta e a transação.

Fonte: Confidencial Imobiliário (cálculos do Banco de Portugal). | Notas: Estes dados compreendem apenas a oferta através de agentes imobiliários.

A evolução da oferta foi condicionada pela reduzida atividade de construção durante os anos subsequentes à grande crise financeira, que restringiu o crescimento do parque habitacional. Depois da forte queda observada com a crise financeira e a crise da dívida soberana, o número de fogos para habitação familiar construídos por ano tem vindo a aumentar lentamente. Entre 2007 e 2014 foram construídos 277 mil novos fogos para habitação, num contexto de acentuada redução do dinamismo no licenciamento e na construção. Entre 2015 e 2023, apesar da gradual recuperação da atividade no mercado, foram construídos 125 mil novos fogos. O licenciamento e a construção de novos fogos para habitação familiar aceleraram em 2023, aumentando 6% e 7% respetivamente (após 3%, para licenciamentos e construção, em 2022) (Gráfico I.1.24). Contudo, a recuperação da atividade de construção tem sido lenta e o número de novos fogos construídos permanece limitado, apesar da trajetória de crescimento que se verifica desde 2016.

Os preços no mercado imobiliário refletem também os custos de construção que permanecem elevados. Entre dezembro 2019 e dezembro 2023, o custo dos materiais de construção e da mão-de-obra subiram 26% e 25% respetivamente. No entanto, o índice de custos dos materiais iniciou uma tendência de redução em meados de 2022 e durante o ano de 2023 reduziu-se em 2,2% (Gráfico I.1.25). O custo da mão-de-obra, por sua vez, continuou a aumentar, 7,3% em 2023, em linha com a subida registada em anos anteriores.

  1. Fogos licenciados e construídos | Em milhares

  1. Índice e variação homóloga dos custos de construção | Em índice 2021=100 e percentagem

Fonte INE. | Nota: Fogos para habitação familiar em construções novas.

Fonte INE.

Nos últimos anos, a atividade de construção tem sido restringida pela falta de mão-de-obra. De acordo com o inquérito aos obstáculos à atividade de construção, metade das empresas de construção inquiridas sinalizam ter obstáculos à atividade e 30% das empresas manifestam dificuldade em contratar pessoal. A atividade de construção é ainda limitada pela falta de materiais, que se tem atenuado em 2023. As percentagens de empresas que apontam ter dificuldade em obter crédito e lidar com o nível das taxas de juro permanecem contidas. Por fim, as empresas do setor reportam um ligeiro aumento da dificuldade na obtenção de licenças.

O aumento da participação de compradores não residentes caraterizou o mercado imobiliário residencial em Portugal nos últimos anos. A localização geográfica de Portugal e as condições de segurança e estabilidade suportam a procura por parte de não residentes e estrangeiros residentes. O crescimento da população estrangeira residente, que aumentou de aproximadamente 400 mil pessoas em 2016 para quase 800 mil em 2022, tem impacto nos preços da habitação.

Em 2023, os compradores de imobiliário residencial não residentes representaram 8% do número de transações e 13% do seu montante. O número de transações por não residentes reduziu-se 3%, tendo sido observada uma diminuição dos compradores residentes noutros países da União Europeia (-14%) e um aumento dos compradores residentes noutros países fora da União Europeia (Gráfico I.1.26). Em 2023, o valor médio de transação dos compradores não residentes foi de 343 mil euros, 77% acima do dos compradores residentes (194 mil euros). O valor médio de 405 mil euros das transações dos compradores não residentes de fora da União Europeia é significativamente superior aos 277 mil euros despendidos por não residentes da União Europeia.

O peso dos compradores não residentes é muito significativo no Algarve, no Norte e na Grande Lisboa. As aquisições de habitação por compradores não residentes localizaram-se maioritariamente no Algarve (29,9% do total, em número), seguindo-se o Norte (17,5%) e a Grande Lisboa (15,6%), contribuindo para o maior crescimento dos preços nestas regiões e para um valor mediano da habitação mais elevado.

O investimento direto estrangeiro (IDE) em imobiliário, residencial e comercial, totalizou 3,9 mil milhões de euros, aumentando 22% face a 2022 (49% em 2022), destacando-se os investidores do Reino Unido (12%), EUA (10%), China (9%) e França (9%). No caso do imobiliário residencial, os compradores não residentes na Área de Reabilitação Urbana (ARU) de Lisboa foram responsáveis por 33% do número de transações de habitação e 41% do montante investido. De fora da União Europeia destacam-se os compradores norte-americanos (16% dos imóveis adquiridos por estrangeiros), britânicos (9%), chineses (8%) e brasileiros (6%) e da União Europeia os compradores franceses (13%) e alemães (5%). Os compradores britânicos e norte-americanos aumentaram o seu investimento face a 2022; as outras nacionalidades referidas, reduziram o número e o valor das transações, destacando-se os compradores chineses, que reduziram o montante investido na compra de habitação em 46%.

  1. Total de transações de habitação em Portugal e peso dos não residentes

Fonte: INE. | Notas: Inclui transações por pessoas singulares e coletivas. O termo “não residentes” refere-se a cidadãos com domicílio fiscal fora de Portugal. No caso de pessoas singulares, o domicílio fiscal é o local da residência habitual. No caso de pessoas coletivas, o domicílio fiscal é o local da sede ou direção efetiva ou, na falta destas, local do seu estabelecimento estável em Portugal.

Existem indícios de sobrevalorização no mercado residencial português. Os indicadores estatísticos continuaram acima dos valores de referência para sinalizar potenciais situações de sobrevalorização. O rácio entre o índice de preços da habitação e o rendimento das famílias estava, no terceiro trimestre de 2023, 23% acima da média de longo prazo e o rácio entre os preços e as rendas 29% acima (Gráfico I.1.27). Também o índice de preços da habitação em termos reais se encontra acima da sua tendência de longo prazo, 16% acima no final de 2023 (Gráfico I.1.28). De igual forma, dois modelos baseados em determinantes macroeconómicos apontam para alguma sobrevalorização do mercado imobiliário residencial (Gráfico I.1.29).

  1. Rácios normalizados de preços da habitação face ao rendimento e às rendas

  1. Desvio face à tendência de longo prazo dos preços da habitação em termos reais

Fonte: OCDE. | Notas: (a) A evolução das rendas reflete o índice de rendas efetivas pagas por inquilinos de residências principais (COICOP 04.1), incluído no cálculo do Índice de preços do consumidor. Consideram-se períodos de sobrevalorização aqueles em que os rácios normalizados se encontram acima do limiar de 100. Última observação: 2023 T3.

Fonte: OCDE (cálculos do Banco de Portugal). | Notas: Tendência de longo prazo obtida utilizando o filtro HP. Consideram-se períodos de sobrevalorização aqueles em que o índice se encontra 10% acima da sua tendência de longo prazo. Última observação:2023 T4.

  1. Preços da habitação e medidas de valorização em termos reais | Índice 2015=100

Fontes: BCE e OCDE (cálculos do Banco de Portugal). | Notas: Os períodos de sobrevalorização e de subvalorização correspondem a situações em que pelo menos dois modelos de um total de três, identificam um desequilíbrio nos preços da habitação. Para mais detalhe metodológico ver Tema em destaque “Metodologias de avaliação dos preços da habitação: uma aplicação a Portugal”, Banco de Portugal, Relatório de Estabilidade Financeira, dezembro de 2019. Última observação: 2023 T4.

Contudo, estas estimativas devem ser interpretadas com especial cuidado, devido às limitações metodológicas e consequente incerteza associada aos resultados. Em particular, poderão não estar a captar adequadamente a participação de não residentes no mercado e os efeitos do turismo na determinação da oferta e da procura no mercado de habitação que foram fatores determinantes para a evolução dos preços neste mercado durante os últimos anos. O indicador de procura de habitação com base em pesquisas no Google apresentado na Caixa 1 pode ser usado como uma ferramenta adicional de avaliação dos preços da habitação.

A percentagem de transações financiadas com crédito cifrou-se em 46% em 2023, igual à média no período compreendido entre 2018 e 2023 (Gráfico I.1.30). Este indicador era de 76% no período anterior à crise de dívida soberana. Em 2023, observou-se um volume significativo de transferências de crédito entre instituições (Secção 2.2), que são contabilizadas pelas instituições de crédito que as acolhem como novos empréstimos à habitação. Este acréscimo nas transferências resulta de medidas legislativas que facilitaram as amortizações antecipadas de crédito à habitação num contexto de subida de taxas de juro. O impacto destes créditos transferidos de uma instituição para outra é estimado em 13 pp, ou seja, excluindo renegociações e transferências a percentagem de novas transações financiadas com crédito terá sido 33%.

  1. Transações de habitação financiadas com recurso a crédito | Em percentagem

Fontes: Banco de Portugal e INE. | Notas: A informação disponível até dezembro de 2014 não permite isolar os novos empréstimos associados a renegociações. Contudo, estima-se que estes empréstimos representassem uma percentagem residual do volume total de novas operações e, por conseguinte, sem impacto na comparação em termos históricos apresentada. Por sua vez, também não é possível isolar o impacto das transferências de crédito entre bancos até 2022. Última observação: 2023 T4.

Desde 2016, os preços da habitação quase duplicaram, enquanto o stock de crédito à habitação teve um crescimento moderado, de 5%. Um crescimento acentuado dos preços da habitação torna o sistema bancário e a economia mais vulneráveis a uma correção de preços neste mercado. Contudo, no caso português, o efeito é mitigado por um crescimento mais moderado do stock de crédito à habitação.

A oferta limitada de habitação nova e o stock acumulado de casas disponíveis igualmente limitado mitigam o impacto sobre os preços em caso de redução da procura. A exposição do setor bancário ao setor da construção é também moderada. Em 2023, o stock de empréstimos à construção representava 9% do total de empréstimos concedidos a SNF, o que contrasta com um peso de 23% em 2009.

De acordo com o inquérito aos promotores e mediadores que operam no mercado imobiliário residencial1, as expetativas relativamente às vendas e procura de habitação recuperaram em 2024, após uma tendência de compressão em 2023. A expetativa de retoma das vendas é acompanhada de uma expetativa de continuação do aumento dos preços dos imóveis residenciais ao longo de 2024.

Mercado imobiliário comercial

Em 2023, os preços do imobiliário comercial a nível global corrigiram em baixa, em resposta ao aumento dos custos de financiamento e aos novos modelos de trabalho remoto. Na área do euro, os preços destes ativos reduziram-se 8,2% (após 1,5% em 2022), alcançando quedas em torno de 11% em França, na Irlanda e também nos EUA. Esta evolução foi transversal, exceção feita a Portugal (Gráfico I.1.31).

  1. Variação do Índice de Preços do Imobiliário Comercial | Em percentagem

Fonte: MSCI.

Em contraste com a área do euro, em Portugal, os preços do imobiliário comercial mantiveram-se resilientes nos diferentes segmentos, crescendo 1,2% em 2023, em termos agregados, (2,5% em 2022). A escassez da oferta de qualidade tem sido identificada pelos operadores de mercado como o principal fator a sustentar a valorização em Portugal. Pelo contrário, na área do euro, a escassez de oferta é menos vincada e tem-se observado uma desvalorização em todos os segmentos do mercado. (Gráfico I.1.32). O segmento de retalho registou um crescimento de 1,9% em Portugal e uma contração de 5,2% na área do euro. Apesar do aumento das taxas de juro, o crescimento do consumo privado contribuiu para suportar o dinamismo deste segmento, mantendo-se este atrativo para os investidores e registando um aumento das yields. No segmento de escritórios, a desvalorização alcançou os 11% na área do euro, enquanto em Portugal se manteve a valorização dos ativos acompanhada pelo abrandamento da atividade em termos de transações, devido à ausência de correspondência entre oferta e procura, esta última dirigida a ativos de elevada qualidade em zonas prime. Também no segmento industrial e de logística, os preços mantiveram-se robustos, devido à escassez de oferta, enquanto na área do euro desceram significativamente, -5,9%%. Por fim, no segmento de hotelaria manteve-se o forte crescimento, 4,6%, associado ao dinamismo e às expetativas favoráveis para o setor do turismo.

  1. Variação do Índice de Preços do Imobiliário Comercial por segmento | Em percentagem

Fonte: MSCI.

Em 2023, aumentou a percentagem de investidores que avaliam os imóveis comerciais em Portugal como caros ou muito caros2. Observou-se, contudo, uma recuperação da confiança para o investimento neste setor, com menos investidores a considerarem que o mercado de imobiliário comercial em Portugal se encontra numa fase contracionista (Gráfico I.1.33). Em alguns países da área do euro, refletindo a correção dos preços observada em 2023, a percentagem de investidores que avaliam os imóveis comerciais como caros ou muito caros reduziu-se, tendo diminuído também a percentagem de investidores que consideram que o mercado está em contração.

  1. Opinião dos operadores de mercado acerca dos preços dos imóveis comerciais | Em percentagem

Fontes: Global Commercial Property Monitor, Royal Institution of Chartered Surveyors — RICS. | Nota: Dados referentes ao quarto trimestre de 2023. Para Portugal incluem-se também os valores para o quarto trimestre de 2022.

O investimento no mercado de imobiliário comercial totalizou 1,7 mil milhões de euros, o valor mais baixo desde 2016 e uma redução de 50% face a 2022. O investimento no mercado imobiliário comercial português é dominado por investidores não residentes, na sua maioria investidores institucionais, que representaram 70% do montante total investido (80% em anos anteriores). Esta caraterística torna o mercado mais sensível aos desenvolvimentos internacionais. O mercado é também caraterizado por uma concentração dos montantes investidos num número relativamente contido de ativos imobiliários de valor muito elevado.

A exposição do setor bancário ao imobiliário comercial é contida, quer por comparação com outros países quer com a exposição do setor ao imobiliário residencial. Os empréstimos a empresas garantidos por imóveis comerciais estão concentrados em PME e distribuídos por diversos setores de atividade. Em muitos casos, o imóvel que garante o empréstimo é um imóvel detido pela empresa para desenvolvimento da sua atividade e não como um ativo imobiliário detido numa ótica de investimento para geração de rendimento pelo arrendamento ou pela venda (Caixa 2). Adicionalmente, os requisitos de capital para este tipo de crédito são superiores ao crédito garantido por imobiliário residencial, o que tenderá a mitigar o impacto sobre os bancos de eventuais desenvolvimentos adversos no mercado. Em setembro de 2023, os empréstimos a SNF garantidos por imóveis representavam 30% do total de empréstimos a SNF em base consolidada, o quarto valor mais baixo para os dados conhecidos da área do euro (Gráfico I.1.34).

  1. Empréstimos a SNF garantidos por imóveis em Portugal e na área do euro — setembro 2023 | Em percentagem do total de empréstimos a SNF

Fontes: BCE e Banco de Portugal. | Notas: Dados em base consolidada. Rácio obtido a partir de valores líquidos de imparidade. Inclui empréstimos a SNF garantidos por imóveis comerciais ou de outro tipo. Dados não disponíveis para Espanha e Irlanda.

O ativo total dos fundos de investimento imobiliário (FII) representaram 7,3% do PIB no final de 2023, abaixo da área do euro, 8,9%, sendo que 68% das unidades de participação emitidas por FII dizem respeito a fundos fechados, com menor risco de liquidez. Os riscos relacionados com a exposição dos FII ao mercado imobiliário comercial são avaliados como baixos (Caixa 2, Relatório de Estabilidade Financeira de novembro de 2023).

A evidência apresentada não indica um aumento dos riscos e vulnerabilidades no mercado imobiliário comercial em Portugal. A contida exposição do setor bancário ao imobiliário comercial contribui para que desenvolvimentos adversos neste setor tenham um impacto reduzido na estabilidade do sistema financeiro.

Setor financeiro não bancário

Manteve-se a tendência de redução do peso do ativo do setor financeiro não bancário e das interligações entre subsetores do setor financeiro (Gráfico I.1.35). Os fundos de investimento e as sociedades de seguros e fundos de pensões (SSFP) destacam-se em termos de interligações, uma vez que os depósitos e títulos de dívida e capital emitidos por bancos constituem parte significativa do ativo destas entidades. Enquanto investidores institucionais que agregam fundos de aforradores e os canalizam, reduzem o risco mediante a diversificação das aplicações. É desta forma que as exposições ao setor bancário dominam as interligações entre subsetores do sistema financeiro.

A importância relativa do setor das SSFP tem-se reduzido ao longo do tempo, fruto do decréscimo dos ativos sob gestão associados ao ramo vida do setor segurador e, de forma menos acentuada, aos fundos de pensões, apenas parcialmente compensado pelo aumento de atividade do ramo não vida. A partir do início da crise pandémica em 2020 têm vigorado regimes de exceção que despenalizam a nível fiscal a desmobilização antecipada dos Planos Poupança Reforma (PPR), impactando esta atividade. Em 2023, a evolução ocorrida nos ativos das SSFP foi fortemente influenciada pela extinção do Fundo de Pensões do Pessoal da Caixa Geral de Depósitos, cujos ativos e responsabilidades foram absorvidos pelos Fundos de Segurança Social.

  1. Dimensão relativa e interligações do sistema financeiro, em Portugal e na área do euro

Fontes: BCE e Banco de Portugal. | Notas: Valores não consolidados. Para o cálculo do ativo financeiro foram considerados depósitos, títulos de dívida, empréstimos, ações e outras participações de fundos de investimento e ações cotadas. No caso dos bancos, o último valor do ativo financeiro em percentagem do PIB disponível para a área do euro refere-se a dezembro de 2022.

Na área do euro, durante o período de taxas de juro muito baixas, observou-se uma acumulação de vulnerabilidades a choques adversos no setor financeiro não bancário. Até 2022, o crescimento muito acentuado deste setor, em particular dos fundos de investimento, foi acompanhado pela tomada acrescida de risco, em termos da qualidade dos ativos e da maturidade dos investimentos. Nalguns casos verificou-se também o aumento da alavancagem, direta ou através do mercado de derivados, e não se assistiu a um reforço dos buffers de liquidez.

Neste contexto, as taxas de juro elevadas reduziram os incentivos para a tomada excessiva de risco, o que é associado à diminuição dos riscos e vulnerabilidades para a estabilidade financeira, não obstante os riscos decorrentes da transição. Contudo, a manutenção de taxas por um período mais longo do que o esperado e um ritmo não antecipado de retirada das medidas de política monetária não convencionais podem dar origem a maior volatilidade nos mercados financeiros e à materialização do risco de crédito, afetando as carteiras de ativos destes intermediários. Os principais fatores de risco identificados para a área do euro incluem também uma concentração crescente das exposições a títulos de capital de um número cada vez menor de emitentes. Esta situação tornará mais possível que situações de fragilidade idiossincrática possam vir a assumir natureza sistémica.

Em Portugal não existe evidência de acumulação de vulnerabilidades, não tendo ocorrido crescimento exponencial do balanço e/ou aumento de maturidade dos ativos ou da alavancagem. Não obstante, o setor financeiro não bancário nacional está exposto a riscos de contágio, caso se materializem riscos neste setor na área do euro.

Num prazo mais alargado, pode ocorrer alguma redução da atividade e da capacidade de intermediação destes subsetores, caso as remunerações oferecidas às poupanças aplicadas em fundos de investimento, fundos de pensões ou produtos do ramo vida do setor segurador não sejam atrativas. Alterações de contexto, inter alia, de natureza fiscal ou da forma de financiamento das reformas podem concorrer para a perda de atratividade destes investimentos. Adicionalmente, a atual baixa taxa de poupança das famílias tende a limitar as novas subscrições, o que pode colocar desafios à gestão de liquidez.

 
Fundos de Investimento

O stock de unidades de participação emitidas pelos fundos de investimento aumentou 3,9 mil milhões de euros em 2023, totalizando, em dezembro, 40 mil milhões de euros (15% do PIB). Esta variação é justificada sobretudo pela valorização das unidades de participação existentes (2,1 mil milhões de euros) e pela conversão de sociedades não financeiras do ramo imobiliário em fundos de investimento imobiliário (FII), com impacto de 1,9 mil milhões de euros. No que toca aos Fundos de Investimento Mobiliário (FIM), observou-se alguma recuperação das perdas de valor.

As amortizações e resgates de unidades de participação emitidas pelos fundos de investimento foram próximas das subscrições. Os fundos de investimento mobiliário (obrigações, ações, mistos e outros) mantiveram alguma dinâmica, com subscrições líquidas positivas, enquanto os fundos de investimento imobiliário (FII) registaram subscrições líquidas negativas, embora continuando a constituir a política de investimento mais relevante (36% do total de unidades de participação emitidas em dezembro de 2023) (Gráfico I.1.36). O aumento do stock de unidades de participação em 2023, contrasta com a redução registada em 2022, quando se observaram transações negativas de montante significativo, destacando-se os FII e os fundos de obrigações.

  1. Unidades de participação emitidas pelos fundos de investimento: stocks, transações e outras variações, por tipo de fundo | Em mil milhões de euros

Posições em fim de período

Transações e outras variações de valor e de preço

Fonte: Banco de Portugal. | Nota: OVVP refere-se a Outras variações de volume e de preço, incluem-se valorizações/desvalorizações, reclassificações e outras variações de volume não explicadas por transações.

Os particulares continuam a ser o principal setor investidor em fundos de investimento. As famílias detinham 50% do valor gerido pelos fundos de investimento imobiliário e 92% dos fundos de investimento mobiliário. Em contrapartida, a exposição do setor financeiro a estes ativos tem vindo a reduzir-se, situando-se em 14%.

O imobiliário comercial é o principal ativo das carteiras dos fundos de investimento imobiliário. Os ativos desse segmento perfaziam 9,5 mil milhões de euros de investimento (ou 75% dos ativos imobiliários dos fundos). Ao contrário de que se observou na área do euro, estes imóveis não se desvalorizaram (Secção Imobiliário). A taxa de ocupação dos imóveis dos fundos imobiliários continuou a situar-se acima de 85% em dezembro de 2023.

Eventuais correções de preços no mercado imobiliário, em particular no comercial, poderão colocar pressão na liquidez dos fundos de investimento imobiliário. Não obstante, no mercado português alguns fatores atuam como mitigantes para a materialização do risco de liquidez a nível dos FII. Os fundos fechados, menos expostos a este risco, representam mais de 60% das unidades de participação emitidas. O rácio de liquidez dos FII abertos tem vindo a aumentar, situando-se ligeiramente abaixo da média da área do euro, sendo residual o seu financiamento através de dívida. Acresce que existem comissões de resgate desincentivadoras de uma massiva desmobilização de capital (Caixa 2 do Relatório de Estabilidade Financeira de novembro de 2023).

Sociedades de Seguros e Fundos de Pensões (SSFP)

As responsabilidades por reservas técnicas das sociedades de seguros e fundos de pensões diminuíram 3,7%3. No setor segurador, a emissão de prémios brutos reduziu-se 1,9% face a 2022, enquanto os montantes pagos aumentaram 12,1%. Os prémios emitidos no ramo vida diminuíram 14,3% e as contribuições para os fundos de pensões caíram 32%. Por seu turno, os prémios emitidos no ramo não vida aumentaram 10,4%, refletindo o aumento da atividade económica e dos preços.

A evolução do ramo vida do setor segurador e dos fundos de pensões decorreu em grande parte da dinâmica do mercado de PPR (Planos Poupança Reforma). Os resgates aumentaram 57,2% em 2023, beneficiando da medida que despenalizou ao nível fiscal a mobilização antecipada destes instrumentos caso os fundos levantados fossem utilizados para amortizar empréstimos à habitação. As subscrições reduziram-se 5,3%, o que se poderá justificar pelo aumento de remuneração de aplicações alternativas de poupança (Secção 1.3.2).

A carteira de ativos das sociedades de seguros reduziu-se 0,7%, enquanto a dos fundos de pensões caiu 11,2%, de acordo com a Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF). Caso não tivesse ocorrido a extinção do Fundo de Pensões do Pessoal da Caixa Geral de Depósitos, ter-se-ia observado um crescimento de 5%.

O ativo das sociedades de seguros e fundos de pensões tem uma elevada exposição aos mercados de dívida soberana e privada e a unidades de participação de fundos de investimento. Em dezembro de 2023, o peso da dívida pública e privada nas carteiras de investimento das sociedades de seguros e de fundos de pensões representava 62% e 50%, respetivamente (Gráfico I.1.37). A partir de 2021, a exposição das sociedades de seguros a títulos de dívida pública reduziu-se em termos absolutos e em proporção da carteira, sendo substituída pelo aumento do stock de unidades de participação. Em 2023, a exposição a fundos de investimento representava 21% e 36% da carteira das empresas de seguros e de fundos de pensões, respetivamente. Dada a sua exposição, estes setores encontram-se expostos a riscos de crédito e de mercado, embora de forma diferenciada. No caso das sociedades de seguros, a exposição ao risco de taxa de juro é mitigada pela duração curta dos ativos em carteira, mas a qualidade creditícia dos emitentes dos títulos situa-se no limite inferior da categoria de investimento. No que toca aos fundos de pensões, a qualidade creditícia dos títulos é superior, mas a exposição a risco de mercado é maior.

  1. Ativo das Sociedades de seguros e Fundos de pensões | Em percentagem do total da carteira

Fonte: ASF.

Em 2024, tendo em conta a evolução esperada das taxas de juro, é expectável alguma reversão do impacto líquido positivo que se registou em 2022 e 2023 na situação patrimonial do ramo vida no setor segurador e dos fundos de pensões. Uma vez que nestes setores a duração das responsabilidades é superior à dos ativos em carteira, ceteris paribus e para o mesmo aumento das taxas de juro, a redução das responsabilidades é superior à desvalorização dos ativos. Devido ao “efeito desconto”, o aumento (diminuição) das taxas de juro de mercado é tendencialmente favorável (desfavorável) a estes intermediários financeiros.

Contudo, a manutenção de taxas de juro elevadas tende a aumentar o risco de crédito das famílias e empresas, de forma transversal ao setor financeiro. Em conjunto com eventuais episódios de materialização do risco de liquidez, a materialização do risco de crédito pode traduzir-se em perdas para o SSFP, caso a situação financeira dos emitentes dos títulos em carteira se deteriore.

No caso de alguns segmentos do ramo não vida, os impactos negativos do aumento da inflação sobre a rendibilidade dessas linhas de negócio tendem a dissipar-se. Em particular, naquelas que apresentam menor duração das responsabilidades e/ou onde aumentou o custo de regularização dos sinistros (por exemplo, no seguro automóvel, face ao aumento dos custos de reparação dos veículos seguros e/ou dos gastos médicos associados a danos corporais).

A ASF considera que os níveis de solvabilidade do setor segurador conferem resiliência e margem de absorção face a desenvolvimentos adversos4. Adicionalmente, o setor segurador nacional apresenta risco de liquidez contido, decorrente, em particular, do peso dos ativos líquidos nas carteiras de investimento.

Outros subsetores financeiros

Os outros intermediários financeiros (OIF) e instituições cativas e prestamistas são um grupo muito diverso de intermediários financeiros não autorizados a aceitar depósitos. Os auxiliares financeiros são entidades cuja atividade consiste em auxiliar a intermediação financeira, não incorrendo elas próprias no risco de intermediação. Estes três tipos de entidades constituem os outros intermediários e auxiliares financeiros (OIFAF).

No final de 2023, as instituições cativas e prestamistas representavam 72% do total do ativo dos OIFAF. Estas incluem as sociedades gestoras de participações sociais (SGPS), os prestamistas (que concedem crédito garantido pelo penhor de bens) e as entidades de finalidade especial (SPV, na sigla inglesa) que obtêm fundos em mercados abertos para financiar empresas do grupo. O ativo destas entidades reduziu-se 4,6% face a 2022, destacando-se o impacto da deslocação de uma SGPS relevante para outro país. Os outros intermediários financeiros exceto SSFP são uma categoria residual e diversificada, que inclui as sociedades de titularização de crédito.

A atividade desenvolvida por estas entidades não coloca riscos de natureza sistémica ao setor financeiro português.

Outros riscos e desafios para o setor bancário

A relevância sistémica da digitalização resulta do seu potencial de disrupção do sistema financeiro, a par do seu carácter inovador. A conjugação destes fatores justifica a monitorização da digitalização do setor de serviços financeiros e, sempre que necessário, a adoção de medidas para mitigar os riscos que lhe estão associados e permitir que instituições e clientes bancários possam beneficiar destas tecnologias. As autoridades competentes nacionais e europeias prosseguem o desenvolvimento de um quadro regulamentar e de supervisão que integre as diversas matérias relacionadas com a digitalização.

O aumento do número e sofisticação de ciber incidentes, num enquadramento de crescente digitalização e interligação do sistema financeiro e aumento das tensões geopolíticas, sublinha a importância da resiliência operacional para a estabilidade financeira. É essencial que as instituições e as infraestruturas do sistema financeiro continuem a reforçar a sua resiliência operacional, tendo em consideração potenciais impactos no sistema financeiro decorrentes de fragilidades da própria instituição/infraestrutura de mercado. É também de grande relevância a participação nos exercícios de teste de esforço baseado num cenário de incidente de ciber segurança que o Banco Central Europeu e o Banco de Portugal estão atualmente a realizar, e a capitalização do conhecimento que instituições e autoridades podem adquirir com este exercício. O exercício conduzido pelo Banco Central Europeu iniciou-se a 2 de janeiro de 2024 junto das instituições de crédito significativas sob a sua supervisão direta, com enfoque na resiliência das instituições individuais. Posteriormente, no início de abril, o Banco de Portugal alargou o exercício a uma amostra adicional de instituições de crédito sob a sua supervisão direta e/ou com relevância sistémica a nível nacional, e alargou o seu âmbito de forma a considerar interligações entre instituições e a resiliência do sistema como um todo.

No último semestre, destacam-se ainda os trabalhos de implementação dos cinco pilares do DORA (Regulamento (UE) 2022/2554 relativo à resiliência operacional digital do setor financeiro), aplicável a partir de 17 de janeiro de 2025, e o contributo do Comité Europeu do Risco Sistémico (ESRB, na sigla inglesa) para o quadro conceptual de abordagem sistémica ao ciber risco, com a publicação, em 16 de abril, do relatório Advancing macroprudential tools for cyber resilience – Operational policy tools.

Ao nível dos riscos associados à digitalização merecem ainda referência os desenvolvimentos associados à Inteligência Artificial (IA) e aos novos meios de pagamento. A cautela das instituições financeiras na integração da IA nas suas funções chave tem constituído um mitigante. Adicionalmente, a aprovação pelo Parlamento Europeu do Regulamento de Inteligência Artificial (referida em inglês como EU AI Act) a 11 de março de 2024 constitui um marco significativo no desenvolvimento do enquadramento regulamentar aplicável a todos os setores. Ainda no contexto regulamentar, prosseguem os trabalhos associados à implementação do MiCAR (Regulamento (UE) 2023/1114 relativo aos mercados de criptoativos), parcialmente aplicável a partir de 20 de junho 2024 e a discussão do pacote legislativo europeu com o objetivo de estabelecer as condições para emissão e utilização do euro digital, não sendo expectável a sua finalização em 2024.

Também as alterações climáticas assumem crescente relevância nos atuais riscos e desafios que se colocam ao sistema bancário. Os últimos dados científicos divulgados pelos principais organismos internacionais confirmam que em 2023 foram ultrapassados recordes climáticos em diversas dimensões, incluindo eventos climáticos extremos com danos substanciais.

O decorrente encurtamento do período de ajustamento acarreta efeitos potencialmente disruptivos, com a materialização acrescida de riscos de transição na economia e, consequentemente, no sistema bancário. Estes riscos serão mais imediatos e percetíveis para as empresas de setores particularmente expostos a uma transição climática abrupta devido aos seus elevados níveis de emissões de Gases com Efeito de Estufa (GEE), diretas e indiretas, e de intensidade energética (os designados CPRS, na sigla inglesa), mas podem ter um alcance mais generalizado. O ajustamento poderá afetar a viabilidade de certas atividades/contrapartes, conduzir a variações abruptas no valor de ativos, dando igualmente origem a ativos improdutivos (stranded assets), com implicações no sistema financeiro, cuja materialidade dependerá da exposição a essas empresas/setores e do grau de disrupção do processo de ajustamento.

É importante compreender a vulnerabilidade do sistema financeiro a choques relacionados com riscos climáticos num horizonte de curto/médio prazo, verificando-se a este respeito importantes desenvolvimentos. A Comissão Europeia, como parte da sua Estratégia de financiamento da transição para uma economia sustentável, incumbiu, em março de 2023, as três Autoridades Europeias de Supervisão, o BCE e o ESRB, de efetuarem um exercício de teste de esforço, que se realizará uma só vez. Pretende-se avaliar o impacto dos compromissos assumidos em matérias de política climática no sistema financeiro, bem como a sua capacidade de apoiar no curto a médio prazo a transição para os objetivos de 2030, incluindo a meta de redução de emissões face a 1990 em 55%, em condições de stress, considerando ainda os efeitos de contágio entre setores.

Também os planos de transição climática, pela sua perspetiva forward looking, constituem uma fonte de informação que pode contribuir para robustecer o quadro de análise da exposição das instituições aos riscos climáticos. Os planos de transição têm vindo a ser objeto dos trabalhos de diversas entidades a nível internacional. É o caso da Network for Greening the Financial System (NGFS, na sigla inglesa), que publicou em maio de 2023 uma primeira análise aos standards e práticas existentes no âmbito dos planos de transição. Em abril de 2024 publicou, adicionalmente, um conjunto de recomendações sobre os planos de transição das instituições financeiras para dar resposta às alterações climáticas.

Outro desenvolvimento relevante para o aprofundamento das análises dos riscos climáticos, incluindo na perspetiva da estabilidade financeira, foi a publicação por parte do BCE, em abril de 2024, de uma versão atualizada dos indicadores estatísticos relacionados com o clima - iniciativa enquadrada no plano de ação do BCE, de julho de 2021, para incluir considerações sobre as alterações climáticas na sua estratégia de política monetária.

Num contexto de aceleração do processo de transição e da atual adaptação do enquadramento regulatório em relação ao tratamento prudencial dos riscos climáticos, conforme aludido no primeiro Relatório anual do Banco de Portugal sobre a exposição do setor bancário ao risco climático, torna-se fundamental que as instituições prossigam o desenvolvimento de técnicas para identificar como, e em que medida, os riscos ambientais (mas também sociais e de governação) se traduzem em riscos financeiros.

O progresso das instituições financeiras na abordagem aos riscos financeiros relacionados com o clima depende em larga medida de as empresas, suas contrapartes, fazerem progressos semelhantes, incluindo nas áreas dos planos de transição, mas também das divulgações e da abordagem às lacunas de dados.

A necessidade de avultado investimento privado, em complemento ao investimento público, visando a transição para uma economia hipocarbónica reabre preocupações em torno da adequação da arquitetura institucional da União Europeia (UE) para assegurar os fluxos de capital necessários a essa transição e para fazer face a crises no sistema bancário.

Um mercado de capitais europeu aberto, líquido e integrado nos mercados globais será crucial para desbloquear o capital privado para financiar as necessidades de investimento da UE, incluindo no âmbito das transições verde e digital em curso. Na prossecução do projeto da União dos Mercados de Capitais (“Capital Markets Union” ou CMU, na sigla em inglês), releva o papel do setor financeiro não bancário na diversificação das opções de financiamento disponíveis para as empresas, para além do crédito bancário.

O Plano de Ação do Eurogrupo, aprovado em março de 2024, procura dar um impulso decisivo na concretização de uma CMU. Este plano identifica as áreas prioritárias para ação política e iniciativas concretas para a sua prossecução.

Também nas conclusões do Conselho Europeu, de abril de 2024, os líderes europeus sublinharam a importância da criação de uma verdadeira CMU e, com esse objetivo, progredir-se de forma decisiva nas iniciativas em curso.

É igualmente importante avançar na conclusão da União Bancária, nomeadamente através da criação do mecanismo europeu de garantia de depósitos e do robustecimento do regime de gestão de crises. Recorde-se, a este respeito, a proposta legislativa de revisão do regime de gestão de crises bancárias e dos sistemas de garantia de depósitos nacionais (Crisis Management and Deposit Insurance review ― CMDI). Este regime foi apresentado pela Comissão Europeia, em abril de 2023, tendo em vista o aperfeiçoamento do regime de resolução europeu para bancos de pequena e média dimensão e/ou com modelos de negócio mais tradicionais. Esta revisão, ainda em negociação no Conselho, poderá constituir um passo importante para o fortalecimento da União Bancária.

A CMU e a União Bancária estão interligadas: mercados de capitais integrados facilitam atividades bancárias transfronteiriças e permitem aos bancos diversificar, tornando-os mais resilientes. E um sistema bancário mais integrado e resiliente promove o funcionamento ordenado e integração dos mercados de capitais.

Em matéria de supervisão preventiva do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo (BC/FT), o Banco de Portugal manteve um acompanhamento muito próximo do processo de alteração, no plano europeu, dos quadros normativos de referência nesta área e uma supervisão contínua (onsite e offsite) especialmente focada nas áreas, tipologias de clientes, serviços e produtos de maior risco.

Na primeira dimensão destaca-se o acompanhamento da fase final do processo de negociação do pacote europeu de propostas legislativas denominado “AML Package”, apresentado pela Comissão Europeia em julho de 2021. A este propósito sublinha-se o facto de, embora não tenha sido ainda formalmente adotado, ter já sido alcançado um acordo político sobre todos os diplomas que o integram, incluindo sobre o local onde ficará sedeada a nova autoridade europeia (AMLA), Frankfurt.

Em matéria de supervisão, destaca-se a conclusão da segunda fase do ciclo inspetivo sobre a temática dos riscos associados à obtenção de autorizações de residência para investimento (ARI), a execução de uma ação de inspeção onsite especificamente dirigida a um produto financeiro com risco significativo de BC/FT, e a realização de ações supervisivas reforçadas de acompanhamento contínuo de um conjunto de medidas de supervisão emitidas sobre temas de elevada criticidade em matéria de prevenção do BC/FT.

Destaca-se ainda a preparação da segunda reunião do Fórum de prevenção do BC/FT do Banco de Portugal (“Fórum BCFT”), que teve lugar no dia 11 de abril de 2024.

Política macroprudencial

A estratégia e instrumentos do Banco de Portugal enquanto autoridade nacional responsável pela execução da política macroprudencial foram definidos em 2014. A implementação da política macroprudencial tem se caracterizado por uma atitude preventiva na antecipação e na resposta a fatores que possam indiciar o acumular de fontes de risco sistémico. A abordagem implica uma adaptação sistemática de metodologias para a sinalização de risco e estimação do impacto das medidas.

A política macroprudencial tem-se adaptado às diversas fases do ciclo financeiro (Tema em destaque “Política Macroprudencial em diferentes fases do ciclo financeiro: o caso português”). Num contexto em que a incerteza quanto à materialização dos riscos para a estabilidade financeira se mantém elevada — motivada pelas elevadas taxas de juro e pelo potencial de desaceleração do crescimento económico — as medidas macroprudenciais têm sido fundamentais para assegurar que o sistema financeiro dispõe de reservas de capital suficientes para absorver perdas não antecipadas, continuando a financiar a atividade económica.

A evolução do ciclo financeiro não indiciou a acumulação de risco sistémico em Portugal, tendo como referência o ano de 2023. Para tal contribuíram a redução do défice da balança corrente, a redução do crédito a empresas e particulares e o aumento do PIB. A evolução dos preços da habitação contribuiu em sentido inverso (Gráfico I.1.38).

O potencial impacto sobre o PIB de um evento extremamente negativo decorrente do acumular de risco sistémico cíclico ou de um período de stress financeiro permaneceu relativamente baixo no último trimestre de 2023. De acordo com o modelo Growth at Risk (GaR), a taxa de variação homóloga do PIB prevista a um ano no caso de um evento negativo extremo, com 10% de probabilidade de se materializar, é de -1,6% (o que compara com -1,7% no trimestre anterior e -4,1% no primeiro trimestre). O ligeiro agravamento face ao segundo trimestre (-1,1%) deve-se ao indicador de stress financeiro (CLIFS), tendo o contributo do PIB sido menos negativo (Gráfico I.1.39).

  1. Indicador de risco sistémico cíclico doméstico | Desvios padrão em relação à mediana

  1. Contributos das variáveis explicativas para o Growth-at-Risk | Em percentagem e pontos percentuais

Fontes: BCE e BIS (cálculos do Banco de Portugal). | Nota: O IRSD, desenvolvido por Lang et al. (2019), é um indicador compósito que pretende identificar a acumulação de desequilíbrios cíclicos gerados no setor privado não financeiro doméstico. Para uma descrição pormenorizada do IRSD para Portugal, ver o Relatório de Estabilidade Financeira de junho de 2019.

Fontes: BCE, Banco de Portugal e INE (cálculos do Banco de Portugal). | Nota: O Growth-at-Risk é a estimativa do percentil 10% da distribuição da taxa de variação homóloga do PIB para Portugal, para um horizonte de projeção de 1 ano, com base em informação disponível desde 1991 T1 até ao trimestre da projeção. O modelo inclui como variáveis explicativas o PIB, um indicador de stress financeiro (CLIFS) e o indicador de risco sistémico doméstico (IRSD). Os contributos estão apresentados em pontos percentuais.

Neste contexto e tendo em conta as perspetivas para a conjuntura macrofinanceira, o Banco de Portugal decidiu manter em 0% a taxa de reserva contracíclica de fundos próprios (CCyB) para o segundo trimestre de 2024.

O Banco de Portugal identificou sete grupos bancários como outras instituições de importância sistémica (O-SII). Para cada O-SII, o Banco de Portugal definiu também os respetivos requisitos de reserva de fundos próprios, em percentagem do montante total das posições em risco. No caso do grupo LSF Nani, a reserva foi também aplicada ao nível do Novo Banco.

O Banco de Portugal introduziu uma reserva de fundos próprios para risco sistémico setorial (sSyRB) de 4%, com entrada em vigor a partir de outubro de 2024, sobre o montante de posições ponderadas pelo risco de carteira de particulares garantidas por imóveis destinados à habitação, aplicada a bancos que utilizam o método das notações internas (IRB, na sigla em inglês). Esta reserva, de natureza preventiva, tem como objetivo aumentar a resiliência das instituições face à eventual materialização futura de risco sistémico no mercado imobiliário residencial em Portugal, decorrente de uma potencial inversão do ciclo económico e/ou de uma correção significativa inesperada dos preços do imobiliário residencial. Complementa assim a recomendação macroprudencial sobre as condições dos contratos de crédito. Para além disso, a reserva setorial de capital, ao alterar o custo relativo, em termos de requisitos de capital, associado a diferentes classes de ativos, pode também contribuir para desincentivar uma excessiva exposição do setor bancário a imobiliário.

Tendo em vista o aumento da resiliência do sistema bancário face a um risco sistémico setorial específico, o sSyRB é considerado uma ferramenta mais eficaz, comparativamente ao CCyB (Caixa 3).

Em maio de 2024, o Banco de España decidiu aplicar a reciprocidade do sSyrB, implementado pelo Banco de Portugal, tendo em conta a materialidade das exposições dos bancos espanhóis ao mercado imobiliário residencial português.

A pronunciada subida de taxas de juro que se fez sentir a partir do segundo trimestre de 2022 levou o Banco de Portugal a rever em 2023 a Recomendação macroprudencial para crédito à habitação. O choque na taxa de juro considerado no cálculo da taxa de esforço DSTI (Debt-Service-to-Income) diminuiu de três pp para 1,5 pp. Esta revisão foi aplicada para contratos com taxa variável ou mista e maturidade superior a 10 anos, tendo sido proporcional para as restantes maturidades.

As instituições continuaram a cumprir, globalmente, as orientações definidas na Recomendação macroprudencial relativa aos novos créditos à habitação e ao consumo. O perfil de risco dos mutuários das novas operações de crédito à habitação continuou a melhorar, com uma redução da percentagem de crédito concedido a mutuários de risco elevado. Do montante associado a novos créditos à habitação e ao consumo 91% foram concedidos a mutuários com um rácio DSTI inferior ou igual a 50%. Relativamente ao rácio Loan-to-Value (LTV), a quase totalidade das novas operações tiveram associado um valor inferior ou igual a 90%, sendo que em 68% dos novos contratos o LTV foi inferior ou igual a 80%. O rácio LTV médio das novas operações de crédito para habitação própria e permanente diminui quase dez pp face ao terceiro trimestre de 2018 e seis pp face a 2022, fixando-se em 69% (Relatório de Acompanhamento da Recomendação macroprudencial, março 2024). Note-se que os bancos aplicam os critérios da Recomendação macroprudencial a todos os novos créditos que concedem, que podem incluir mutuários que transferem os seus créditos de uma outra instituição.

Até ao momento, o Comité Europeu de Risco Sistémico (CERS) classificou a política macroprudencial adotada por Portugal como adequada e suficiente para mitigar os riscos sistémicos e vulnerabilidades identificados no mercado imobiliário residencial. O Banco de Portugal, enquanto autoridade macroprudencial, não tem sido objeto de qualquer alerta ou recomendação específica por parte do CERS. Em 2023, a classificação do risco para Portugal manteve-se como de nível médio, à semelhança das avaliações anteriores, de 2019 e 2021.

Atualmente, decorre a revisão do quadro operacional da política macroprudencial ao nível da UE (Comunicação da Comissão Europeia COM/2024/21), encontrando-se em fase de avaliação e auscultação aos stakeholders. Esta revisão tem como objetivo assegurar a eficácia da política macroprudencial, bem como de dotar as autoridades de instrumentos macroprudenciais dirigidos a outros setores que não o bancário e a outras fontes de risco sistémico, como seja o clima e o cibernético. Foi atribuída particular ênfase a três áreas principais: (i) utilização e libertação das reservas de capital; (ii) consistência na utilização do toolkit macroprudencial para os bancos pelas autoridades nacionais e (iii) capacidade do toolkit macroprudencial endereçar os riscos convencionais e as novas fontes de risco, nomeadamente o cibernético, os decorrentes das alterações climáticas e os associados ao setor imobiliário comercial. Relativamente ao setor não bancário, o objetivo é mitigar o acumular de risco sistémico, gerir o impacto de eventos sistémicos originados por desequilíbrios de liquidez, alavancagem excessiva, interconexão entre as Instituições Financeiras Não Bancárias (IFNBs) e entre estas e os bancos, e colmatar a falta de consistência e coordenação entre os quadros macroprudenciais nacionais da UE.

Sistema bancário

O setor bancário português continuou a melhorar a sua situação em 2023, caracterizada por níveis de capital, de liquidez e de rendibilidade mais elevados5. O aumento da rendibilidade, para 1,28% do ativo teve reflexo positivo nos rácios de capital. Manteve uma situação de liquidez robusta e estabilidade na qualidade de ativos. Este resultado foi obtido num contexto de desinflação e desaceleração da atividade económica, mas com taxas de juro de política monetária e de mercado superiores às de 2022.

A melhoria da rendibilidade alicerçou-se no aumento da margem financeira, de 1,65% para 2,80% do ativo, refletindo a rápida transmissão da subida das taxas de juro oficiais às taxas de juro de empréstimos concedidos pela banca, apenas posteriormente transmitida às taxas de juro dos depósitos. O decorrente aumento do produto bancário permitiu acomodar a subida dos custos com imparidades e provisões, que permaneceram, todavia, contidos.

O rácio de NPL bruto total teve uma redução adicional em 2023, de 0,3 pp, não obstante um ligeiro aumento de 0,2 pp do rácio no segmento dos empréstimos a particulares para habitação. De igual forma, o rácio de empréstimos em stage 2 aumentou no segmento dos particulares, 2,2 pp, com destaque para os empréstimos à habitação, contribuindo para o aumento do rácio na carteira total.

Num contexto de aumento dos encargos com o stock de crédito à habitação, maioritariamente contratado a taxa variável, a resiliência do mercado de trabalho e a recuperação do rendimento real das famílias contribuíram para a contenção do incumprimento, tal como o reduzido peso dos mutuários com menores níveis de rendimento no total da carteira. Relevam também as medidas específicas de apoio do governo e a proatividade dos mutuários para mitigar a subida das prestações mensais, por via da renegociação atempada das condições contratuais originais junto da instituição credora (renegociações comerciais) ou da transferência do crédito para outra instituição. O aumento destas operações, num contexto de menor procura por novo crédito à habitação, foi potenciado pela concorrência acrescida entre instituições e pela suspensão temporária da exigibilidade da comissão de reembolso antecipado para os contratos de crédito à habitação a taxa variável. Em muitas situações, as novas condições traduziram-se na fixação da taxa de juro, tipicamente por um período entre 2 e 5 anos, o que reduz a incerteza no serviço de dívida para o devedor e estabiliza a receita com juros para o banco durante esse período.

O balanço do sistema bancário português mantém uma concentração na exposição a ativos imobiliários e a títulos de dívida pública. Na exposição ao imobiliário destacam-se os empréstimos a particulares garantidos por imóveis destinados à habitação, em que o risco do colateral se desvalorizar abaixo do montante do crédito é mitigado pela fração diminuta de empréstimos com LTV superior a 80%. Na carteira de títulos de dívida pública, para além de uma crescente diversificação geográfica, aumentou o peso da carteira a custo amortizado, que se perspetiva que seja detida até à maturidade, e, para os principais grupos bancários, reduziu-se a sua duração média.

Os diversos indicadores de liquidez continuam a sinalizar uma posição robusta e, assim, uma sensibilidade menor do setor a perturbações nos mercados financeiros internacionais. De igual forma, assistiu-se ao reforço do capital dos bancos, para um patamar semelhante ao da área do euro, potenciando a capacidade de as instituições absorverem choques adversos e continuarem a financiar a economia nas fases menos favoráveis dos ciclos económicos.

Rendibilidade

A rendibilidade do ativo (na sigla inglesa, ROA) aumentou 59 pb face a 2022, situando-se em 1,28% (Gráfico I.2.1), valor máximo da última década. Esta evolução foi transversal ao sistema bancário nacional e da área do euro, embora mais marcada em Portugal, que apresentava um rácio superior em 0,57 pp ao da área do euro em setembro de 2023. A dispersão entre instituições do sistema bancário manteve-se praticamente inalterada, com aumentos quer do percentil 10 quer do percentil 90 (Quadro I.2.1).

A evolução do ROA foi marcada pelo aumento da margem financeira (contributo de 1,15 pp), que em 2023 representava 2,8% do ativo médio. O aumento das provisões e das imparidades para crédito e, em menor grau, dos custos operacionais contribuíram para atenuar esta subida. O resultado de exploração, que inclui as componentes tipicamente mais estáveis dos resultados (margem financeira e comissões líquidas, deduzidas dos custos operacionais), aumentou 1,07 pp do ativo médio, para 2,14%. Foi o maior contributo da margem financeira para o crescimento do ROA em Portugal que levou a que este rácio fosse superior ao da área do euro.

  1. ROA e contributos para a variação | Em percentagem e em pontos percentuais do ativo médio

Fonte: Banco de Portugal. | Nota: A rendibilidade do ativo (ROA) consiste no resultado líquido em percentagem do ativo médio. A rubrica “Outros resultados” inclui outros resultados de exploração, goodwill negativo, apropriação de resultados de filiais, joint ventures e associadas, resultados de ativos não correntes classificados como detidos para venda e não qualificados como operações descontinuadas, aumento ou diminuição do fundo para riscos bancários gerais, resultados de modificações/renegociações contratuais dos fluxos de caixa, resultado de operações descontinuadas antes de impostos e impostos sobre lucros do exercício.

O aumento expressivo da margem financeira resultou, em larga medida, de a subida dos juros recebidos exceder a subida dos juros pagos. Este aumento teve origem, principalmente, em juros recebidos de empréstimos indexados a taxa variável. Teve também contributos positivos da carteira de títulos de dívida, destacando-se o aumento dos juros recebidos nos títulos emitidos pelas Administrações Públicas e por SNF. Os juros dos depósitos também aumentaram, em especial de particulares, o que atenuou o efeito positivo observado do lado do ativo. A subida das taxas de juro foi acompanhada por uma transferência de depósitos à ordem para depósitos a prazo.

  1. Rendibilidade | Em percentagem do ativo médio

 

2021

2022

2023

Margem financeira

1,42

1,65

2,80

Títulos de dívida

0,27

0,35

0,61

d.q. Administrações públicas

0,15

0,22

0,33

d.q. Sociedades não financeiras

0,08

0,08

0,16

Empréstimos

1,29

1,58

2,97

d.q. Sociedades não financeiras

0,53

0,60

1,07

d.q. Particulares

0,67

0,83

1,62

Outros ativos

0,00

0,02

0,26

Depósitos

-0,03

-0,17

-0,81

d.q. Sociedades não financeiras

-0,02

-0,06

-0,12

d.q. Particulares

-0,05

-0,09

-0,36

Títulos emitidos

-0,07

-0,10

-0,17

Outros passivos

-0,04

-0,03

-0,05

Comissões líquidas

0,71

0,72

0,74

Custos operacionais

-1,24

-1,30

-1,40

Resultado de exploração

0,88

1,07

2,14

Resultados de operações financeiras

0,15

0,10

0,15

Provisões e imparidades líquidas

-0,49

-0,33

-0,60

Provisões

-0,26

-0,14

-0,31

Imparidades para crédito

-0,19

-0,17

-0,27

Outros resultados

-0,09

-0,15

-0,40

ROA

0,46

0,69

1,28

Percentil 10

0,03

0,14

0,85

Percentil 90

0,77

1,21

1,88

Fonte: Banco de Portugal. | Notas: A rendibilidade do ativo (ROA) consiste no resultado líquido em percentagem do ativo médio. O resultado de exploração é o agregado da margem financeira e das comissões líquidas deduzido dos custos operacionais.

Em 2023, o diferencial entre as taxas de juro ativas e passivas em operações com o setor privado não financeiro (SPNF) aumentou para o stock e para as novas operações. O aumento foi mais expressivo para o stock, tendo, nos últimos dois anos, ultrapassado o registado para as novas operações. Esta evolução resulta de a taxa média nos novos empréstimos ser inferior à observada nos stocks (Secção 2.2) atendendo à prevalência de empréstimos a taxa variável. O diferencial entre as taxas de juro de stocks de empréstimos e depósitos a prazo é mais elevado em Portugal do que na área do euro (Gráfico I.2.2), o que explica a margem financeira nos primeiros três trimestres de 2023 ter sido superior em Portugal (2,73%, face a 1,39% na área do euro).

Conforme referido, a evolução recente da margem financeira beneficiou do contexto de subida das taxas de juro. Perante um cenário central de redução futura das taxas de juro, o ajustamento por grande parte dos bancos das suas estratégias de gestão do risco de taxa de juro, que também são influenciadas pela maior proporção de crédito à habitação com taxa fixa ou mista, terá um impacto positivo nos resultados futuros. O recurso à cobertura de risco de taxa de juro através de derivados financeiros e o maior peso da taxa de juro mista na carteira de crédito contribuem para que, num cenário de descida paralela da curva de taxas de juro, se perspetivem menores reduções na margem financeira (em percentagem do Tier 1). Esta evolução é particularmente relevante dada a importância da margem financeira na estrutura de proveitos dos bancos portugueses, elemento fundamental para sustentar a geração de capital de forma orgânica, via que tem sido privilegiada na criação de buffers de capital de gestão.

Apesar do aumento dos custos operacionais, a eficiência operacional na perspetiva do rácio cost-to-core income melhorou em 2023. É de notar que valores mais baixos deste rácio estão associados a maior eficiência, ceteris paribus. Portugal apresenta um dos rácios mais baixos no plano europeu, sendo os custos operacionais, em percentagem do ativo total, similares aos da área do euro e o rendimento de exploração mais elevado (Caixa 4). Este rácio reduziu-se para 39,4% (- 15,3 pp) devido ao já referido aumento da margem financeira (Gráfico I.2.3). O aumento dos custos operacionais, de 3,3% em termos homólogos, teve origem nos gastos gerais administrativos, dos quais se destacam custos com tecnologias de informação, e, em menor medida, custos com pessoal. A maioria das instituições justifica essa evolução com o aumento generalizado dos preços e, ainda, dos gastos com a transformação digital.

O custo do risco de crédito aumentou 0,16 pp, fixando-se em 0,45%. O aumento deste rácio ocorreu na sequência do maior fluxo de imparidades para crédito, o que poderá indicar uma maior perceção do risco por parte das instituições, num contexto de taxas de juro mais elevadas. Esta variação corresponde a uma inversão da trajetória de redução iniciada em 2021, observando-se um valor semelhante ao de 2018 (Gráfico I.2.3).

  1. Diferencial entre taxas de juro de empréstimos e depósitos do SPNF | Em pontos percentuais

  1. Cost-to-core-income e custo de risco de crédito | Em percentagem

Fontes: BCE e Banco de Portugal. | Notas: O setor privado não financeiro inclui SNF e particulares. As séries referem-se ao reporte em base individual das outras instituições financeiras monetárias residentes em Portugal. As novas operações consideram taxas médias anuais ponderadas pelos seus respetivos montantes. (a) Diferencial entre as taxas de juro de empréstimos e de depósitos com prazo acordado.

Fonte: Banco de Portugal. | Notas: O cost-to-core-income consiste no rácio entre os custos operacionais e a soma da margem financeira e das comissões líquidas. O custo do risco de crédito consiste no fluxo das imparidades para crédito em percentagem do total do crédito bruto médio concedido a clientes.

Critérios de concessão de crédito

 
Crédito concedido a particulares

Em 2023 o stock de empréstimos bancários a particulares permaneceu relativamente estável. Em dezembro, a taxa de variação anual ajustada de operações de titularização e cedências de empréstimos (tva ajustada) foi de -0,4%, a mais baixa desde 2017. Esta dinâmica reflete a diminuição da tva ajustada do stock de empréstimos à habitação para -1,4% em dezembro de 2023, num contexto de crescimento moderado do stock de empréstimos ao consumo. No primeiro trimestre de 2024, observou-se uma ligeira aceleração nos dois segmentos (Gráfico I.2.4). No segmento de habitação, a tva não ajustada de operações de titularização e cedências de empréstimos foi -0,6% em março de 2024, permanecendo inferior à da área do euro (-0,3%).

  1. Taxa de variação anual ajustada do stock de empréstimos a particulares  
    | Em percentagem

Fonte: Banco de Portugal. | Notas: As taxas de variação anual são calculadas com base na variação dos stocks de empréstimos bancários em fim de mês, ajustados de todos os efeitos não considerados como transação, nomeadamente reclassificações, abatimentos ao ativo, reavaliações cambiais e de preço. As tva designadas como 'tva ajustadas' são ajustadas adicionalmente de operações de titularização e cedências de créditos. Última observação: março de 2024.

Os novos empréstimos para aquisição de habitação contraíram 11,8%, uma queda menos acentuada do que na área do euro, onde as novas operações (excluindo renegociações) caíram 33%. Esta evolução foi transversal à generalidade dos países, atingindo-se quedas na ordem de 50% em alguns deles (Gráficos I.2.5 e I.2.6), Em Portugal, no ano acabado em setembro, as novas operações de crédito para aquisição de habitação (excluindo renegociações) registaram uma queda homóloga de 18,9%, apresentando alguma recuperação no último trimestre do ano.

  1. Novas operações de crédito à habitação excluindo renegociações (acumulado de 12 meses) | Em milhares de euros e percentagem

  1. Taxa de variação anual do stock e taxa de variação homóloga das novas operações de crédito à habitação em 2023  
    | Em percentagem

Fonte: Banco de Portugal. | Nota: As barras a vermelho destacam os valores da taxa de variação homóloga do stock de crédito à habitação em 2023 de Portugal e da área do euro.

Os reembolsos antecipados de empréstimos à habitação totalizaram 11,2 mil milhões de euros, um aumento de 69% face a 2022, e representaram 11% do stock de crédito à habitação do final do ano. Os reembolsos antecipados parciais ganharam relevância, mas os reembolsos antecipados totais continuaram a representar a parcela mais significativa, correspondente a 83% do total de reembolsos (91% em 2022). O reembolso antecipado reduz o nível e o serviço da dívida dos mutuários e, consequentemente, o impacto que variações adversas futuras das taxas de juro possam vir a ter no serviço da dívida, assim como os custos com seguros de vida, contribuindo para diminuir a vulnerabilidade financeira das famílias. Os reembolsos antecipados totais incluem situações de troca de habitação e de transferência de empréstimos para outras instituições pelo que, nessa componente, o impacto sobre a vulnerabilidade das famílias será mais limitado.

O ano de 2023 foi marcado por um aumento de transferências de créditos à habitação entre bancos. A medida governamental que suspende a comissão de reembolso antecipado no caso de crédito para habitação própria permanente a taxa variável, introduzida no final de 2022, potenciou estas operações. De acordo com a informação transmitida pelas instituições, estas transferências foram também dinamizadas pela atuação dos intermediários de crédito, que terão contribuído para a redução dos custos associados à procura de informação. O aumento das transferências teve início no final de 2022 e intensificou-se ao longo de 2023. Uma análise preliminar indica que o peso das transferências no total dos novos empréstimos concedidos pelas instituições para aquisição de habitação (excluindo renegociações) terá sido de 8% em 2022 e 27% em 20236. As novas operações de crédito à habitação, excluindo renegociações e transferências, terão diminuído cerca de 30% em 2023.

Os mutuários que transferiram créditos procuraram condições de preço mais vantajosas (redução de spread) e uma maior previsibilidade a médio prazo dos encargos mensais com o crédito através da fixação da taxa de juro por um período mais longo. Por referência ao stock de crédito à habitação, nas transferências de crédito observou-se um maior peso relativo de contratos mais recentes, para os quais o aumento das taxas de juro tende a ter um impacto muito significativo na prestação. Em montante, cerca de 75% das transferências correspondem a empréstimos que tinham sido contratados originalmente entre 2018 e 2022, que compara com 50% do seu peso no stock. Os créditos concedidos em regime de transferências tiveram um maior peso de taxa mista (63%) face aos restantes novos empréstimos (39%). Nos casos de taxa mista e taxa variável, o indexante mais comum foi a Euribor 6M, não tendo existido diferenças significativas nos pesos relativos dos três indexantes mais habituais. Nos casos em que o antigo e o novo crédito foram concedidos com taxa variável ou mista, estima-se que a redução média de spread tenha sido cerca de 0,4 pp. Ainda que com menor expressão em termos de volume, a redução foi mais acentuada no caso dos créditos que tinham sido contratados originalmente entre 2011 e 2016, período de maior restritividade dos critérios de concessão de crédito por parte dos bancos e com condições de preço/spread mais desfasadas das práticas comerciais associadas ao ciclo de taxas de juro mais altas. Adicionalmente, em média, com a transferência não se observou um aumento da maturidade residual dos empréstimos.

A proatividade dos mutuários para mitigarem a subida das prestações mensais, que também se refletiu num elevado volume de alterações das condições contratuais originais (renegociações comerciais), beneficiou da concorrência acrescida entre instituições num contexto de menor procura por novo crédito à habitação. Quer nas renegociações comerciais, quer nas transferências de crédito, é particularmente importante para a estabilidade do sistema que os bancos procedam a uma criteriosa avaliação do risco de crédito dos mutuários, com vista à adequação dos novos termos contratuais à sua capacidade de pagamento e ao risco que representam.

A taxa de juro média (Taxa Acordada Anualizada — TAA média) das novas operações de empréstimos à habitação aumentou de 0,8% em dezembro de 2021 para 3,2% em dezembro de 2022 e para 4,1% em dezembro 2023. A Taxa Anual de Encargos Efetiva Global (TAEG) média, que inclui outros encargos além dos juros, também registou um aumento nos últimos anos, fixando-se em 6,3% em dezembro de 2023. De acordo com o Inquérito aos Bancos sobre o Mercado de Crédito (BLS) de abril, a concorrência entre instituições, no primeiro trimestre de 2024, promoveu a redução do spread aplicado aos empréstimos à habitação de risco médio.

As novas operações de crédito à habitação com taxa de juro fixa ou mista aumentaram ao longo de 2023, representando 47% do montante dos novos empréstimos. Esta evolução acentuou-se na segunda metade do ano, correspondendo essas operações, em dezembro de 2023, a 75% do crédito concedido nesse mês. A concessão de crédito à habitação com taxa de juro fixa ou mista varia entre 16% e 79% no universo das maiores instituições de crédito. No caso da taxa de juro mista, 57% do montante dos novos empréstimos tem um período de fixação inicial de até 2 anos (inclusive) e 27% entre 2 e 5 anos. Contudo, apesar do stock de crédito à habitação com taxas de juro variáveis continuar a ser predominante, o incremento das novas operações com taxa de juro fixa ou mista ao longo de 2023 contribuiu para que o peso dos empréstimos a taxa variável no stock diminuísse de 89% em dezembro de 2022 para 80% em dezembro de 2023 (Gráfico I.2.7).

  1. Fluxo mensal de novos empréstimos e stock de crédito à habitação por tipo de taxa | Em percentagem

Fonte: Banco de Portugal. | Notas: A classificação de taxa mista tem como referência o momento da celebração do contrato, momento a partir do qual vigora um período de taxa fixa, que difere de contrato para contrato. A percentagem do stock com taxa mista pode incluir contratos que se encontram já no período de taxa variável ou perto de terminarem o período de taxa fixa.

Os novos empréstimos ao consumo reduziram-se 2% em 2023. A tva ajustada do stock de crédito ao consumo foi igual a 5,1% em dezembro de 2023 (5,9% em março de 2024) (Gráfico I.2.4). A taxa de juro média e a TAEG deste segmento de crédito aumentaram 1,1 pp e 1 pp em 2023, fixando-se em 9,1% e 11,3% em dezembro, respetivamente (9,5% e 11,8% em março de 2024). As duas taxas são superiores às da área do euro, iguais a 7,8% e 8,6%, respetivamente, em março. Contrariamente ao crédito à habitação, a maioria destes contratos são com taxa de juro fixa. Em março de 2024, os contratos com taxa de juro variável representavam apenas 13,7% do stock de crédito ao consumo.

De acordo com o Inquérito aos Bancos sobre o Mercado de Crédito (BLS, na sigla inglesa) de janeiro, os critérios de concessão de crédito a particulares para aquisição de habitação permaneceram praticamente inalterados no quarto trimestre de 2023 (Gráfico I.2.8). As instituições reportaram também uma ligeira diminuição na procura de empréstimos para aquisição de habitação no quarto trimestre de 2023, devido ao nível das taxas de juro e da confiança dos consumidores (perfil similar no segmento consumo e outros fins). Na área do euro, os bancos reportaram, pela primeira vez desde 2021, critérios de concessão de crédito à habitação menos restritivos no primeiro trimestre de 2024, a par de uma ligeira diminuição da procura por crédito à habitação.

  1. Procura e Oferta de crédito à habitação | Índice de difusão

Oferta

Procura

Fontes: BCE e Banco de Portugal. | Notas: A oferta de crédito corresponde aos critérios de concessão reportados pelos bancos. Um aumento (diminuição) do índice de difusão significa um aumento (diminuição) da restritividade por parte das instituições e um aumento (diminuição) da procura no segmento de crédito. A última observação para cada variável corresponde à expetativa que as instituições têm para o segundo trimestre de 2024 (parte a tracejado).

 
Crédito concedido a Sociedades não financeiras

A taxa de variação anual do stock de empréstimos concedidos a empresas não financeiras por bancos residentes foi de -0,7% em dezembro de 2023, o que compara com uma variação de -0,1% na área do euro. A evolução por setor de atividade apresentou padrões diferenciados, sendo positiva nos setores da construção e atividades imobiliárias (1,2% e 2,2%, respetivamente) e negativa noutros setores, com destaque para as indústrias (-8,9%) e o alojamento e restauração (-4,1%). Por dimensão, as microempresas mantiveram taxas de variação homólogas positivas em 2023 (3,8% em dezembro), enquanto as restantes tipologias apresentaram taxas de variação anual negativas, destacando-se as médias empresas (-5,8% em dezembro de 2023) (Quadro I.2.2). A redução do stock de crédito a SNF decorre da diminuição do montante de novos contratos em 2023, a qual, conjugada com o aumento das renegociações de crédito, se traduziu num volume de novas operações equiparado entre 2022 e 2023. A este efeito acresce também o aumento dos reembolsos por parte das empresas cujas posições de liquidez foram reforçadas durante a pandemia com o recurso à moratória e a empréstimos com garantia pública (Caixa 3 — Boletim Económico de março). Esta dinâmica contrastou com a evolução do financiamento obtido junto de não residentes, que apresentou um fluxo positivo em 2023, representando cerca de 1% do PIB (Secção I.1.3.3).

  1. Taxa de variação anual dos empréstimos concedidos a SNF | Em percentagem

 

% stock dez. 23

dez. 19

dez. 20

dez. 21

dez. 22

set. 23

dez. 23

mar. 24

Área do euro

 

2,6

6,5

3,8

5,5

-0,4

-0,1

-0,1

Portugal

 

0,4

9,7

4,2

0,6

-2,7

-1,1

-0,8

Microempresas

29

6,2

13,9

7,7

6,6

3,0

3,8

4,2

Pequenas empresas

25

-1,1

13,3

4,2

-2,4

-4,6

-3,3

-3,4

Médias empresas

24

-1,9

6,1

2,1

-2,2

-5,8

-5,8

-5,8

Grandes empresas

19

-3,1

3,8

2,1

0,7

-6,0

-1,9

-0,8

Indústrias

19

0,1

9,6

10,3

1,9

-9,3

-8,9

-7,6

Comércio

19

2,2

9,5

5,1

5,7

1,5

-0,7

-1,7

Transportes e armazenagem

7

-9,3

0,4

0,1

-2,5

-4,3

-2,4

-4,0

Alojamento e restauração

9

2,3

25,3

7,6

-6,6

-5,7

-4,1

-3,4

Construção

9

-2,0

7,6

-0,4

0,3

-2,0

1,2

1,2

Atividades imobiliárias

13

5,3

3,6

0,2

7,0

3,7

2,2

2,2

Portugal (a)

 

1,1

10,0

4,5

0,9

-2,4

-0,7

-0,4

Fonte: Banco de Portugal. | Notas: As taxas de variação anual são calculadas com base na variação dos stocks de empréstimos de bancos residentes a SNF residentes em fim de mês, ajustados de todos os efeitos não considerados como transação, nomeadamente reclassificações, abatimentos ao ativo, reavaliações cambiais e de preço. Indústrias, alojamento e restauração e comércio correspondem, respetivamente, aos seguintes setores: “Indústria transformadora e indústria extrativa”, “alojamento, restauração e similares” e “comércio por grosso e retalho; reparação de veículos automóveis e motociclos”. As Sedes Sociais, não individualizadas no quadro, representavam 3% do crédito concedido a SNF em dezembro de 2023. (a) Série adicionalmente corrigida de cedências de crédito, as quais têm tido um impacto marginal no período mais recente.

De acordo com o BLS, os bancos reportaram que as condições da oferta de crédito se mantiveram estáveis a partir do segundo semestre de 2023, após um aumento da restritividade no primeiro semestre, perspetivando-se que assim continuarão (Gráfico I.2.9). Após o início da subida das taxas de juro, a dinâmica observada em Portugal e na área do euro é muito semelhante em termos de oferta, enquanto a procura se reduziu de forma mais acentuada em Portugal. A diminuição da procura de crédito foi mais moderada a partir de meados de 2023, tendência que se antecipa que irá continuar.

  1. Oferta e procura de crédito a SNF | Índice de difusão

Oferta

Procura

Fontes: BCE e Banco de Portugal. | Notas: A oferta de crédito corresponde aos critérios de concessão reportados pelos bancos. Um aumento (diminuição) do índice de difusão significa um aumento (diminuição) da restritividade por parte das instituições e um aumento (diminuição) da procura no segmento de crédito. A última observação para cada variável corresponde à expetativa que as instituições têm para o segundo trimestre de 2024 (parte a tracejado).

O nível geral das taxas de juro e, em menor grau, as menores necessidades de financiamento para investimento terão sido determinantes para a redução da procura de crédito por parte das empresas observada a partir do terceiro trimestre de 2022, embora de forma decrescente (Gráfico I.2.10). O investimento empresarial foi penalizado em 2023 pelo aumento das taxas de juro, tendo apresentado uma taxa de variação anual de 1,5%, que se estima que aumente para 3% em 2024, impulsionado pela execução dos fundos europeus. A partir do primeiro trimestre de 2023, o financiamento através da geração interna de fundos também contribuiu para a redução da procura. A partir do terceiro trimestre de 2023 apenas o refinanciamento, restruturação ou negociação da dívida apresentou um contributo líquido positivo.

  1. Fatores determinantes da procura de crédito pelas empresas | Índice de difusão

Fontes: BCE e Banco de Portugal. | Nota: Um valor positivo (negativo) no índice de difusão significa um aumento (diminuição) da procura por parte das empresas.

As novas operações de crédito a empresas classificadas na classe de menor risco de crédito continuaram a representar cerca de metade das novas operações. Por seu turno, a percentagem de empréstimos concedidos a empresas na classe de maior risco manteve-se constante em 16% dos empréstimos a SNF concedidos no respetivo período (Quadro I.2.3).

A proporção do stock de empréstimos concedidos a empresas na classe de maior risco de crédito tem vindo a reduzir-se de forma sustentada desde 2019, não obstante os choques a que a economia e as empresas estiveram sujeitas nos últimos anos. A percentagem de empréstimos concedidos a empresas com menor risco continuou a aumentar, para metade do total, em detrimento dos empréstimos a empresas na classe de maior risco. Esta evolução é consistente com a melhoria persistente que os indicadores financeiros das empresas têm registado nos últimos anos (Subsecção I.1.3.3).

  1. Empréstimos a SNF por classe de risco de crédito | Em percentagem

 
 

Classe 1  
(menor risco)

Classe 2

Classe 3  
(maior risco)

Novas operações

2019

48

36

16

2020

53

33

14

2021

45

38

17

2022

48

36

16

2023

47

37

16

Stock de empréstimos

dez. 19

38

38

24

dez. 20

40

37

22

dez. 21

37

41

22

dez. 22

43

38

19

dez. 23

47

37

16

Fonte: Banco de Portugal. | Notas: Exposição de empréstimos a SNF e novas operações de empréstimos a SNF segundo a Central de Responsabilidades de Crédito. O risco de crédito, medido pela probabilidade de incumprimento, tem por base notações de crédito disponíveis no Sistema Interno de Avaliação de Crédito do Banco de Portugal (SIAC). Apenas foram consideradas as novas operações de empresas com informação de risco disponível. A classe de menor risco (classe de risco 1) corresponde a empresas com probabilidade estimada de incumprimento (PD) a um ano inferior ou igual a 1%; a classe de risco 2 corresponde a empresas com PD a um ano superior a 1% e inferior ou igual a 5% e a classe de maior risco (classe de risco 3) corresponde a empresas com PD a um ano superior a 5%. Dados os arredondamentos, nalgumas discriminações, a soma das parcelas pode diferir ligeiramente do total apresentado.

A média das taxas de juro dos novos empréstimos concedidos em 2023 ascendeu a 5,5%, refletindo, inter alia, a evolução das taxas Euribor. A taxa de juro média do stock de empréstimos a SNF foi de 5,7% em dezembro de 2023, o valor mais elevado desde a crise da dívida soberana. Na área do euro, observou-se uma taxa média de 5,2% em dezembro de 2023.

Os spreads das novas operações de crédito a taxa de juro variável registaram uma ligeira redução ao longo de 2023, mantendo-se o diferencial entre as empresas nas classes de maior e de menor risco. Em 2023, os spreads médios praticados em todas as classes de risco foram inferiores ao observado em 2021 e 2022, o que, inter alia, pode ter sido originado pela concorrência acrescida entre instituições, tal como também reportado no BLS.

  1. Spread médio do stock e das novas operações de empréstimos a SNF, por classe de risco e idade da empresa | Em pontos percentuais

 

2021

2022

2023

 

T4

T1

T2

T3

T4

T1

T2

T3

T4

Stock

2,1

2,1

2,0

2,0

2,0

2,0

2,0

1,9

1,9

Classe 1 (menor risco)

1,6

1,6

1,6

1,6

1,6

1,6

1,6

1,6

1,6

Classe 2

2,2

2,2

2,2

2,2

2,1

2,2

2,1

2,1

2,1

Classe 3 (maior risco)

2,6

2,6

2,6

2,5

2,5

2,5

2,5

2,5

2,4

Novas operações

2,0

1,8

1,7

1,9

1,9

1,9

1,8

1,8

1,7

Classe 1 (menor risco)

1,5

1,4

1,4

1,5

1,5

1,6

1,4

1,6

1,3

Classe 2

2,2

2,1

2,0

2,2

2,1

2,1

1,9

1,9

1,8

Classe 3 (maior risco)

2,6

2,4

2,0

2,3

2,5

2,2

2,3

2,1

2,5

Fonte: Banco de Portugal. | Notas: Informação com base na Central de Responsabilidades de Crédito (CRC). Spread em operações a taxa variável. Valores ponderados pelo montante.

A fixação do preço dos empréstimos pelos bancos tem em conta vários fatores, incluindo as características das instituições e dos mutuários, as condições do empréstimo e o ambiente macroeconómico e financeiro. Os bancos devem ser capazes de identificar as vulnerabilidades dos mutuários e, ceteris paribus, aos mutuários que apresentam maior risco espera-se que sejam oferecidas taxas de juro mais elevadas. Os resultados de uma análise baseada em informação individual por empréstimo e mutuário mostram que a taxa de juro cobrada nos novos empréstimos tende a ser mais elevada para as empresas mais endividadas e mais baixa para as empresas com maior liquidez e para as com maior rendibilidade. No período analisado, apesar de alguma heterogeneidade ao longo do tempo, a fixação de preços parece ter respondido mais significativamente a alterações na liquidez das empresas do que a alterações na respetiva alavancagem ou rendibilidade (Tema em destaque: “A importância das características das empresas na determinação das taxas de juro dos empréstimos bancários”).

Qualidade creditícia dos ativos

O rácio de NPL bruto total manteve a trajetória de redução, -0,3 pp em 2023, alcançando em dezembro o valor de 2,7% (Quadro I.2.5). Esta evolução foi acompanhada pelo rácio de NPL líquido de imparidades que diminuiu para 1,2%. A diminuição dos empréstimos não produtivos (unlikely to pay ou vencido há menos de 90 dias, e vencido há mais de 90 dias) refletiu-se num efeito numerador que contribuiu em -0,3 pp para a variação do rácio bruto total, face a 2022. A redução deste rácio não foi mais acentuada devido à diminuição dos empréstimos a SNF e das disponibilidades em bancos centrais (efeito denominador, 0,1 pp).

O aumento de NPL nos empréstimos à habitação levou o segmento dos particulares a apresentar um rácio de NPL superior ao de 2022 em 0,1 pp, fixando-se em 2,4%, ainda assim significativamente abaixo dos valores pré-pandemia (3,7% em 2019). O ligeiro aumento do rácio dos particulares deveu-se a um fluxo de novos NPL superior ao das curas, embora parcialmente atenuado pelo montante de créditos abatidos ao ativo e vendas de NPL. Nos empréstimos à habitação, o incremento de NPL deveu-se à componente de unlikely to pay ou vencido há menos de 90 dias. A subida das taxas de juro de referência em 2023, dada a predominância de empréstimos a taxa variável no stock de empréstimos à habitação, terá contribuído para o incremento desta componente.

Nos empréstimos a SNF, o rácio de NPL bruto fixou-se em 5,0%, uma redução de 1,5 pp. Neste segmento, a diminuição dos NPL mais do que compensou a redução dos empréstimos produtivos. O menor fluxo de NPL face às curas foi o fator que mais contribuiu para a redução dos NPL, existindo, também, contributos dos créditos abatidos ao ativo e da venda de NPL (Quadro I.2.6). A redução do rácio de NPL bruto foi transversal aos diferentes setores de atividade.

A heterogeneidade do rácio de NPL bruto entre as instituições, avaliada através da diferença entre os percentis 90 e 10, diminuiu 0,6 pp. Tal deveu-se, em particular, à redução do rácio em instituições com valores mais elevados por comparação com as demais instituições. O segmento das empresas justificou esta evolução, dado que no segmento dos particulares se observou um aumento da heterogeneidade, por via do aumento do percentil 90.

O rácio de cobertura de NPL por imparidades manteve-se em 55,5%, apresentando uma evolução distinta para empresas e particulares. Nas SNF, apesar da redução das imparidades, a diminuição de NPL levou a que o rácio de cobertura aumentasse 4,9 pp, para 60,9%. Nos particulares, o rácio de cobertura por imparidades diminuiu em -4,5 pp, para 50,6 %, devido, sobretudo, à redução de imparidades no segmento de empréstimos ao consumo e outros fins, mas também ao aumento de NPL no segmento da habitação.

  1. Rácios de NPL | Em percentagem

 

dez. 19

dez. 20

dez. 21

dez. 22

dez. 23

Rácio de NPL bruto (a)

6,2

4,9

3,7

3,0

2,7

Sociedades não financeiras

12,3

9,7

8,1

6,5

5,0

Particulares

3,7

3,4

2,8

2,3

2,4

Habitação

2,4

2,0

1,6

1,1

1,3

Consumo e outros fins

8,2

8,5

7,5

6,9

6,2

Área do euro

2,9

2,5

2,0

1,7

1,5 (b)

Rácio de NPL líquido (c)

3,0

2,2

1,7

1,3

1,2

Fonte: Banco de Portugal. | Notas: (a) Corresponde ao rácio entre o valor bruto dos NPL e o valor total bruto dos empréstimos. Inclui os empréstimos e disponibilidades em bancos centrais e instituições de crédito, e os empréstimos às administrações públicas, outras sociedades financeiras, sociedades não financeiras e particulares. (b) Valores de setembro de 2023. (c) Corresponde ao rácio entre o valor dos NPL líquidos de imparidade e o valor total bruto dos empréstimos.

  1. Rácio de NPL bruto — contributos para a variação | Em percentagem e em pontos percentuais

 

Total

SNF

Particulares

Total

Habitação

Consumo e outros fins

Rácio de NPL bruto, dez. 22

3,0

6,5

2,3

1,1

6,9

Abatidos ao ativo

-0,22

-0,33

-0,21

-0,01

-0,88

Vendas de NPL

-0,17

-0,27

-0,17

-0,03

-0,67

Novos NPL, líquidos de curas

-0,01

-0,98

0,45

0,22

1,25

Outros efeitos denominador

0,06

0,16

-0,02

0,00

-0,36

Rácio de NPL bruto, dez. 23

2,7

5,0

2,4

1,3

6,2

Fonte: Banco de Portugal. | Notas: As vendas de NPL incluem titularizações. A rubrica “novos NPL, líquidos de curas” reflete todas as outras entradas e saídas do segmento de NPL, incluindo os fluxos de entrada de empréstimos no estado de NPL (líquido de saídas), as amortizações e as execuções. A rubrica “Outros efeitos denominador” reflete variações do stock de empréstimos por motivos que não estejam associados ao stock de NPL (e.g. fluxo líquido de empréstimos produtivos).

De forma transversal às principais instituições, o rácio de empréstimos a particulares em stage 2 aumentou 2,2 pp para 10,4%, revelando a vulnerabilidade das famílias de menores rendimentos perante condições monetárias mais restritivas. Esta dinâmica refletiu uma transferência líquida de empréstimos para categorias de risco de crédito mais elevado, nomeadamente transições de stage 1 para stage 2, que contribuiu para um aumento de 12,6% do valor bruto dos empréstimos a particulares em stage 2. Destes destacaram-se os empréstimos à habitação (contributo de 10,1 pp) tendo, neste segmento, o rácio de empréstimos em stage 2 aumentado 2,3 pp, para 9,8%. Relativamente ao segmento consumo e outros fins, o rácio aumentou para 12,4% (+1,6 pp) (Gráfico I.2.12). O potencial de materialização de risco de crédito leva a que seja importante a existência de cobertura para fazer face a perdas. O rácio de cobertura por imparidades de empréstimos a particulares em stage 2 aumentou para 7,2% (+2,0 pp) por via do reforço das imparidades, na habitação e no consumo e outros fins.

Em 2023, o rácio de empréstimos reestruturados de particulares aumentou para 2,5%, em resultado do aumento dos empréstimos reestruturados produtivos no segmento da habitação. Associado à subida das taxas de juro, o aumento dos encargos com o serviço de dívida em contratos a taxa variável terá contribuído para o aumento das reestruturações nos empréstimos à habitação, onde este tipo de taxa é mais frequente. As medidas do governo para mitigar o aumento das taxas de juro na gestão financeira das famílias criaram condições mais propícias para a reestruturação de contratos cujos devedores tinham dificuldades financeiras. Nos empréstimos ao consumo e outros fins, a redução dos NPL reestruturados contribuiu para a diminuição do rácio de empréstimos reestruturados.

Nas SNF, a redução do valor bruto dos empréstimos foi mais do que compensada pela redução dos empréstimos em stage 2, resultando numa diminuição do rácio de empréstimos em stage 2 para 13,5%, que foi transversal às principais instituições (Gráfico I.2.11). Para esta evolução contribuiu uma transferência líquida positiva de empréstimos de stage 2 para stage 1. A redução dos empréstimos em stage 2 levou a que o rácio de cobertura se tenha mantido praticamente inalterado (8,2%), apesar de ter existido uma diminuição das imparidades. Os empréstimos reestruturados reduziram-se 24% face a 2022, com um contributo mais acentuado da componente de NPL (-18 pp) e impacto no rácio de empréstimos reestruturados, que diminuiu 1,1 pp, para 4,4%.

  1. Rácios de empréstimos em stage 2 e de empréstimos reestruturados | Em percentagem

Fonte: Banco de Portugal. | Notas: O rácio de empréstimos em stage 2 corresponde ao rácio entre o valor total bruto dos empréstimos em stage 2 e o valor total bruto dos empréstimos. O rácio de empréstimos reestruturados corresponde ao rácio entre o valor total bruto dos empréstimos reestruturados e o valor total bruto dos empréstimos.

Concentração de exposições

Apesar da estabilização do ativo do sistema bancário (Quadro I.2.7), verificou-se um aumento do peso da componente de títulos de dívida, que passaram a representar 23% do ativo, dos quais 15,7% em dívida pública. Observou-se uma redução das aplicações em bancos centrais (-0.7 pp), dos empréstimos a clientes (-0,3 pp) e das aplicações no mercado interbancário (‑0,5 pp). Esta evolução refletiu, em particular, uma menor dinâmica da atividade creditícia que, atendendo à situação em termos de liquidez, se traduziu no aumento do investimento em títulos de dívida. Acresce que, no âmbito dos instrumentos não convencionais de política monetária, teve lugar o reembolso das operações de refinanciamento de prazo alargado direcionadas (TLTRO III), com impacto nas disponibilidades em bancos centrais.

  1. Ativo do sistema bancário, taxa de variação homóloga e contributos | Em percentagem e em pontos percentuais

 

dez. 19

dez. 20

dez. 21

dez. 22

dez. 23

Peso no ativo  
(dez. 23)

Ativo (mil milhões de euros)

390

412

445

442

442

Ativo (taxa de variação homóloga)

1,5

5,5

8,0

-0,5

-0,1

Disponibilidades e empréstimos em bancos centrais

1,4

3,2

6,6

-2,3

-0,7

10,9

Disponibilidades e empréstimos a instituições de crédito

0,0

-0,1

-0,1

0,4

-0,5

2,8

Empréstimos a clientes

0,8

1,2

2,4

1,4

-0,3

56,9

Títulos de dívida

0,9

1,6

0,1

0,0

1,8

22,7

Instrumentos de capital

-0,3

-0,1

-0,1

-0,2

0,0

1,2

Outros

-1,3

-0,2

-0,8

0,2

-0,3

5,5

Fonte: Banco de Portugal. | Nota: A rubrica “Outros” inclui caixa, ativos tangíveis, ativos intangíveis e outros ativos.

Numa análise por setor de contraparte, constata-se um aumento da exposição ao soberano e às SNF por via da componente titulada em 1,2 e 0,5 pp, respetivamente, que correspondiam, no final de 2023, a 16% e 4% do ativo, respetivamente (Gráfico I.2.12). Contudo, em simultâneo, assistiu-se a uma redução dos empréstimos a SNF (-4%) que passam a representar cerca de 19% do total do ativo em 2023 (Secção 2.2). Já o crédito a particulares aumentou 1% e continuou a representar 34% do total do ativo.

  1. Evolução dos empréstimos e títulos de dívida por setor de contraparte | Em mil milhões de euros

  1. Exposição ao imobiliário e LTV atual do stock de empréstimos à habitação | Em percentagem do ativo

 

dez. 21

dez.22

dez.23

Exposição ao imobiliário

34,0

34,7

34,6

Emp. a particulares garantidos por imóveis

25,1

25,9

25,5

Emp. a SNF da construção e ativ. imob.(a)

4,0

4,2

4,2

Emp. a SNF garantidos por imóveis (b)

3,4

3,2

3,7

Fundos de Investimento Imobiliário (c)

0,9

0,9

0,9

Ativos imobiliários (d)

0,6

0,5

0,3

Empréstimos com LTV superior a 80 (e)

8

7

5

Fonte: Banco de Portugal. | Notas: (a) não exclui empréstimos concedidos para o financiamento de projetos não relacionados com o setor imobiliário, como por exemplo para obras públicas; (b) exclui empréstimos a SNF dos setores da construção e das atividades imobiliárias. Existiu uma alteração de metodologia numa das principais instituições no reporte de empréstimos a SNF garantidos por imóveis a partir de 2023, o que levou a uma quebra de série; (c) inclui empréstimos e unidades de participação (d) valores brutos. (e) Indicador apurado com base em dados granulares da Central de Responsabilidade de Crédito ao nível do empréstimo e que se encontra em percentagem da carteira. Sempre que a data de última avaliação do imóvel é anterior ao terceiro trimestre de 2023, o valor atual do mesmo é estimado com base no Índice de Preços da Habitação do INE.

A exposição do setor bancário português a imobiliário por via de crédito à habitação é, em termos consolidados, 27,4% no final de 2023. Contudo, a exposição ao mercado imobiliário pode assumir outras formas. Na atividade doméstica, a exposição total, direta e indireta, manteve-se, em torno de 35% do ativo (Quadro I.2.8). Os empréstimos a particulares garantidos por imóveis continuaram a ser a componente com maior peso no ativo (25,5%), expondo os bancos à evolução do mercado imobiliário residencial. Neste contexto, a baixa percentagem da carteira de crédito à habitação com LTV atuais elevados mitiga o impacto de uma potencial redução dos preços do imobiliário residencial, sendo que apenas 5% dos créditos assumem LTV superiores a 80%.

O aumento do peso da carteira de títulos de dívida pública tem sido acompanhado por um maior peso da carteira a custo amortizado, que se perspetiva que seja detida até à maturidade. Nos últimos anos, o aumento da componente de dívida pública contabilizada a custo amortizado, que representa atualmente 80% do total da carteira de títulos, e a redução da duração média desta carteira permitiram mitigar o impacto das alterações de mercado sobre o valor de balanço dos títulos, tornando-o menos sensível a variações de taxas de juro. A maturidade residual média dos títulos de dívida pública das principais instituições do sistema bancário reduziu-se de 5,0 anos, em 2022, para 4,7 anos, em 2023.

O risco de interligação entre o soberano e o sistema bancário por via da exposição direta à dívida pública doméstica tem vindo a reduzir-se. Tal decorre da diversificação da carteira de títulos de dívida pública por contraparte geográfica, em particular com o aumento do peso da dívida italiana, alemã e da Comissão Europeia (Quadro I.2.9).

  1. Títulos de dívida pública — atividade doméstica

 

dez. 19

dez. 20

dez. 21

dez. 22

dez. 23

Total (% ativo) (a)

13,7

14,6

13,5

13,4

14,1

Em % da carteira de títulos de dívida pública

Portugal

58,5

54,7

47,5

41,7

36,3

Espanha

18,6

22,5

24,7

26,1

26,6

Itália

16,4

16,2

15,1

9,6

11,1

França

1,2

1,4

4,0

8,4

8,8

Irlanda

1,5

1,7

3,2

3,4

3,3

Bélgica

0,3

0,1

1,2

2,8

2,7

Alemanha

0,0

0,0

-0,3

1,0

2,7

Comissão Europeia

0,0

0,0

0,1

1,8

2,6

Outros

3,5

3,3

4,5

5,5

5,9

Fonte: Banco de Portugal. | Notas: (a) Em percentagem do ativo das outras instituições financeiras monetárias. As séries referem-se ao reporte em base individual das outras instituições financeiras monetárias residentes em Portugal. A componente de outros países encontra-se dispersa não existindo nenhum país com um peso superior a 2,5%.

Nos últimos anos, a possibilidade de transmissão e amplificação de choques adversos por via de interligações no setor financeiro tem vindo a reduzir-se (Secção 1.3.5). Em dezembro de 2023, a exposição do setor bancário a outras entidades do setor financeiro (excluindo Banco Central) era de cerca de 16% do ativo, em termos da atividade doméstica. Nos últimos 10 anos, esta exposição reduziu-se 8 pp, numa fase inicial devido à redução da exposição entre bancos (-2 pp) e, mais tarde, à menor exposição a fundos de investimento e outros intermediários financeiros (- 1 pp e -4 pp, respetivamente). A exposição a bancos residentes mantém a sua importância, situando-se em 11% do ativo.

Financiamento e liquidez

O quadro de liquidez do sistema bancário permaneceu robusto. No final do ano, o rácio de transformação fixou-se em 78%, nível semelhante ao de 2022, mas muito inferior ao observado antes da crise financeira (Quadro I.2.10). Os rácios de cobertura de liquidez e de financiamento estável líquido (LCR e NSFR, respetivamente, nas siglas em inglês) permaneceram elevados, acima do mínimo regulamentar de 100%. O aumento do rácio LCR para 255% deveu-se sobretudo à reserva de liquidez (numerador) que, mantendo-se maioritariamente composta por títulos de dívida pública (51%) e reservas em bancos centrais (41%), representava 34% dos depósitos de clientes. Os principais bancos do sistema apresentavam valores similares, não existindo dispersão relevante.

O peso do financiamento obtido junto do Eurosistema tem vindo a reduzir-se rapidamente desde 2021, em resultado da amortização das operações de refinanciamento de prazo alargado direcionadas (TLTRO III). Simultaneamente, as reservas em bancos centrais permanecem elevadas, justificando um financiamento líquido negativo. Estes desenvolvimentos refletiram-se na redução do rácio de ativos onerados para níveis historicamente baixos.

Em 13 de março de 2024, o Conselho do BCE concluiu o processo de revisão do quadro operacional do sistema de implementação da política monetária. As características do sistema escolhido conferem segurança no acesso a liquidez, promovendo a estabilidade financeira (Caixa 5).

  1. Indicadores de liquidez e financiamento | Em percentagem

 

dez. 08

dez. 12

dez. 21

dez. 22

dez. 23

Rácio de transformação

152,9

122,5

81,1

78,2

78,0

Rácio de cobertura de liquidez (LCR)

n.d.

n.d.

260,0

229,3

254,5

Rácio de financiamento estável líquido (NSFR)

n.d.

n.d.

142,9

145,8

150,6

Reserva de liquidez (% depósitos de clientes)

n.d.

n.d.

37,0

31,7

33,8

Rácio de ativos onerados

n.d.

n.d.

18,1

11,2

9,1

Financiamento líquido do Eurosistema (% ativo)

-1,2

8,7

-4,5

-8,0

-10,2

Fonte: Banco de Portugal.

Do lado do passivo, os depósitos de clientes mantêm-se como a principal fonte de financiamento. No final de 2023, os depósitos de clientes representavam 80% do passivo total do sistema bancário, pertencendo maioritariamente a particulares e sociedades não financeiras. Face ao aumento das taxas de juro no último ano, verificou-se a realocação de depósitos à ordem (tipicamente não remunerados) para depósitos a prazo, quer para particulares quer para empresas. Em termos agregados, o peso de depósitos à ordem e a prazo passou a ser semelhante (Gráfico I.2.13).

Os principais bancos do sistema bancário português emitiram, externamente ao grupo em que estão inseridos, instrumentos elegíveis para o cumprimento do requisito mínimo de fundos próprios e passivos elegíveis (MREL) num total de 1,5 mil milhões de euros. No final do ano, todas as instituições cujo período de transição para cumprimento de MREL terminava a 1 de janeiro de 2024 cumpriam com o requisito final. Existem, no entanto, instituições para as quais foi definido um período de transição mais longo, que continuam a construir a sua capacidade de MREL com vista ao cumprimento das respetivas metas finais. O stock de instrumentos elegíveis para MREL é maioritariamente constituído por fundos próprios, nomeadamente fundos próprios principais de nível 1 (CET1) (Gráfico I.2.14). A maioria dos instrumentos elegíveis para MREL representados por títulos apresenta uma maturidade residual entre 2 e 5 anos, sendo que apenas 5% tem uma maturidade inferior a 2 anos, mitigando as necessidades de refinanciamento no curto prazo.

  1. Depósitos de clientes | Em percentagem

  1. Instrumentos elegíveis para MREL (externo ao grupo) ― Composição e maturidade (anos) | 2023, em percentagem

Fonte: Banco de Portugal.

Fonte: Banco de Portugal.

Capital

O aumento dos resultados, bem como do outro rendimento integral, permitiu um aumento dos fundos próprios transversal a praticamente todas as grandes instituições do sistema bancário, reduzindo a sua heterogeneidade (Gráfico I.2.15). A rendibilidade registada é particularmente relevante para sustentar a geração orgânica de capital, promovendo o aumento dos buffers de gestão e, assim, dotando as instituições de capacidade para acomodar choques futuros, nomeadamente em fases menos favoráveis dos ciclos económicos.

  1. Rácio de fundos próprios totais ― nível e contributos para a variação | Em percentagem e pontos percentuais

  1. Ativos ponderados pelo risco por tipo de risco | Dez. 2023

Fonte: Banco de Portugal. | Nota: O rácio de fundos próprios totais corresponde ao rácio entre os fundos próprios totais e o ativo ponderado pelo risco.

Fonte: Banco de Portugal.

Os rácios de fundos próprios totais e de fundos próprios principais de nível 1 (CET1) aumentaram 1,5 e 1,7 pp, respetivamente, situando-se em 19,6% e 17,1%. A evolução do rácio de fundos próprios totais é ainda determinada pela redução dos fundos próprios de nível 2 (Tier 2) explicada pela amortização antecipada de instrumentos de Tier 2 pela Caixa Geral de Depósitos, com vista à liquidação integral do financiamento obtido junto de investidores privados no âmbito do Plano de recapitalização acordado entre o Estado Português e a Comissão Europeia.

Com referência a setembro de 2023, observou-se uma convergência para os rácios de fundos próprios da área do euro, com o rácio de fundos próprios totais 0,5 pp abaixo da média da área do euro, enquanto o rácio CET1 foi superior em 0,5 pp.

Adicionalmente, também se observa um reforço do rácio de alavancagem, que aumentou 0,6 pp devido à subida dos fundos próprios de nível 1 (Tier 1), cifrando-se em 7,3% e mantendo-se acima do mínimo regulamentar de 3%.

O risco do ponto de vista prudencial pode ser medido pelo rácio entre os ativos ponderados pelo risco (RWA, no acrónimo inglês) e o ativo total do setor bancário, métrica designada por ponderador médio de risco. Este rácio situou-se em 42,7%, o que representa uma redução de 0,4 pp face ao final de 2022, embora refletindo uma maior dispersão medida pela diferença entre o percentil 90 e o percentil 10. Este indicador continuava significativamente acima do valor médio na área do euro (35,3%), avaliado a setembro de 2023.

A redução do ponderador médio de risco é essencialmente explicada pela diminuição dos ativos ponderados pelo risco, -0,3 pp, efeito numerador. Em concreto, teve lugar a redução dos RWA associados à exposição ao risco de crédito (-0,3 pp) e ao risco de mercado (-0,3 pp), que foram parcialmente compensadas pelos RWA associados à exposição ao risco operacional (0,4 pp). A evolução dos RWA relativos a risco de crédito e a risco operacional foi transversal à generalidade dos maiores bancos do sistema, enquanto no caso do risco de mercado, a redução observada é explicada pelo exercício de uma opção regulamentar, por parte de uma grande instituição, no cálculo de RWA para risco cambial.

A principal componente dos ativos ponderados pelo risco é o risco de crédito, 85%, com a exposição a empresas e a operações de retalho a assumirem maior relevância, representando 34% e 19%, respetivamente (Gráfico I.2.16). Apesar da exposição ao risco de crédito se ter reduzido, a evolução das suas diferentes componentes teve um comportamento muito heterogéneo entre bancos, refletindo diferentes combinações de classes de ativos. A este fator poderão acrescer diferenças nos métodos de avaliação de risco considerado, nomeadamente decorrentes da utilização dos métodos-padrão ou de modelos internos (IRB, na sigla inglesa).

Embora as restantes componentes dos ativos ponderados pelo risco sejam menos materiais, é de destacar o risco operacional, que representava 11% dos ativos ponderados pelo risco, e que está associado a potenciais perdas na atividade regular decorrentes de falhas em processos, pessoas, sistemas e/ou eventos externos. A variação desta componente de risco está correlacionada com a evolução do produto bancário, o que contribui para explicar o impacto do risco operacional na evolução do ponderador médio de risco em 2023.

  1. Índice de procura de habitação para Portugal

Motivação e dados

A volatilidade dos preços da habitação tem impacto no bem-estar das famílias, na estabilidade financeira e, em última análise, na economia em geral. Segundo os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), os preços da habitação mais do que duplicaram nos últimos dez anos em termos nominais. Perto de 80% da população portuguesa tem habitação própria, dos quais 38% pagam crédito hipotecário, de acordo com os dados mais recentes, dos Censos 2021, sendo que, de acordo com o Inquérito à Situação Financeira das Famílias, a residência principal constitui a maior parte da riqueza da maioria das famílias em Portugal. As hipotecas e os empréstimos aos setores da construção e imobiliário representaram 26% e 4%, respetivamente, do total do ativo no balanço do sistema bancário em dezembro de 20237. Por estas razões, é crucial acompanhar e prever a evolução dos preços da habitação.

Com base no trabalho desenvolvido por Møller et al. (2023) para os Estados Unidos, a presente caixa apresenta um índice de procura de habitação (Housing Search Index — HSI) para Portugal utilizando dados do Google Trends. Tem como principal objetivo avaliar se este é um indicador avançado da dinâmica de curto prazo dos preços da habitação. O Google Trends mede a atividade de pesquisa online, que, servindo como aproximação da procura de habitação, pode ser utilizada para construir um indicador de procura do mercado da habitação. Atualmente, a maioria dos compradores de casa em Portugal começa por pesquisar online, de acordo com os dados de um inquérito da DECO PROteste realizado em 2023. Assim, uma subida do volume total de pesquisas num país, registada pelo Google Trends, candidata-se a ser um indicador avançado de futuros aumentos dos preços da habitação.

Para construir o HSI, os volumes de pesquisa pelos termos “comprar casa” e pelas 25 principais pesquisas relacionadas foram recolhidos junto do Google Trends, tendo em conta apenas pesquisas efetuadas em território nacional e língua portuguesa. Os volumes de pesquisa ao longo do tempo são facilmente acessíveis na plataforma do Google Trends a partir de 2004 (Figura C1.1). Seis das pesquisas relacionadas referem-se a áreas urbanas específicas (e.g. “comprar casa porto”) ou ao mercado de arrendamento, pelo que foram removidas. Por último, foram acrescentadas as pesquisas pelas duas plataformas online mais utilizadas na procura de habitação em Portugal.

  1. Índice dos volumes de pesquisa do Google Trends pela expressão “comprar casa”

Fonte: Google. | Nota: O índice dos volumes de pesquisa considera as pesquisas efetuadas em Portugal entre janeiro de 2004 e abril de 2023.

Dado o conjunto de 22 séries mensais de volumes de pesquisa resultantes do procedimento descrito no parágrafo anterior, o ponto de partida foi a definição dos dez volumes de pesquisa mais relevantes através de um algoritmo de Machine Learning8. De seguida, o HSI é obtido como a primeira componente principal destes dez volumes de pesquisa9. Analisando o HSI face ao crescimento mensal dos preços da habitação entre janeiro de 2004 e agosto de 2023 (Gráfico C1.1), podemos observar imediatamente uma forte correlação entre o índice e as variações de preços no mercado da habitação.

  1. Índice de procura de habitação e crescimento dos preços da habitação em Portugal

Fontes: Banco de Portugal e Confidencial Imobiliário.

Desempenho em termos de previsão

O modelo de previsão utilizado para explicar o crescimento dos preços da habitação através do HSI, baseado em Møller et al. (2023), é:

pt+hpt=α+βHSIt+εt+hp_{t + h} - p_{t} = \alpha + \beta{HSI}_{t} + \varepsilon_{t + h}.

Este modelo foi estimado para diferentes horizontes de previsão hh, em que hh se situa entre 1 mês e 60 meses. Na equação acima, pt+hptp_{t + h} - p_{t} representa o crescimento dos preços da habitação hh meses antes do mês ttHSIt{HSI}_{t}o índice de procura de habitação no mês tt; e εt+h\varepsilon_{t + h}o termo residual.

As respetivas estimativas de coeficientes β (painel da esquerda do Gráfico C1.2) representam a sensibilidade das variações dos preços da habitação ao HSI em diferentes horizontes temporais, enquanto os respetivos valores R2 (painel da direita do Gráfico C1.2) refletem a percentagem da variação dos preços da habitação que pode ser explicada pelo HSI.

  1. Estimativas do modelo em diferentes horizontes de previsão

Coeficientes β\beta e intervalos de confiança de 90%

Valores R2

Fontes: Banco de Portugal e Confidencial Imobiliário.

As estimativas de R2 (Gráfico C1.2) indicam que o HSI tem um forte desempenho em termos de previsão, atingindo um máximo no horizonte de 1 a 2 anos. No horizonte de previsão de 12 meses, só o HSI prevê 70% da variação dos preços da habitação. O HSI tem um bom desempenho, em particular quando se comparam os resultados com outras variáveis de previsão habitualmente utilizadas na literatura10, assim como quando todas estas variáveis são adicionadas ao modelo base.

Extensões do modelo

Além do modelo base, foram consideradas separadamente duas extensões. A primeira propõe-se a medir a relevância dos indicadores da oferta na previsão dos preços da habitação, em comparação com o indicador da procura HSI, adicionando as variações logarítmicas dos fogos em oferta como variável de previsão adicional do modelo. Esta inclusão não afeta significativamente as estimativas dos coeficientes originais para o HSI e, mais importante ainda, não acrescenta capacidade de previsão significativa ao modelo: por exemplo, no horizonte de previsão de 12 meses, apenas cerca de 7 pontos percentuais adicionais da dinâmica dos preços da habitação são explicados adicionando o indicador da oferta, além dos 70% explicados isoladamente pelo HSI. Por outro lado, se o indicador da oferta for considerado como variável de previsão isoladamente, explica apenas cerca de 12% dos preços da habitação. Estes factos sustentam a conclusão de que o HSI continua a ser um indicador avançado para os preços da habitação em Portugal, mesmo quando também se considera a oferta como indicador.

A segunda extensão analisa a importância da procura externa, medida por pesquisas efetuadas fora de Portugal. Num mercado em que a procura externa tem estado cada vez mais presente nos últimos anos, é interessante avaliar a relevância desta componente na dinâmica dos preços da habitação, quando comparada com a procura interna. Se o HSI for uma boa aproximação da procura interna, passa a ser possível fazer esta comparação construindo indicadores da procura externa de forma semelhante.

Com este objetivo em mente, foram calculados HSI estrangeiros para os seguintes países: Estados Unidos, França, Reino Unido, Itália, Brasil, Alemanha, África do Sul, Israel e Índia. De acordo com dados da Confidencial Imobiliário, estes são os países com os maiores pesos nas transações de habitações na área de reabilitação urbana de Lisboa em 2023, ordenados por peso nas transações subjacentes, com exceção da China, para a qual não existem dados do Google Trends suficientes. Para cada um destes nove países, foi construído um HSI individual estrangeiro utilizando um método equivalente ao utilizado para o HSI nacional, mas considerando apenas as pesquisas no Google limitadas ao território de cada país, mas associadas com a compra de casa em Portugal. A título ilustrativo, os HSI estrangeiros dos dois países com maior representação de habitação própria na área de Lisboa (Estados Unidos e França) encontram-se caracterizados face à série de variações dos preços da habitação em Portugal (Gráfico C1.3). Estes índices estão fortemente correlacionados com a série de crescimento dos preços da habitação em Portugal, com correlações de 66% e 54%, respetivamente, para os Estados Unidos e França.

  1. Índices de Procura Externa para o mercado residencial português

HSI dos EUA e crescimento  
dos preços da habitação

HSI de França e crescimento  
dos preços da habitação

Fontes: Banco de Portugal e Confidencial Imobiliário.

Adicionando estes nove indicadores, um de cada vez, ao modelo de base, conclui-se que a adição de indicadores de procura externa é relevante para explicar a dinâmica dos preços da habitação, além do que já é considerado pelo HSI nacional. Esta relevância é heterogénea entre indicadores, sendo o indicador de França o que acrescenta mais informação, com um acréscimo de 5 pontos percentuais ao R2 do modelo de base no horizonte de previsão de 12 meses.

Conclusão

A criação de um índice de procura de habitação é benéfica para avaliar a dinâmica do mercado da habitação em Portugal, em particular como indicador avançado da variação dos preços da habitação nos horizontes entre 1 e 2 anos. No horizonte de previsão de 12 meses, o HSI tem uma melhor performance que a generalidade das variáveis habitualmente utilizadas na literatura.

A metodologia utilizada para construir o indicador é versátil e pode ser adaptada para investigar dimensões de interesse adicionais, tais como indicadores da procura externa. Adicionalmente, os resultados sugerem que o HSI, um indicador da procura, demonstrou ser mais adequado do que o indicador da oferta como indicador avançado dos preços da habitação no período em análise e que a procura externa é relevante para definir a dinâmica dos preços da habitação em Portugal.

O HSI pode complementar os modelos convencionais habitualmente utilizados na literatura e, portanto, ser usado como uma ferramenta adicional de avaliação dos preços da habitação por parte dos decisores de política.

Referências

Møller, S. V., Pedersen, T. Q., Montes Schütte, E. C. e Timmermann, A. (2023). “Search and Predictability of Prices in the Housing Market.” Management Science, 70(1), 415-438.

Zou, H. e Hastie, T. (2005). “Regularization and Variable Selection via the Elastic Net.” Journal of the Royal Statistical Society. Series B (Statistical Methodology), 67(2), 301–320.

 
  1. Exposição dos bancos portugueses ao mercado imobiliário comercial e a situação financeira das empresas dos setores da construção e atividades imobiliárias

Em Portugal os riscos relacionados com o mercado imobiliário comercial são avaliados como baixos. O mercado tem sido caraterizado pelo domínio de investidores estrangeiros, tipicamente pertencentes a grandes grupos económicos com portfolios diversificados. O papel dos bancos portugueses no financiamento da construção e investimento em imobiliário comercial tem sido menos relevante que no passado. Entre outros fatores, a escassez de oferta em alguns segmentos, como os escritórios e a logística, e o dinamismo do turismo têm contribuído para sustentar os preços (Secção I.1.3.4).

A exposição limitada dos bancos portugueses ao mercado imobiliário comercial é sobretudo indireta, via crédito. Em dezembro de 2023, os empréstimos a empresas garantidos por imóveis comerciais (adiante designados empréstimos CRE, commercial real estate) totalizavam 21,6 mil milhões de euros, 5% do ativo total do sistema bancário em base consolidada. Este valor compara com 113 mil milhões de euros de empréstimos a particulares garantidos por imóveis, sobretudo habitação, (26% do total do ativo). A exposição é também limitada por comparação com outros países da área do euro (Secção I.1.3.4).

Os empréstimos CRE estão concentrados em pequenas e médias empresas (80%) e distribuídos por diversos setores de atividade. Embora se observe uma maior concentração no setor das atividades imobiliárias (31%, empresas cuja atividade principal é a compra e venda e arrendamento de imóveis, das quais a mediação imobiliária representa apenas uma pequena fração), os setores do alojamento e restauração (19%), indústria transformadora (11%) e comércio (9%) também têm um peso relevante, e superior ao das empresas cuja atividade principal é a promoção imobiliária e a construção de edifícios (8%, Quadro C.2.1). A natureza da atividade das empresas com crédito garantido por imóveis comerciais é diversa, o que contribui para atenuar o risco de crédito. Em muitos casos, o imóvel que garante o empréstimo poderá ser um imóvel detido pela empresa para uso próprio/desenvolvimento da sua atividade e não um ativo imobiliário detido numa ótica de investimento, para geração de rendimento pelo arrendamento ou pela venda, o que é particularmente relevante numa ótica de avaliação de riscos.

As empresas dos setores da construção e atividades imobiliárias serão as potencialmente mais afetadas por uma materialização de riscos no mercado imobiliário comercial. Estas empresas tiveram um ajustamento muito significativo na sequência da crise da dívida soberana, que se refletiu na melhoria dos principais indicadores financeiros. Os níveis de rendibilidade situam-se num máximo em termos históricos, a autonomia financeira aumentou, diminuiu a dependência de financiamento bancário e melhorou significativamente a capacidade de serviço da dívida (Gráfico C.2.1). Em particular, na atividade doméstica, o stock de crédito bancário (incluindo uma componente residual de títulos de dívida) reduziu-se de 45 mil milhões de euros em 2009, para entre 16 mil e 17 mil milhões de euros nos últimos 4 anos. Apesar da melhoria da situação financeira, continuam a existir focos de vulnerabilidades nestes dois setores, que mantêm indicadores financeiros de risco agravados por comparação com o total das empresas.

  1. Empréstimos a empresas garantidos por imóveis comerciais por setor de atividade ― dezembro de 2023 | Em percentagem

 

Peso do setor no total de empréstimos a empresas garantidos por imóveis

Peso dos empréstimos garantidos por imóveis no total de empréstimos ao setor

Atividades imobiliárias

31,2

82,7

Alojamento e restauração

18,5

66,7

Indústria transformadora

10,8

18,3

Comércio

8,7

14,7

Promoção imobiliária e construção de edifícios

8,1

55,9

Outros serviços

6,8

37,3

Agricultura e pesca

6,0

46,1

Atividades de consultoria e administrativas

5,0

19,0

Eletricidade, gás e água e indústria extrativa

1,6

16,6

Outra construção

1,4

11,0

Transportes

1,1

5,2

Telecomunicações

0,3

8,4

Fonte: Banco de Portugal. | Nota: Detalhe apurado com base em informação da Central de Responsabilidades de Crédito (CRC). Como pressuposto da análise foram considerados todos os empréstimos a empresas garantidos por imóveis, independentemente da classificação do imóvel como comercial no reporte à CRC, aproximando o universo da definição de imobiliário comercial da Recomendação ESRB 2016/14, que foi alargada em 2019, passando a incluir, para além de imóveis comerciais geradores de rendimento (existentes ou em fase de promoção/construção), imóveis detidos pela empresa para uso próprio/desenvolvimento da sua atividade e imóveis para arrendamento habitacional (desde que detidos por pessoas coletivas), incluindo habitação social. O setor da construção (Secção F da CAE) foi dividido entre empresas mais diretamente ligadas à promoção imobiliária e construção de edifícios (CAE 41) e empresas de engenharia civil e de atividades especializadas de construção (CAE 42 e 43), identificadas no quadro como “Outra construção”. Os empréstimos ao setor das atividades imobiliárias (CAE 68), compreendem maioritariamente empréstimos a empresas cuja atividade principal é a compra e venda e arrendamento de imóveis, sendo residual o peso das empresas de mediação imobiliária e de administração de imóveis por conta de outrem.

As empresas dos setores d a construção e atividades imobiliárias são sensíveis ao aumento das taxas de juro. Para além da imediata transmissão ao custo do novo crédito, o predomínio de empréstimos com taxa de juro variável (75% do stock em dezembro de 2023) traduziu-se num rápido aumento do custo do stock de empréstimos, de 2,5% na construção e 2,2% nas atividades imobiliárias, em junho de 2022, para 5,9% e 5,6%, respetivamente, em dezembro de 2023.

  1. Indicadores económico-financeiros das empresas | Em percentagem e em número de vezes

Rendibilidade do ativo

Autonomia financeira

Rácio de cobertura dos gastos de financiamento

Empréstimos bancários em % dos financiamentos obtidos

Fonte: Banco de Portugal. | Notas: Empréstimos bancários em % dos financiamentos obtidos apenas disponível até 2022. Dados relativos ao setor das atividades imobiliárias não disponíveis (isoladamente) para os 3 indicadores com informação até 2023. O rácio de cobertura de gastos de financiamento (RCGF) corresponde ao número de vezes em que o EBITDA gerado pelas empresas é superior aos gastos de financiamento. Um valor superior no RCGF traduz uma menor pressão financeira. Os gastos de financiamento incluem juros e outros custos suportados pela empresa associados aos financiamentos obtidos.

Estima-se que a percentagem de empresas dos setores da construção e atividades imobiliárias em situação de vulnerabilidade financeira (com RCGF inferior a 2) tenha aumentado em 2023 e estabilize em 2024, próximo de 30%. O aumento deverá ser mais acentuado no setor das atividades imobiliárias (de 25% para 36%), por comparação com as restantes empresas consideradas na análise (Gráfico C2.2). Adicionalmente, estima-se que o aumento da vulnerabilidade financeira ocorra maioritariamente por subida da proporção de empresas relativamente menos vulneráveis, i.e., com RCGF superior a 1. Os valores estimados encontram-se abaixo dos observados antes da crise financeira internacional, em particular em 2007, ano caraterizado por taxas de juro mais próximas das esperadas em 2024. Nesse ano, a percentagem de empresas em vulnerabilidade financeira foi de 24% para o total das empresas, de 55% no setor da promoção imobiliária e construção de edíficios e de 47% no setor das atividades imobiliárias, refletindo a elevada alavancagem destes setores.

  1. Distribuição das empresas de acordo com o rácio de cobertura de gastos de financiamento, por setor de atividade | Em percentagem

Fonte: Banco de Portugal. | Notas: As percentagens correspondem à proporção de empresas em cada classe de rácio de cobertura de gastos de financiamento (RCGF), ponderadas pelo ativo total. A projeção do RCGF tem por base um exercício de simulação das demonstrações financeiras ao nível da empresa, tal como apresentado em Augusto, F. et al, (2022). “Modelling the financial situation of Portuguese firms using micro-data: a simulation for the COVID-19 pandemic”, Banco de Portugal, Occasional Paper 2022. A informação individual das empresas para 2023 é projetada, uma vez que ainda não existem dados completos das demonstrações financeiras para este ano. O exercício de simulação tem como base o cenário económico descrito no Boletim Económico de março de 2024. Relativamente à decomposição dos setores da construção e atividades imobiliárias ver nota do quadro C2.1. O conjunto “Outros setores | Com colateral CRE” compreende empresas dos restantes setores de atividade que tenham pelo menos um crédito garantido por um imóvel, independentemente do seu valor.

O risco de crédito nos empréstimos CRE tem-se materializado no período recente no panorama internacional, concentrado em bancos especializados ou de menor dimensão. O problema tem-se revelado sobretudo nos EUA, em particular no segmento dos escritórios, onde existe um excesso de oferta resultante do aumento do trabalho remoto pós pandemia e uma excessiva concentração das exposições num conjunto limitado de bancos. Na área do euro, o risco é menor, mas tem-se observado um ligeiro aumento do incumprimento nos empréstimos garantidos por imóveis comerciais e uma maior restritividade dos critérios de concessão deste tipo de crédito (Financial Stability Review, Banco Central Europeu, maio de 2024).

Em Portugal, não existe evidência de materialização de risco relevante nos empréstimos CRE ou nos empréstimos aos setores da construção e das atividades imobiliárias. Em 2023, o volume de empréstimos NPL diminuiu em ambos os casos cerca de 30%. Em particular, o volume de entradas em NPL de empréstimos CRE em 2023 foi inferior ao observado entre 2020 e 2022 e observou-se um aumento do rácio de cobertura de NPL por imparidades de 6,3 pp, para 53,2%. A evolução dos empréstimos em stage 2 foi também favorável: redução de 10% em 2023, que num contexto de redução da exposição se traduziu numa relativa estabilização do rácio de empréstimos em stage 2 em torno de 16%. Neste contexto, observou-se a continuação da trajetória de redução dos rácios de NPL brutos e líquidos registada nos últimos anos no caso dos empréstimos CRE e, de forma ainda mais acentuada, no caso dos empréstimos a empresas nos setores da construção e das atividades imobiliárias (Quadro C2.2). Apesar da heterogeneidade entre bancos, os empréstimos CRE estão distribuídos entre as maiores instituições, na maior parte dos casos representando entre 22% e 33% dos empréstimos a empresas, e entre 4% e 7% do ativo total da instituição.

  1. Rácios de NPL bruto e líquido de imparidades | Em percentagem

 

dez. 16

dez. 17

dez. 18

dez. 19

dez. 20

dez. 21

dez. 22

dez. 23

Rácio de NPL bruto

 
 
 
 
 
 
 
 

Sociedades não financeiras

29,5

25,2

18,5

12,3

9,7

8,1

6,5

5,0

d.q. Empréstimos garantidos por imóveis comerciais

n.d.

36,4

27,3

18,4

15,6

12,4

11,5

8,5

d.q. Construção e atividades imobiliárias

46,3

40,9

29,8

18,5

13,7

10,4

7,8

5,4

Rácio de NPL líquido

 
 
 
 
 
 
 
 

Sociedades não financeiras

15,1

11,6

8,0

5,4

4,2

3,8

2,8

2,0

d.q. Empréstimos garantidos por imóveis comerciais

n.d.

18,2

13,8

9,6

8,3

7,2

6,1

4,0

d.q. Construção e atividades imobiliárias

22,0

18,3

12,5

6,5

4,3

3,5

1,9

0,8

Fonte: Banco de Portugal. | Notas: O rácio de NPL bruto corresponde ao rácio entre o valor bruto dos NPL e o valor total bruto dos empréstimos. O rácio de NPL líquido corresponde ao rácio entre o valor dos NPL líquidos de imparidade e o valor total bruto dos empréstimos. Dados para o sistema bancário português em base consolidada (FINREP).

Os critérios de concessão de crédito a empresas foram mais restritivos nos últimos anos, com maior exigência de garantias e/ou de capitais próprios para aprovação de financiamento bancário. A percentagem de empréstimos concedidos a empresas de maior risco dos setores da construção e atividades imobiliárias reduziu-se de 49% em 2016 para perto de 30% nos últimos anos (Gráfico C2.3). Como consequência, os bancos estão atualmente menos expostos e menos vulneráveis a choques no mercado imobiliário comercial. Apesar dos desenvolvimentos favoráveis em termos de estabilidade financeira, é crucial que os bancos continuem a avaliar de forma prospetiva os riscos de exposição a este mercado.

  1. Novos empréstimos a empresas dos setores da construção e atividades imobiliárias por classe de risco | Em percentagem

Fonte: Banco de Portugal | Notas: Empréstimos concedidos por instituições financeiras monetárias residentes a empresas não financeiras residentes em Portugal. O risco de crédito, medido pela probabilidade de incumprimento, tem por base notações de crédito disponíveis no Sistema Interno de Avaliação de Crédito do Banco de Portugal (SIAC). Apenas foram consideradas as novas operações de empresas com informação de risco disponível. A classe de menor risco (classe de risco 1) corresponde a empresas com probabilidade estimada de incumprimento (PD) a um ano inferior ou igual a 1%; a classe de risco 2 corresponde a empresas com PD a um ano superior a 1% e inferior ou igual a 5% e a classe de maior risco (classe de risco 3) corresponde a empresas com PD a um ano superior a 5%.

 
  1. Abrangente ou setorial? Os impactos do CCyB e do SyRB setorial

A reserva contracíclica de fundos próprios (countercyclical capital buffer — CCyB) e a reserva para risco sistémico setorial (sectoral systemic risk buffer — SyRB setorial) são dois dos instrumentos disponíveis no quadro regulamentar prudencial da União Europeia. O CCyB corresponde a uma reserva de fundos próprios que deve ser constituída para proteger o setor bancário em períodos em que os riscos sistémicos cíclicos ou as vulnerabilidades para a estabilidade financeira estão a aumentar devido a um crescimento excessivo do crédito. O SyRB setorial é uma reserva de fundos próprios que pode ser aplicada ao montante total das posições em risco de um subconjunto de posições em risco e visa aumentar a resiliência do sistema financeiro à possível materialização do risco sistémico específico a um setor/geografia ou posição em risco. Tanto o CCyB como o SyRB setorial asseguram que os bancos estão mais bem preparados para absorver perdas inesperadas, continuando simultaneamente a conceder crédito à economia.

É importante comparar o impacto, a curto e longo prazos, do SyRB setorial e do CCyB na estabilidade financeira e na atividade económica. No Espaço Económico Europeu (EEE), dez países anunciaram a ativação de um SyRB (Malta, Finlândia, França, Portugal e Itália), alteraram o nível de um SyRB existente (Roménia, Bélgica e Eslovénia) ou reafirmaram o nível de um SyRB existente (Listenstaine e Bulgária) entre janeiro de 2023 e março de 2024. Seis destes dez SyRB são setoriais, visando posições em risco sobre o setor imobiliário (Malta, Portugal, Bélgica, Eslovénia e Listenstaine) ou sobre sociedades não financeiras (França). Em novembro de 2023, o Banco de Portugal anunciou um SyRB setorial para exposições garantidas por imóveis residenciais, o qual entrará em vigor em 1 de outubro de 2024. A aplicação preventiva deste instrumento macroprudencial justifica-se pela necessidade de aumentar a resiliência das instituições financeiras à materialização de potenciais riscos sistémicos no mercado imobiliário residencial em Portugal. A utilização do CCyB é mais generalizada, tendo sido adotado por 21 países do EEE11.

Para avaliar os efeitos da implementação do CCyB e do SyRB setorial, utilizamos o modelo macroeconómico com três níveis de incumprimento (doravante, “modelo 3D”) de Clerc et al. (2015), calibrado para a economia portuguesa como descrito em Lima et al. (2023). Este modelo introduz a intermediação financeira e o incumprimento entre os agentes num modelo dinâmico estocástico de equilíbrio geral que, de resto, é um modelo-padrão. A economia representada inclui famílias, empreendedores e bancos. As famílias “pacientes” poupam e depositam as suas poupanças em bancos, enquanto as famílias “impacientes” contraem empréstimos bancários para financiar investimentos em imóveis residenciais. Ambos os tipos de famílias consomem, investem em habitação e trabalham no setor da produção. Os empreendedores utilizam capital, património líquido herdado e crédito bancário para os seus investimentos. No setor da produção, empresas perfeitamente competitivas produzem o bem final, capital físico novo e habitação. No modelo, bancos especializados concedem crédito a famílias “impacientes” para investimento em habitação (crédito à habitação) e a empreendedores (crédito às empresas). Os bancos financiam-se através de depósitos e capital próprio. Os bancos estão sujeitos a requisitos de capital regulamentar e operam com responsabilidade limitada. Todos os agentes, incluindo as famílias, os empreendedores e os bancos, podem entrar em incumprimento. Os depósitos são garantidos por um sistema de garantia de depósitos financiado por um imposto cobrado às famílias.

O modelo 3D proporciona uma lógica para a regulamentação em matéria de capital, que decorre de dois tipos de distorções: (i) a responsabilidade limitada dos bancos devido à existência de um sistema de garantia de depósitos e (ii) a externalidade do custo de financiamento dos bancos na qual a taxa passiva não depende totalmente do risco de incumprimento de cada banco, mas sim do risco de incumprimento bancário a nível de todo o sistema. Ambas as distorções incentivam os bancos a expandir a sua alavancagem e a conceder crédito excessivo à economia, fundamentando a imposição de requisitos de capital regulamentar. O modelo incorpora também uma terceira distorção relacionada com o incumprimento por parte dos agentes económicos, a qual causa fricções no financiamento externo através de custos relacionados com falências e de acesso limitado ao crédito, resultando numa afetação subótima do crédito.

O modelo 3D é apropriado para a análise do impacto de requisitos de capital abrangentes e setoriais, dado que distingue entre segmentos de crédito à habitação e de crédito às empresas, e os requisitos de capital associados, através de uma representação estilizada da economia. Primeiro, pressupõe-se a presença de bancos representativos que concedem empréstimos a famílias “impacientes” (crédito à habitação) ou a empreendedores (crédito às empresas). Não temos em conta a heterogeneidade dos modelos financeiros e de negócio entre instituições. Segundo, as reservas de gestão dos bancos continuam a ser fixas e não mudam endogenamente no modelo, o que implica um aumento obrigatório dos rácios de capital para os bancos, em paralelo com a implementação das reservas de fundos próprios. Esta caraterística do modelo é uma simplificação significativa da realidade, uma vez que os bancos possuem frequentemente reservas de gestão que lhes permitem cumprir os novos requisitos de capital, evitando assim ter de desalavancar para o fazer. O impacto do aumento das reservas de fundos próprios, especialmente no curto prazo, é influenciado por esta caraterística, como descrito em maior pormenor de seguida.

Para avaliar o impacto do CCyB, introduzimos um aumento permanente de 0,25 pontos percentuais (pp) dos requisitos de capital tanto para o crédito à habitação como o crédito às empresas, o que equivale a um SyRB setorial de 4%, conforme anunciado pelo Banco de Portugal em 2023. Representa também a percentagem mínima de CCyB que uma autoridade nacional pode aplicar, servindo de base para a avaliação do seu impacto. A natureza permanente implica a transição de uma posição de equilíbrio para outra. Pressupõe-se um período de implementação gradual de um ano, a contar da data do anúncio, para a constituição da reserva de fundos próprios adicional, com aumentos uniformes ao longo desse período.

Para avaliar o impacto do SyRB direcionado ao setor imobiliário, tomamos em consideração o montante de capital próprio obtido para cumprimento do aumento do CCyB. Subsequentemente, calibramos um SyRB setorial para se ajustar a esse montante ex ante. Este procedimento resulta num aumento permanente de 0,62 pp dos requisitos de capital aplicáveis aos bancos especializados em crédito à habitação. Para a implementação, seguimos os mesmos pressupostos utilizados para o CCyB, o que envolve um aumento linear ao longo do período de implementação gradual de um ano.

No modelo, o CCyB e o SyRB setorial contribuem para reforçar a resiliência do sistema bancário, apesar das diferenças nos respetivos mecanismos de transmissão (Gráfico C3.1). O CCyB melhora a resiliência de ambos os tipos de bancos especializados, ou seja, bancos que concedem empréstimos a famílias “impacientes” (crédito à habitação) e bancos que concedem empréstimos a empreendedores (crédito às empresas), exercendo um efeito negativo generalizado em ambos os segmentos de crédito. Tal resulta numa redução média a um ano de 0,5% no crédito à habitação e de 0,7% no crédito às empresas. No entanto, conduz a uma redução mais ligeira da taxa de incumprimento dos bancos, com uma redução média a um ano de 7,6% e de 15,2% no longo prazo. Sendo mais direcionado, o SyRB setorial contribui para uma maior redução das taxas de incumprimento para os bancos especializados em crédito à habitação, o que resulta em reduções da taxa de incumprimento dos bancos de 11,1% e 21,9%, respetivamente, no curto e no longo prazo. Esta melhoria da resiliência ocorre apesar de não ter um impacto direto no segmento de crédito às empresas.

  1. Impacto do CCyB e do SyRB setorial | Em percentagem por trimestre

Rácio de capital dos bancos especializados em crédito às empresas

Rácio de capital dos bancos especializados em crédito à habitação

Taxa média de incumprimento dos bancos

Crédito à habitação

Crédito às empresas

Crédito total

PIB

Consumo

Investimento

Fonte: Banco de Portugal. | Notas: Dinâmica das variáveis após a implementação do CCyB e do SyRB setorial. “E.E.” significa estado estacionário, ou seja, a posição de equilíbrio inicial da economia.

Ao contrário do SyRB setorial, o CCyB implica uma menor contração de curto prazo do crédito à habitação (0,5%) e do crédito total (0,6%), com um menor impacto de longo prazo no crédito total (um aumento de 0,04%). A contração do crédito à habitação é mais pronunciada na implementação do SyRB setorial (contração média a um ano de 1,6%), o que também se reflete no crédito total (0,9% para a média a um ano). Não obstante, a descida de curto prazo do crédito às empresas é mais ligeira com um instrumento deste tipo (0,004% para a média a um ano). A redução do crédito durante o período de implementação gradual está relacionada com o pressuposto de reservas de gestão fixas utilizado no modelo. Note-se, porém, que, na prática, as autoridades macroprudenciais têm em consideração a existência de margem de manobra em termos de capital para cumprimento dos requisitos de fundos próprios adicionais aquando da introdução de uma medida em matéria de fundos próprios, a fim de evitar perturbações na concessão de crédito no curto prazo.

Embora o efeito de longo prazo do SyRB setorial seja positivo para ambos os tipos de empréstimos, o impacto positivo de longo prazo do CCyB no crédito à habitação é obtido à custa de um impacto negativo no crédito às empresas, devido à reafetação de recursos. Esta reafetação de recursos explica-se pela interação entre o balanço dos bancos e os requisitos de capital presentes no modelo, conjugada com o menor ponderador de risco atribuído ao crédito à habitação, o que motiva uma mudança do crédito às empresas para o crédito à habitação no longo prazo.

O CCyB e o SyRB setorial impactam negativamente o PIB no curto prazo devido à contração do investimento (cerca de 0,05% no primeiro trimestre). No entanto, no novo equilíbrio, verifica-se um aumento do nível do PIB, nomeadamente um aumento de 0,05% com a introdução do CCyB e de 0,1% com a introdução do SyRB setorial. Este aumento é impulsionado pela melhoria do consumo agregado e do investimento a mais longo prazo. Uma vez que a taxa de incumprimento dos bancos cai mais com o SyRB setorial do que com o CCyB, o custo fiscal do incumprimento para a economia diminui, deixando as famílias com um excedente de rendimento. Estas utilizam este excedente para aumentar o consumo. O maior consumo agregado de bens finais desencadeado pelo SyRB setorial, em comparação com o CCyB, explica o maior aumento do investimento em capital físico, apoiado pelo efeito positivo de longo prazo no crédito às empresas.

Em suma, os resultados sugerem que o SyRB setorial é mais adequado do que o CCyB quando as autoridades macroprudenciais estão perante uma fonte setorial de risco sistémico específica. O CCyB é preferível quando as fontes de risco são mais abrangentes, ou seja, quando estão relacionadas com ambos os segmentos de crédito. A escolha entre estes instrumentos depende do objetivo específico dos decisores de política e está ligada ao respetivo mecanismo de transmissão. O âmbito mais alargado do CCyB ajuda a reforçar a resiliência do setor bancário e dá resposta aos riscos sistémicos e vulnerabilidades acumulados durante a fase de expansão do ciclo financeiro e macroeconómico. Neste cenário, o canal de transmissão opera em todos os segmentos de crédito. Em contrapartida, o SyRB setorial, um instrumento direcionado, está mais bem preparado para fazer face a riscos sistémicos específicos, quer cíclicos quer estruturais, com repercussões mínimas em outros setores do crédito, de acordo com estes resultados.

Relativamente ao crédito e à atividade económica, tanto o SyRB setorial como o CCyB apontam para um trade-off intertemporal, sendo uma ligeira contração no curto prazo o custo da criação de condições conducentes a efeitos benéficos no longo prazo. Contudo, na realidade, uma tal contração temporária e de curta duração deve ser consideravelmente minimizada ou mesmo ignorada, tendo em conta a capacidade dos bancos para utilizar as suas reservas de gestão para fins de cumprimento dos requisitos, um fator que não foi considerado na presente análise devido aos pressupostos do modelo. No entanto, para ambos os instrumentos, verifica-se um impacto positivo de longo prazo no crédito e na atividade económica, impulsionado por uma maior resiliência do sistema bancário, o que reduz a probabilidade de ocorrer uma crise financeira e promove a estabilidade financeira.

Referências

Clerc, L., Derviz, A., Mendicino, C., Moyen, S., Nikolov, K., Stracca, L., Suarez, J. e Vardoulakis, A. P. (2015). “Capital Regulation in a Macroeconomic Model with Three Layers of Default.” International Journal of Central Banking, 11(3), 9–63.

Lima, D., Maia, D. e Pereira, A. (2023). “Structural and cyclical capital instruments in the 3D model: a simulation for Portugal.” Working Papers 2023/15, Banco de Portugal.

 
  1. A eficiência do sistema bancário português na perspectiva do rácio cost-to-core-income

O rácio cost-to-income é um dos indicadores contabilísticos e financeiros utilizados para avaliar a eficiência operacional dos bancos. Esta métrica mede a proporção dos custos de estrutura incorridos no decurso das operações regulares dos bancos (i.e., os custos operacionais, compreendendo custos com o pessoal, outros gastos gerais administrativos e amortizações) nos proveitos operacionais gerados (i.e., o produto bancário, compreendendo margem financeira, comissões líquidas, resultados de operações financeiras e outros resultados de exploração). Ceteris paribus, valores mais baixos do rácio estão associados a uma maior eficiência operacional e a uma menor alavancagem operacional, contribuindo para mitigar a sensibilidade da rendibilidade face a reduções nas receitas. O modelo de negócio e o grau de concorrência no mercado podem influenciar este indicador. Por exemplo, existe evidência que aponta para o melhor desempenho de bancos comerciais com um financiamento predominantemente à base de depósitos (Roengpitya et al, 2017). Uma variante desse rácio, o cost-to-core-income, inclui apenas os proveitos operacionais que decorrem da atividade principal dos bancos de retalho (margem financeira e comissões líquidas).

A eficiência operacional do sistema bancário português medida pelo rácio cost-to-core-income melhorou ao longo da última década, apresentando atualmente um dos níveis mais reduzidos no plano europeu (Gráfico C4.1). Entre 2009 e 2014, Portugal apresentou um rácio cost-to-core-income médio de 73%, superior aos 70% na área do euro (AE). A partir de 2013, o valor desse indicador diminuiu de forma consistente, refletindo-se numa redução acumulada de 41 pp até 2023. A partir de 2015, assumiu valores inferiores à média da área do euro, tendo o diferencial atingido o máximo em 2023 (21 pp).

  1. Rácio cost-to-core-income | Em percentagem

Fontes: BCE (CBD) e Banco de Portugal. | Notas: Os valores entre 2009–13 para a área do euro foram estimados com recurso a séries que consideram apenas os grupos bancários domésticos de cada país. O intervalo entre os percentis 90 e 10 foi apurado com base nos dados dos países da área do euro. (a) Os dados de 2023 da área do euro referem-se a setembro (valores anualizados).

A melhoria da eficiência operacional dos bancos portugueses deveu-se à redução dos custos operacionais, que teve lugar após a crise financeira internacional, e, mais recentemente, ao aumento da margem financeira (Gráfico C4.2). Entre 2009 e 2021, os custos operacionais diminuíram 30% (-2350 M€). Neste período, o número de balcões e de empregados em Portugal reduziu-se em 44% e 23%, respetivamente, evolução que seguiu de perto a da mediana da área do euro. Esta dinâmica refletiu a necessidade de ajustamento do setor bancário após a crise financeira internacional, situação que se agudizou com a crise da dívida soberana, e a execução de planos de restruturação decorrentes da recapitalização pública de algumas das principais instituições. Ao invés, no mesmo período, os custos operacionais aumentaram 11% na área do euro. Nos últimos dois anos, os custos operacionais aumentaram 13% em Portugal (8% na área do euro), revertendo apenas parcialmente a redução observada desde 2009 e refletindo a transmissão da inflação às despesas com pessoal, nomeadamente salários e outros gastos gerais administrativos. No tocante aos proveitos operacionais, a margem financeira reduziu-se de forma mais acentuada em Portugal entre 2009 e 2021 e aumentou nos últimos dois anos com o ciclo de subida das taxas de juro. Este aumento foi significativamente mais pronunciado em Portugal do que na área do euro, refletindo o elevado peso dos empréstimos a taxa variável nos balanços dos bancos, que rapidamente transmitiram à economia as decisões de política monetária. Perante um cenário central de redução futura das taxas de juro, é expectável que a margem financeira se venha a reduzir, impacto que será mitigado pelo ajustamento dos bancos nas estratégias de gestão do risco de taxa de juro. Por sua vez, as comissões mantiveram-se estáveis em Portugal desde 2009, enquanto aumentaram 40% na área do euro.

  1. Rendimento de exploração, custos operacionais e rácio cost-to-core-income  
    | Mil milhões de euros (escala da esquerda) e percentagem (escala da direita)

Portugal

Área do euro

Fontes: BCE (CBD) e Banco de Portugal. | Notas: Os valores entre 2009-13 para a área do euro foram estimados com recurso a séries que consideram apenas os grupos bancários domésticos de cada país. (a) Os dados de 2023 da área do euro referem-se a setembro (valores anualizados).

Em 2023, o sistema bancário português apresentou custos operacionais, em percentagem do ativo total, similares aos da área do euro e um rendimento de exploração mais elevado (Gráfico C4.3). Os custos com pessoal e outros gastos administrativos, que incluem, entre outros, despesas com salários, contribuições para a segurança social e despesas com tecnologias de informação, serviços de consultoria e publicidade, representam a maioria dos custos operacionais dos sistemas bancários na área do euro. Em Portugal, estas rúbricas representam, em conjunto, ‑1,2% do ativo total (-1,1% na área do euro). Por sua vez, a margem financeira é a componente mais importante da rendibilidade, apesar de se verificar heterogeneidade entre os países da área do euro. Em Portugal, a margem financeira fixou-se em 2,7% do ativo total, acima da área do euro (1,4%). As comissões apresentam um peso inferior, sendo os valores de Portugal e da área do euro muito próximos (0,7% e 0,6%, respetivamente).

  1. Proveitos e custos operacionais e rácio cost-to-core-income, 2023 (a)

Fontes: BCE (CBD) e Banco de Portugal. | Nota: (a) À exceção de Portugal, os dados de 2023 referem-se a setembro (valores anualizados).

Em Portugal, o redimensionamento do sistema bancário contribuiu para a redução de custos operacionais e tem possibilitado o investimento acrescido na digitalização em anos recentes. Entre 2009 e 2023, o peso do sistema bancário no total da economia, medido pelo rácio ativo total sobre o PIB, diminuiu 121 pp, fixando-se em 166%. A redução dos custos de estrutura é relevante para a competitividade dos bancos portugueses, atendendo ao necessário reforço do investimento em inovação tecnológica e digitalização que lhes permita acompanhar o progresso a nível internacional, seja por bancos ou por novas entidades a desenvolverem atividade financeira. A crescente digitalização dos serviços financeiros implica também cuidados e investimentos acrescidos em áreas críticas de gestão de risco como a cibersegurança. Entre 2021 e 2023, as despesas com tecnologia de informação aumentaram, em média, 13% ao ano. Este investimento na transformação digital potencia reduções de custos pela racionalização de recursos e processos. De acordo com o Financial Access Survey (FMI), entre 2018 e 2022, o número de transações bancárias através de canais digitais por mil adultos em Portugal aumentou, em média, 30% ao ano (face a 16% num subconjunto de países da área do euro para os quais esta informação se encontra disponível). No entanto, o nível de transações permanece baixo face ao observado na Europa (44 vs. 100 mil, em 2022).

Importa salientar que a utilização de informação contabilística para avaliar a eficiência dos bancos tem limitações, dado que os ganhos de eficiência observados através de demonstrações financeiras podem ser influenciados por economias de escala e a eficiência real (empírica) dos bancos pode ser independente da sua dimensão (Huljak et al., 2019). Adicionalmente, apesar de capturarem vários aspetos importantes do desempenho dos bancos, estes indicadores dependem de fatores específicos do país, como o custo do trabalho (Moccero et al, 2019).

Referências

Huljak, I. (2015). “Cost Efficiency of Banks in Croatia”. Croatian Review of Economic, Business and Social Statistics. 1. 12-26. 10.1515/crebss-2016-0002.

Huljak, I., Martin, R. e Moccero, D. (2019). “The Cost-Efficiency and Productivity Growth of Euro Area Banks.” Working paper, European Central Bank.

Roengpitya, R., Tarashev, N., Tsatsaronis, K. e Villegas, A. (2017), “Bank business models: popularity and performance”, No 682, BIS Working Papers, Bank for International Settlements.

 
  1. Revisão do sistema de implementação de política monetária do Banco Central Europeu — A perspetiva da estabilidade financeira

Em 13 de março de 2024, o Conselho do BCE concluiu o processo de revisão do sistema de implementação da política monetária, iniciado no final de 202212. A escolha do sistema de implementação da política monetária, ou quadro operacional, não é indiferente e pode ter efeitos sobre a estabilidade financeira, no curto e no longo prazos. O seu desenho é suscetível de afetar o funcionamento dos mercados e o comportamento dos intermediários financeiros, o montante de liquidez do banco central disponível para o sistema e, assim, a sua capacidade para contrariar as tensões de liquidez nos mercados financeiros. Por conseguinte, a definição das suas características exige a avaliação cuidadosa dos riscos associados, que largamente refletem os incentivos que são criados ao comportamento dos vários agentes económicos.

Para alcançar o seu objetivo primordial, de manutenção da estabilidade de preços, compete ao Conselho do BCE decidir, com base na análise económica e na análise monetária e financeira, o nível das taxas de juro de curto prazo necessário para assegurar a estabilidade de preços no médio prazo, procurando influenciar as condições prevalecentes no mercado monetário e, deste modo, as taxas de juro que os bancos comerciais praticam nos empréstimos e depósitos aos demais agentes económicos. O Eurosistema dispõe de um conjunto de instrumentos para ceder, ou absorver, liquidez do sistema financeiro, com impacto nas taxas de juro de curto prazo, e opera ao abrigo de um conjunto de regras que, em conjunto, constituem o sistema de implementação da política monetária. Este sistema baseia-se em três elementos principais: (i) os instrumentos, (ii) os ativos de garantia (transacionáveis e não transacionáveis) e (iii) as contrapartes. Os instrumentos compreendem as operações de política monetária, as facilidades permanentes, os requisitos de reservas mínimas e indicações sobre a orientação futura da política monetária (forward guidance).

Através das taxas de juro aplicáveis às operações principais de refinanciamento, à facilidade permanente de cedência marginal de liquidez e à facilidade permanente de depósito, o Conselho do BCE sinaliza a orientação da política monetária. Na persecução do seu mandato, podem também ser definidas e implementadas medidas não convencionais de política monetária, como os programas de compra de ativos. Esta situação ocorreu de forma significativa na última década e meia, originando um quadro de ampla liquidez, que se antecipa que prevaleça por mais algum tempo.

No quadro operacional original do BCE, usualmente designado por sistema de corredor clássico, que prevaleceu até sensivelmente meados de 2014, o banco central procurava manter as taxas de juro do mercado monetário entre a taxa da facilidade permanente de cedência de liquidez (limite superior do corredor) e a taxa da facilidade permanente de depósito (limite inferior do corredor), por via da realização regular de operações de gestão da liquidez de mercado (tipicamente cedência de fundos) (Figura C5.1). Este sistema era também caracterizado, em regra, por uma escassez estrutural de liquidez no mercado monetário, que levava a que as taxas de juro do mercado monetário flutuassem em torno das taxas das operações principais de refinanciamento (na sigla inglesa, MRO — main refinancing operations). Contudo, face aos diversos desafios da área do euro, os últimos anos foram marcados por amplas condições de liquidez, com a realização de operações de crédito de prazo alargado e de compras de ativos financeiros, que levaram o sistema de corredor das taxas de juro diretoras, ainda que formalmente em vigor, a converter-se, progressivamente, num sistema de floor (taxa mínima) de facto. A taxa de juro do mercado monetário passou a estar numa vizinhança estreita da taxa da facilidade permanente de depósito (na sigla inglesa, DFR, deposit facility rate) (mais detalhe sobre este processo pode ser encontrado na caixa 2 do Relatório da Implementação da Política monetária 2022, Banco de Portugal). O contexto de normalização do balanço do Eurosistema, i.e. de redução gradual do excesso de liquidez, suscitou uma reflexão sobre a forma mais adequada de orientar as taxas de juro de curto prazo.

  1. Sistemas estilizados de implementação de política monetária na área do euro

Sistema de corredor

Sistema de taxa mínima (floor)

Análise na perspetiva da estabilidade financeira

A reflexão sobre o sistema de implementação a adotar foi avaliada no espaço de possibilidades definido, de um modo geral, considerando fundamentalmente dois tipos de sistemas: o sistema de corredor, anteriormente descrito, e o sistema de floor, caracterizado por um contexto de elevada liquidez, gravitando as taxas de juro do mercado monetário numa vizinhança estreita da taxa de depósito. Este sistema tem geralmente associada uma carteira estrutural de ativos financeiros adquiridos no mercado a título definitivo (outright), em operações que são conduzidas pelo Eurosistema sempre que pretenda ajustar a sua posição estrutural face ao setor financeiro. Assim, no sistema de floor pode manter-se atividade regular no mercado, tendo em vista a renovação dessa carteira, o que, em geral, implica um balanço do banco central de maior dimensão do que o que se verificaria num sistema de corredor, em que a cedência de liquidez se opera por meio de operações contra a mobilização de ativos de garantia.

Um balanço de banco central de maior dimensão pode promover a estabilidade financeira: (i) ao mitigar os riscos de liquidez dos bancos devido à disponibilidade de amplas reservas, tipicamente sob a forma de ativos líquidos, (ii) ao contribuir para a transferência de riscos de duração e de crédito dos intermediários financeiros para o sector público e (iii) ao limitar o risco de uma dinâmica de mercado desordenada e os riscos de fragmentação associados.

Porém, a atuação nos mercados de títulos de dívida traduz-se, tendencialmente, numa compressão dos prémios de risco de crédito e de prazo, conducente a uma curva de rendimentos mais horizontal, com efeitos potencialmente adversos para a estabilidade financeira. Estes efeitos, que tendem a acumular-se gradualmente a médio e longo prazos, passam por incentivos aos intermediários financeiros para a assunção de riscos adicionais (e.g., de crédito e/ou de liquidez), decorrentes de potenciais efeitos adversos na rendibilidade, nomeadamente para os bancos, as sociedades de seguros e os fundos de pensões (com ativos tipicamente com maturidades mais longos). A existência de um regime regulamentar e a análise regular da supervisão para contrariar esses incentivos para os bancos são essenciais, em particular no respeitante à gestão prudente da liquidez pelos bancos, algo mais complexo de atingir no sistema de floor. Com efeito, os incentivos associados à atual regulamentação da liquidez (introduzida após a crise financeira global) são atenuados, sobretudo no tocante ao cumprimento do rácio de cobertura de liquidez (LCR, na sigla inglesa).

No sistema de floor, a gestão da liquidez é também impactada por uma menor atividade no mercado monetário interbancário, dada a grande quantidade de reservas do banco central. Um mercado monetário ativo é importante para a estabilidade financeira, uma vez que, em princípio, apoia a gestão da liquidez dos bancos e proporciona a disciplina do mercado e o acompanhamento pelos pares.

Uma dimensão para a qual o sistema de floor se afigura comparativamente mais adequado está associada ao cumprimento da função de prestamista de última instância pelos bancos centrais, essencial para a estabilidade financeira em períodos de stress. Na verdade, é um sistema mais adequado não apenas à função de prestamista de última instância para fazer face a pressões de liquidez de âmbito mais específico aos bancos, mas também à de market-maker of last resort, evitando disfunções sistémicas do mercado. Esta dimensão tem vindo a ganhar particular relevância dado o crescente papel no sistema financeiro dos intermediários financeiros não bancários, que não têm acesso a liquidez de banco central. Assim, em situações de tensão financeira, de forma a estabilizar o mercado, poderá ser necessária a injeção rápida e de volumes consideráveis de liquidez, que abranja um grupo suficientemente alargado de participantes. Adicionalmente, ao contrário do sistema de corredor, o sistema de floor limita as repercussões diretas da assistência do prestamista de última instância (ou das intervenções para estabilizar o funcionamento do mercado) sobre a orientação da política monetária. Todavia, poderá ter associada uma menor margem de manobra para intervir, devido ao maior risco de escassez de garantias e de oneração de ativos, dado o balanço relativamente maior do banco central.

A escolha do sistema de implementação tem também impacto sobre as condições de financiamento do sector não financeiro. De facto, na medida em que a provisão de liquidez contempla também a compra de instrumentos de dívida, fomentando assim taxas de juro de médio e longo prazo mais reduzidas, o sistema de floor poderá ter como contraponto níveis de dívida (pública e privada) mais elevados. Poderá ter também potenciais efeitos distributivos entre países/setores, uma vez que para um conjunto alargado de países, os custos de financiamento do crédito hipotecário em geral estão mais ligados às taxas de juro de longo prazo, enquanto as empresas não financeiras contraem, em grande medida, empréstimos a taxas variáveis, indexadas a taxas de referência de curto prazo.

Os argumentos apresentados sugerem que a robustez (i.e. capacidade para implementar a política monetária em diferentes contextos financeiros e de liquidez) e a flexibilidade (i.e. capacidade para satisfazer as necessidades de liquidez dos bancos de forma elástica, canalizando a liquidez de forma efetiva pelo sistema bancário) são dimensões chave na operacionalização do sistema de implementação da política monetária e revelam a existência de vantagens e desvantagens de cada sistema, no curto e médio prazo, em situação de normalidade, ou em situação de stress nos mercados financeiros.

Novo sistema operacional

O sistema de implementação da política monetária anunciado pelo BCE, a 13 de março, assume uma natureza híbrida e flexível, compreendendo, nas operações de crédito de curto prazo (MRO) e nas operações com prazo de 3 meses (na sigla inglesa, LTRO ― longer term refinancing operations ― a 3 meses), procedimentos de leilão de taxa fixa com satisfação integral da procura (na sigla inglesa, fixed rate full allotment ― FRFA) e um quadro de ativos de garantia amplo, compreendendo tanto ativos com elevada qualidade e liquidez de mercado, como sejam instrumentos de dívida pública, como ativos sem esses atributos, como créditos que cumpram requisitos de elegibilidade.

Estas características, ao conferirem segurança no acesso a liquidez, promovem a estabilidade financeira. A provisão de liquidez será feita de forma flexível, determinada pelas necessidades de financiamento dos bancos, através de um conjunto alargado de instrumentos que, para além das operações regulares, incluirá também operações estruturais de crédito e um portefólio estrutural. Este sistema de implementação é compatível com uma rápida alternância entre períodos normais e de stress, sem que tal implique que o banco central se torne o lender of first resort (ou o market maker of first resort), situação que, na perspetiva da estabilidade financeira, deve ser evitada, dado o conjunto de incentivos perversos que tem associada.

Algumas das desvantagens referidas podem ser mitigadas através de uma adequada calibração de determinados aspetos de implementação da política monetária (v.g., dimensão da carteira estrutural, conjugação de operações de cedência de liquidez com prazo e frequência diversos, características do quadro de ativos de garantia), ou, eventualmente, pela adoção de medidas eficazes por parte das autoridades prudenciais.

A incerteza sobre as alterações comportamentais e estruturais no sistema financeiro, algumas refletindo a reforma regulatória que se seguiu à crise financeira global, outras constituindo uma resposta endógena ao contexto de liquidez ampla que prevaleceu por um período prolongado, aconselha a um acompanhamento regular do mercado. Neste sentido, note-se que o Conselho do BCE informou também a 13 de março que pretende reavaliar os principais parâmetros do sistema de implementação da política monetária, em 2026, com base na experiência adquirida até lá, estando ainda preparado para introduzir ajustamentos mais cedo, se tal for necessário, para garantir que a implementação da política monetária permanece em linha com os princípios estabelecidos.

 

Temas em destaque

Política Macroprudencial em diferentes fases do ciclo financeiro: o caso português1

1 Política Macroprudencial — Objetivos, instrumentos e implementação

A política macroprudencial visa preservar a estabilidade financeira, cumprindo esse mandato através da persecução de dois objetivos: o aumento da resiliência e a diminuição do acumular de riscos e vulnerabilidades no sistema financeiro. Nos últimos anos, as autoridades macroprudenciais implementaram, de forma isolada ou em combinação, instrumentos macroprudenciais de dois tipos: medidas de capital e medidas que atuam diretamente sobre as condições de concessão de crédito (BBMs ― borrower-based measures).

As medidas de capital aumentam de forma imediata e direta a resiliência das instituições. Estas medidas podem ser aplicadas à totalidade ou apenas a um subconjunto das posições ponderadas pelo risco das instituições, elevando os requisitos de capital, o que aumenta a resiliência do sistema financeiro e reduz a probabilidade de crises financeiras (Birn et al., 2020). Tal permite absorver choques adversos na economia, preservando-se o fluxo adequado de crédito e evitando-se, assim, que, em períodos de materialização de risco sistémico, a desalavancagem associada à redução do fluxo de crédito na economia seja excessiva.

Estas medidas podem ter uma natureza cíclica ou estrutural, podendo ser reduzidas parcial ou totalmente quando a fonte de risco a que se destinam se materializa ou deixa de ser considerada sistémica. Um exemplo de instrumento de capital de natureza cíclica é a reserva contracíclica de fundos próprios (CCyB), enquanto instrumentos como a reserva de conservação de capital e as reservas que se aplicam a outras instituições com importância sistémica (O-SII) têm uma natureza mais estrutural. A reserva para risco sistémico (SyRB) é utilizada para prevenir e/ou reduzir o risco sistémico não abrangido por outra medida de capital e pode ter uma natureza estrutural ou cíclica (Quadro 1).

  1. Medidas de Capital

Medida de Capital

Objetivo

% do Montante total das posições de risco

Natureza

Reserva de Conservação [CCoB]

Manutenção do fluxo de financiamento à economia em períodos de stress financeiro.

2,5%

Estrutural

Reserva de O-SII

Mitigação da acumulação de risco sistémico associado a incentivos desajustados e a risco moral.

0% ― 3%

Estrutural

Reserva Contracíclica [CCyB]

Mitigação do risco sistémico cíclico devido a um crescimento excessivo do crédito.

0% ― 2,5%

Cíclica

Reserva para Risco Sistémico (Setorial) [(s)SyRB]

Mitigação de riscos sistémicos não abrangidos por outros instrumentos macroprudenciais. Aplica-se a todas ou a um subconjunto de posições em risco ou instituições.

Igual ou superior a 0%

Estrutural ou Cíclica

Fonte: Banco de Portugal.

Já no caso das medidas baseadas nas condições de crédito (BBMs) o principal objetivo é promover a adoção pelo sistema bancário de critérios de concessão de crédito prudentes, melhorando o perfil dos mutuários e, assim, reduzindo a probabilidade de incumprimento da carteira das instituições. Estas medidas estabelecem limites máximos ao montante de crédito que os mutuários conseguem obter em função do seu perfil de risco, nomeadamente em relação ao valor do imóvel ou ao valor do seu rendimento, e incidem sobre novas operações, pelo que o impacto na resiliência do sistema financeiro é gradual. Reduzem, assim, a magnitude de potenciais perdas para as instituições resultantes de choques no rendimento dos mutuários e/ou no valor dos colaterais. Por esta via incrementa-se a capacidade de absorção de choques pelo sistema financeiro (Gross e Poblacion, 2017; Neugebauer et al., 2021). Na generalidade dos países em que foram implementadas, têm uma natureza estrutural, pelo que não se espera que se alterem ao longo do ciclo financeiro. Consequentemente, o desenho dos instrumentos inclui, frequentemente, alguma flexibilidade, nomeadamente através da definição de cláusulas de isenção ou de ajustes na calibração de alguns parâmetros.

O desenho e a calibração de medidas de política macroprudencial devem maximizar os benefícios para a estabilidade financeira, minimizando os custos para a atividade económica. A evidência empírica indica que os custos da política macroprudencial, decorrentes da redução/desaceleração da atividade económica, são reduzidos e manifestam-se sobretudo no curto prazo (Araújo et al., 2020; Birn et al., 2020; Richter et al., 2019). Já os benefícios relativos ao aumento da resiliência do sistema financeiro, são positivos e manifestam-se no médio prazo (Araújo et al., 2020; Mendicino et al., 2020).

A avaliação de certos fatores pelas autoridades macroprudenciais permite-lhes reduzir os custos da política no curto prazo. O montante de reservas de gestão de cada instituição e a sua predisposição para utilizar estas reservas em momentos de materialização de risco sistémico são exemplos. Se uma instituição não dispuser de reservas de gestão suficientes poderá existir uma redução ou recomposição da carteira de crédito ou mesmo uma contração na concessão de novo crédito, com impacto negativo sobre a atividade económica no curto prazo.

Além disso, a adequação do período concedido pela autoridade macroprudencial para a implementação da medida é determinante para reduzir os custos de curto prazo e aumentar os benefícios líquidos. Mendicino et al. (2020) e Buratta et al. (2023) consideram que períodos de transição mais longos permitem a criação de resiliência sem que daí advenham custos significativos, preservando fluxos de crédito estáveis.

A fase do ciclo financeiro influencia a seleção de instrumentos e o momento da sua ativação e libertação. Na fase ascendente do ciclo financeiro — quando se verifica a acumulação de fontes de risco cíclico e de vulnerabilidades no sistema financeiro — a política macroprudencial deve implementar medidas de capital de forma a aumentar a resiliência do sistema financeiro face a perdas não esperadas resultantes da materialização de riscos e mitigar o acumular de desequilíbrios financeiros. O ritmo de constituição das medidas de capital depende da capacidade de geração interna de capital por parte das instituições de crédito, a qual não pode ser dissociada do nível de taxas de juro e, assim, da política monetária, especialmente em países cujos sistemas bancários apresentam carteiras de crédito com predominância de taxas de juro variáveis.

Na fase descendente do ciclo financeiro — quando ocorre a materialização ou a redução das fontes de risco sistémico — a política macroprudencial deve libertar, total ou parcialmente, as medidas de capital de natureza cíclica. Nestas circunstâncias, é importante considerar o momento e a dimensão dessa libertação. Uma libertação prematura das reservas de capital pode reduzir o nível de resiliência necessário para a absorção de choques inesperados no futuro, enquanto uma libertação tardia, numa situação aguda de materialização de riscos, poderá limitar a capacidade de o sistema bancário absorver perdas e manter, simultaneamente, os níveis de financiamento da economia. De uma forma geral, quando os bancos estão mais capitalizados, os choques não antecipados são menos amplificados ou mesmo absorvidos pelo sistema financeiro, sendo menor o seu impacto na concessão de crédito à economia (Clerc et al., 2015; Mendicino et al., 2020; Faria e Castro, 2021).

Por último, no caso das medidas baseadas nas condições de concessão de crédito, os custos para a atividade económica dependem ainda da restritividade implementada face às práticas adotadas pelo mercado. Quanto maior for a proporção de mutuários cuja decisão de contrair um crédito é constrangida pela medida maiores poderão ser os custos no curto prazo.

O período prolongado de baixas taxas de juro entre 2013 e 2021, seguido da recente fase de aumento pronunciado das taxas de juro para fazer face à inflação, coloca desafios importantes para a condução da política macroprudencial. Neste contexto, é essencial compreender a atuação da política macroprudencial ao longo das diferentes fases do ciclo financeiro, tendo presente a sua interação com outras políticas, como a política monetária (Banco de Portugal, 2015).

2 Interação entre Política Monetária e Política Macroprudencial

Enquanto a política monetária tem como objetivo principal garantir a estabilidade de preços, a política macroprudencial tem como objetivos aumentar a resiliência e mitigar a acumulação de riscos e vulnerabilidades no sistema financeiro e, nesse sentido, a manutenção da estabilidade financeira (Fahr e Fell, 2017).

Ao conter a acumulação excessiva de fontes de risco sistémico cíclico, associada a períodos de crescimento excessivo do crédito e/ou dos preços dos ativos financeiros, os instrumentos macroprudenciais de natureza cíclica complementam a política monetária. A estabilidade financeira é considerada uma pré-condição para a estabilidade de preços, conforme reconhecido na revisão da estratégia de política monetária do Banco Central Europeu de 2021 (European Central Bank, 2021). Ao mesmo tempo, a política monetária complementa a política macroprudencial, já que a estabilidade de preços contribui igualmente para a estabilidade financeira ao ancorar as expetativas de inflação, eliminar as distorções inflacionistas nos mercados financeiros e atenuar a prociclicidade da economia. Assim, ambas as políticas interagem na persecução dos respetivos objetivos, reforçando-se mutuamente.

Esta complementaridade verifica-se, sobretudo, quando os ciclos económico e financeiro estão sincronizados, o que permite que ambas as políticas atuem no mesmo sentido. Numa fase expansionista do ciclo económico caracterizada por uma expansão da atividade económica e uma inflação acima do target é expectável que a política monetária atue de modo restritivo. Coincidindo esta fase de ciclo económico com uma fase do ciclo financeiro em que os riscos e as vulnerabilidades estão a acumular, a política macroprudencial também deverá atuar na mesma direção. O aumento da taxa de juro de referência e a aplicação de requisitos de capital mais elevados surtem efeito na economia via crédito concedido, reforçando-se no seu impacto sobre os custos suportados.

Contudo, as duas políticas podem originar spillovers negativos no curto prazo (Laeven et al., 2022; Van der Ghote, 2021). Ao partilharem os mecanismos de transmissão, ambas as políticas têm impacto na concessão de crédito, influenciando a amplitude do ciclo financeiro, a rendibilidade das instituições e a atividade económica. A eficácia de cada política é, assim, condicionada pela direção da outra. No caso de a economia se encontrar numa fase inicial de recuperação da atividade económica, o impacto de uma política monetária acomodatícia pode ser contrariado pela adoção de medidas macroprudenciais demasiado restritivas com efeitos procíclicos traduzidos num abrandamento excessivo da concessão de crédito. Por seu turno, contextos de taxas de juro prolongadamente baixas podem fomentar dinâmicas mais arriscadas de concessão de crédito e o aumento de preços de outros ativos (por exemplo, imobiliários), levando à acumulação de riscos para a estabilidade financeira e, consequentemente, à necessidade de adotar medidas macroprudenciais mais restritivas.

Sobre esta interação, a evidência empírica demonstra que períodos de aumento rápido da restritividade da política monetária após um período prolongado de baixas taxas de juro tendem a aumentar a probabilidade de materialização de risco sistémico cíclico, com potencial impacto negativo sobre a atividade económica (Boissay et al., 2023). Tal pode condicionar a prossecução do objetivo de manutenção da estabilidade de preços por parte da política monetária (em particular em sistemas com um mandato dual), uma vez que pode levar a que a política monetária tenha eventualmente de reagir e adotar medidas extraordinárias de concessão de liquidez, ou vir a reduzir o nível de taxas de juro. Constata-se que uma atuação preventiva da política macroprudencial pode aumentar a resiliência do sistema financeiro, tornando-o menos vulnerável a choques não antecipados e permitindo que a política monetária tenha mais capacidade de se focar no seu principal objetivo.

Para além da fase específica dos ciclos financeiro e económico, do grau de sincronização dos mesmos e da posição de capital do sistema bancário, a interação entre as políticas macroprudencial e monetária depende ainda das características do sistema financeiro, nomeadamente do peso dos empréstimos a taxa fixa ou variável e da relevância do setor financeiro não bancário, uma vez que estes condicionam os desfasamentos dos efeitos na economia. Por fim, a completude do enquadramento institucional também é importante para garantir a eficácia da política macroprudencial.

3 Política Macroprudencial numa fase de acumulação de vulnerabilidades e riscos do ciclo financeiro

Em 2013, foram atribuídas ao Banco de Portugal funções de definição e condução da política macroprudencial. A designação da autoridade macroprudencial nacional ocorreu num contexto em que a economia portuguesa se encontrava significativamente condicionada (i) pelo processo de correção dos desequilíbrios macroeconómicos acumulados nas crises financeira de 2008 e da dívida soberana da área do euro, (ii) pela elevada incerteza que lhes estava associada e (iii) pela fragmentação nos mercados financeiros. Ao mesmo tempo, subsistiam vulnerabilidades relacionadas com o endividamento excessivo dos setores privado e público.

O contexto macrofinanceiro era, então, caracterizado por um ambiente de taxas de juro nominais e reais baixas que se intensificou a partir de 2013 e durou até ao final de 2021, tendo suscitado uma reflexão sobre os seus efeitos para a estabilidade financeira. Concluiu-se que o ambiente prolongado de baixas taxas de juro pode ter benefícios para a estabilidade financeira, mas também pode conduzir à acumulação de vulnerabilidades e riscos (Borio e Zhu, 2012; CGFS, 2018).

As baixas taxas de juro afetam as decisões de tomada de risco dos agentes económicos, trazendo benefícios para a economia ao dinamizar o investimento, e, consequentemente, a atividade económica. Contudo, taxas de juro baixas podem originar dinâmicas que levam à acumulação de vulnerabilidades e riscos para a estabilidade financeira, incentivando a procura de classes de ativos com maior rendibilidade (search for yield) e, portanto, com maior risco associado. Neste ambiente, pode existir também a perceção generalizada de que o risco é reduzido, com o relaxamento dos critérios de concessão de crédito e canalização de fundos para mutuários com perfil de risco mais elevado, o que torna o sistema bancário mais vulnerável a choques, reforçando o efeito anterior.

Embora este comportamento de search for yield e de tomada de risco excessivo possa afetar várias classes de ativos, os efeitos no mercado imobiliário são particularmente relevantes. De acordo com alguns estudos (Claessens et al., 2013 e Jordá et al., 2015), as crises financeiras originadas pela sobrevalorização dos preços da habitação, sobretudo quando são alimentadas por uma expansão do crédito, caracterizam-se por períodos de recessão mais longos e com perdas maiores para a economia. A relação procíclica entre o crescimento dos preços da habitação e do crédito, em que a subida dos preços da habitação se reflete no valor do colateral, pode originar um aumento na disponibilidade do crédito. Por esta via, tal pode desencadear um aumento da procura de habitação que, consequentemente, pode originar uma nova subida de preços da habitação. Esta relação procíclica tende a intensificar-se em períodos de baixas taxas de juro e está intimamente ligada à formação de crises financeiras associadas ao mercado imobiliário (Claessens et al., 2008 e Jordá et al., 2015). A política macroprudencial pode ter um papel importante para contrariar esta dinâmica de acumulação de risco sistémico.

Em 2018, tendo em conta o ciclo prolongado de baixas taxas de juro e o potencial de acumulação de riscos e vulnerabilidades para o futuro, o Banco de Portugal introduziu duas medidas macroprudenciais dirigidas ao sistema bancário português.

3.1 BBMs adotadas em Portugal e na Europa

Tendo em conta a relevância do crédito à habitação no sistema bancário português e a predominância de taxas variáveis, o Banco de Portugal adotou, em julho de 2018, a Recomendação sobre novos créditos a consumidores. Esta Recomendação2 introduziu limites aos rácios loan-to-value (LTV) e debt service-to-income (DSTI) e à maturidade, assim como requisitos de pagamentos regulares de capital e juros, com o objetivo de prevenir a tomada de risco excessivo pelo setor financeiro e pelas famílias. A Recomendação foi motivada pela evidência de uma menor restritividade nas condições de crédito por parte do setor bancário português, cuja tendência se esperava que se intensificasse devido ao ambiente prolongado de baixas taxas de juro e concorrência entre instituições.

No desenho e calibração da Recomendação foram tidos em conta, entre outros aspetos, os riscos para a estabilidade financeira decorrentes da conjuntura de baixas taxas de juro. Esta conjuntura poderia constituir um incentivo à assunção de riscos e ao aumento do endividamento, conduzindo ao aparecimento de bolhas especulativas nos preços dos ativos. Em particular, em Portugal a maioria do crédito à habitação era, então, concedido a uma taxa de juro variável, sendo os contratos indexados à taxa Euribor, o que leva a uma transmissão mais célere da política monetária. Tendo em vista esta preocupação, o desenho e a calibração do limite do rácio DSTI consideraram a possibilidade de um ciclo de subida das taxas de referência do Banco Central Europeu (BCE), ao incluir-se no seu cálculo um choque de até 3 pp na taxa de juro, para reduzir o risco de eventuais situações de incumprimento nos novos créditos.

De 2014 a 2019, 21 países também adotaram BBMs, incluindo limites ao rácio LTV, ao rácio DSTI, ao rácio loan/debt-to-income (L/DTI) e às maturidades (Quadro 2). A aplicação de limites ao rácio LTV foi a medida mais adotada pelas autoridades macroprudenciais europeias (19 países, até ao final de 2019). À semelhança do caso português, estas medidas procuraram promover a adoção de critérios de concessão de crédito mais prudentes, limitar o endividamento excessivo e proteger o sistema bancário dos desenvolvimentos exuberantes dos mercados imobiliários. A maioria dos países, incluindo Portugal, optou por combinar diferentes instrumentos.

  1. BBMs aplicadas na Europa

Fonte: CERS l Notas: a maior ou menor restritividade dos limites impostos compara com os limites aplicados inicialmente. Introdução refere-se ao anúncio ou implementação de novos critérios. D(L)TI (Debt (Loan) to income), referem-se ao montante de dívida total (empréstimo) em relação ao total de rendimento.

3.2 Medidas de capital adotadas em Portugal e na Europa

Complementarmente, o Banco de Portugal adotou também em 2018 uma medida de capital. Cumprindo a obrigatoriedade de aplicação definida pela legislação europeia, foi introduzida uma reserva de O-SII. Sendo uma medida de natureza estrutural, esta reserva de capital tem como finalidades compensar o risco sistémico mais elevado que as instituições sistémicas representam para o sistema financeiro português, restringir eventuais incentivos para a assunção de riscos excessivos e permitir aumentar a resiliência do sistema financeiro como um todo. De acordo com a metodologia definida pelo Banco de Portugal foram então identificadas seis instituições com relevância sistémica, às quais foram exigidas reservas de capital. À semelhança do que sucedeu em Portugal, as diversas autoridades macroprudenciais europeias estabeleceram metodologias de identificação de O-SII e de calibração desta reserva.

A adoção desta reserva de O-SII ocorreu, igualmente, na fase do ciclo financeiro caracterizada por baixas taxas de juro com impacto na geração interna de capital e consequente reduzida rendibilidade do sistema bancário. Faziam-se sentir, também, os efeitos da crise financeira de 2008, evidentes no nível elevado de non-performing loans (NPL). O Banco de Portugal optou por adotar um período de implementação gradual ao longo de quatro anos, com início em 2018, para não deter a recuperação do crédito, o processo de redução de NPL e o crescimento económico sustentado, no médio prazo (Quadro 3).

  1. Reserva de O-SII em Portugal | Em percentagem do montante total das posições em risco

Instituição

2018

2019

2020

2021

2022

2023

2024

Banco Comercial Português, S. A.

0,188

0,375

0,563

0,563

0,75

1

1

Caixa Geral de Depósitos, S. A.

0,25

0,5

0,75

0,75

1

1

0,75

Santander Totta, SGPS, S. A.

0,125

0,25

0,375

0,375

0,5

0,5

0,5

LSF Nani Investments S.à.r.l.

-

0,25

0,375

0,375

0,5

0,5

0,5

Novo Banco, S. A.

0,125

-

-

-

-

-

0,25

Banco BPI, S. A.

0,125

0,25

0,375

0,375

0,5

0,5

0,5

Caixa Económica Montepio Geral, Caixa Económica Bancária. S. A.

0,063

0,125

0,188

0,188

0,25

0,25

0,25

Caixa Central – Caixa Central de Crédito Agrícola Mútuo, S. A.

-

-

-

-

-

0,25

0,25

Fonte: Banco de Portugal.

De entre as medidas de capital adotadas em países da União Europeia destaca-se a ativação e reforço da reserva contracíclica (CCyB) por um número crescente de países, entre 2013 e meados de 2019 (Gráfico 1). Esta reserva tem o objetivo de proteger o setor bancário nos períodos em que o risco sistémico cíclico aumenta, devido a um crescimento excessivo do crédito. Quando os riscos se materializam ou diminuem, esta reserva adicional de fundos próprios pode ser libertada pelas autoridades macroprudenciais. As medidas que foram implementadas e, em alguns casos, reforçadas ao longo deste período tiveram por objetivos principais a mitigação da acumulação de risco sistémico cíclico, em particular o associado a crédito excessivo colateralizado por imóveis, num contexto em que se observavam sinais de sobrevalorização dos preços do imobiliário residencial em vários países europeus. As percentagens de CCyB introduzidas variaram entre 0,25% e 2,5% do montante total das posições em risco. Durante a crise provocada pela pandemia de COVID-19, várias autoridades macroprudenciais europeias libertaram esta reserva, parcial ou totalmente, de forma a apoiar o fluxo de crédito à economia. No caso de Portugal, a reserva CCyB tem tido nível 0%, dada a avaliação trimestral de risco seguindo a metodologia do Banco de Portugal3 e tendo em conta as outras medidas macroprudenciais já adotadas.

  1. CCyB aplicados na Europa (desde dezembro de 2013) | Em percentagem

Fonte: CERS l Nota: o valor no eixo das ordenadas corresponde à percentagem cumulativa de taxa de CCyB aplicada pelas jurisdições da Área Económica Europeia que ativaram ou mantiveram este instrumento em cada trimestre. A secção 3 compreende o período de dezembro de 2013 até janeiro de 2020 e a secção 4 compreende o período de janeiro de 2020 até dezembro de 2023.

4 Política Macroprudencial numa fase de inversão do ciclo financeiro

Após uma longa fase ascendente do ciclo financeiro, caracterizada por um acumular de vulnerabilidades e riscos, que as autoridades macroprudenciais procuraram mitigar, nos últimos dois anos a economia internacional passou a estar sob o efeito de choques exógenos de abrangência internacional. A invasão da Ucrânia pela Federação Russa afetou particularmente os mercados de energia e de matérias-primas, bem como as cadeias de abastecimento, o que resultou no aumento da incerteza para os agentes económicos, no condicionamento da recuperação da atividade económica e no agravamento das pressões inflacionistas já decorrentes da pandemia. Neste contexto, o BCE subiu as taxas de juro oficiais a um ritmo sem paralelo na história recente da área do euro.

Em 2023, as preocupações com a estabilidade financeira passaram a centrar-se nas implicações de taxas de juro mais elevadas e nos riscos de abrandamento do crescimento económico. As condições financeiras mais restritivas conduziram a um abrandamento contínuo do ciclo financeiro, apesar de não se ter observado uma materialização das fontes de risco sistémico.

A rendibilidade e as reservas de gestão de capital dos bancos portugueses permaneceram confortáveis, embora com heterogeneidade entre instituições. Em termos prospetivos, os custos mais elevados do serviço da dívida e a deterioração do contexto macroeconómico poderão pôr em causa a capacidade de serviço da dívida dos sectores não financeiros e afetar gradualmente a qualidade dos ativos dos bancos. A este contexto, acrescem volumes de crédito inferiores e custos de financiamento crescentes, o que pode prenunciar um impacto negativo futuro na rendibilidade e na resiliência dos bancos.

4.1 BBMs adotadas em Portugal e na Europa

No período pós-2020, o Banco de Portugal reviu a calibração dos seus instrumentos de política macroprudencial. Quanto à Recomendação, em janeiro de 2022, o Banco de Portugal recomendou novos limites à maturidade máxima das novas operações de crédito à habitação em função da idade dos mutuários. Em 2023, reconhecendo que o choque de taxa de juro no cálculo do rácio DSTI estava a ser demasiado restritivo na avaliação de solvabilidade dos mutuários, reduziu-o para metade. O choque de 1,5 pp agora considerado para as novas operações de crédito a mais de dez anos com taxa de juro variável ou mista equivale a considerar que as taxas Euribor poderão vir a atingir níveis semelhantes aos máximos históricos observados no contexto da área do euro. Salienta-se, ainda, que o desenho da Recomendação sempre contemplou cláusulas de isenção ao limite aplicado ao rácio DSTI para evitar excesso de restritividade da Recomendação no acesso a crédito por parte das famílias em períodos de aumento das taxas de juro.

No contexto de aumento rápido e significativo das taxas de juro, 15 países mantiveram em vigor medidas BBMs para evitar que os bancos assumissem riscos excessivos na concessão de crédito às famílias (Quadro 2). Para além de Portugal, outras autoridades macroprudenciais europeias atenuaram alguns dos limites na concessão de crédito, em particular no que se refere ao rácio DSTI. Na Chéquia o limite superior do rácio DSTI foi abolido, mantendo inalterados, em contrapartida, os limites aos rácios LTV e DTI, enquanto na Noruega o choque da taxa de juro utilizado para o cálculo do rácio DSTI foi reduzido, já que os critérios de concessão de crédito foram avaliados pela autoridade macroprudencial nacional como mais restritivos do que em 2017, data de implementação da medida.

4.2 Medidas de Capital adotadas em Portugal e na Europa

Em novembro de 2023, o Banco de Portugal introduziu uma reserva SyRB setorial de 4% sobre o montante das posições ponderadas pelo risco da carteira de particulares garantidas por imóveis destinados a habitação e localizados em Portugal, aplicável aos bancos que utilizam o método de notações internas (IRB — Internal Ratings Based). Esta medida entrará em vigor a 1 de outubro de 2024 e tem uma natureza preventiva com o objetivo de aumentar a resiliência das instituições face à eventual materialização futura de risco sistémico no mercado imobiliário residencial em Portugal. A medida reforça, assim, a resiliência face a uma potencial inversão do ciclo económico e/ou a uma correção significativa inesperada dos preços do imobiliário residencial.

Reservas de fundos próprios como o SyRB podem ser libertadas num momento de materialização de risco ou de redução do risco sistémico. Os elevados níveis atual e prospetivo das reservas de gestão dos bancos mitigam potenciais efeitos negativos que a introdução de uma nova reserva poderia ter sobre a capacidade de oferta de crédito. Não se espera, também, que o SyRB setorial prejudique o cumprimento dos demais requisitos e orientações.

Adicionalmente, esta reserva setorial constitui mais um fator de robustecimento dos bancos e complementa a Recomendação, que foi aliviada em 2023. Os dois instrumentos contribuem, através de canais de transmissão e horizontes temporais distintos, para (i) promover a adoção de critérios de concessão de crédito prudentes ao longo do ciclo financeiro, (ii) melhorar o perfil de risco dos mutuários ao aumentar a sua resiliência face a potenciais choques no rendimento, taxas de juro e preços dos imóveis e (iii) reforçar a resiliência do sistema bancário, ao permitir a absorção de perdas não antecipadas sem pôr em causa a sua função de intermediação financeira.

Em 30 de abril de 2024, 16 países europeus tinham reservas de SyRB em vigor, 9 das quais de âmbito geral (Gráfico 2) e 7 das quais de âmbito setorial (Gráfico 3).

  1. Taxas de SyRB na Europa  
    | Em percentagem

  1. Taxas de sSyRB na Europa  
    | Em percentagem

Fonte: CERS. | Nota: A Áustria tem uma taxa mínima de SyRB de 0,5% e a Roménia tem uma taxa mínima de SyRB de 1%.

Fontes: CERS e Banco de Portugal. | Nota: A barra correspondente a Portugal apresenta-se com uma cor diferente tendo em conta que a reserva sSyRB só será aplicada a 1 de outubro de 2024.

A implementação anual da reserva de O-SII manteve-se, com as naturais atualizações de valores de acordo com a aferição da importância sistémica das instituições portuguesas, tendo o Banco de Portugal identificado em 2023 sete grupos bancários com importância sistémica e aplicado a reserva a um destes grupos em dois níveis de consolidação (Quadro 3).

No último ano, as autoridades macroprudenciais nacionais europeias continuaram a reforçar a tendência restritiva da política macroprudencial, a fim de reforçar a resiliência dos bancos, o que foi facilitado pela manutenção de valores médios elevados de rendibilidade e de reservas de gestão dos bancos. Várias autoridades ativaram a reserva contracíclica (CCyB) para fazer face às vulnerabilidades associadas à acumulação do risco de crédito excessivo ou para criar mais espaço macroprudencial sob a forma de reservas de fundos próprios libertáveis. No caso de Portugal manteve-se esta reserva em nível 0%, de acordo com a aplicação da metodologia. Em 2023, oito países introduziram ou reforçaram esta reserva, elevando para 14 o número total de países que implementaram ou anunciaram um CCyB positivo até ao final do ano (Gráfico 1).

5 Conclusão

A condução da política macroprudencial em Portugal e na União Europeia durante uma década, ao longo de fases distintas do ciclo financeiro, permite-nos retirar lições para a conceção de uma estratégia de política macroprudencial.

A primeira lição é que as decisões de política macroprudencial devem basear-se numa análise de custos e benefícios intertemporais. A evidência empírica sugere que os custos em termos de abrandamento da atividade económica são reduzidos e observados, sobretudo, no curto prazo. Pelo contrário, os benefícios da implementação de uma medida macroprudencial, materializados no acréscimo de resiliência do sistema financeiro, manifestam-se no médio prazo. Os custos serão mais ou menos acentuados dependendo do nível de reservas de gestão do sistema financeiro e da capacidade de geração interna de capital por parte das instituições ou da proporção de mutuários cuja decisão de contrair um crédito é constrangida. A redução destes custos passa pela definição de um período de transição para a implementação gradual da medida.

A segunda lição é que as políticas monetária e macroprudencial são complementares, embora, no curto prazo, possam gerar spillovers negativos decorrentes da partilha dos mecanismos de transmissão, o que pode afetar a amplitude dos ciclos financeiro e económico e o nível de riscos e vulnerabilidades no sistema financeiro. Na prossecução dos seus objetivos, as duas políticas devem, então, procurar identificar potenciais trade-offs e encontrar formas de os minimizar, sem pôr em causa o objetivo primário da política monetária.

A terceira lição prende-se com a forma de atuação da política macroprudencial ao longo das diferentes fases do ciclo financeiro, consoante os instrumentos e as suas combinações. De forma geral, na fase ascendente do ciclo financeiro as autoridades macroprudenciais devem implementar medidas de capital de forma a aumentar a resiliência do sistema financeiro a perdas resultantes da materialização de riscos e/ou mitigar o acumular daqueles desequilíbrios financeiros. Por sua vez, na fase descendente do ciclo financeiro, a política macroprudencial deve reduzir (total ou parcialmente) as medidas de capital de natureza cíclica. Contudo, esta forma de ação pode ter de ser ajustada, quando presentes determinados fatores. Por exemplo, no caso de sistemas bancários em que o crédito é concedido maioritariamente a taxa variável, períodos de baixas taxas de juro condicionam o nível de rendibilidade do sistema financeiro, sendo benéfico que a autoridade macroprudencial opte pela definição de períodos mais longos de constituição de medidas de capital, por comparação com períodos de taxas de juro elevadas. Por seu turno, a implementação ou o reforço das reservas de capital deverá ocorrer em períodos em que se observe a persistência de fontes de risco sistémico e de vulnerabilidades no sistema financeiro que ainda não foram mitigadas de forma eficaz pelos instrumentos macroprudenciais existentes, ou em momentos de inversão pronunciada do ciclo financeiro e de aumento da probabilidade de materialização de risco sistémico.

No que respeita às BBMs, tendo uma natureza estrutural, não se espera que a sua estrutura seja dependente da posição do ciclo financeiro, ao contrário do que genericamente acontece com as medidas de capital. As medidas que atuam sobre as condições de crédito devem ser desenhadas de forma a garantir a aplicação de critérios prudentes em todas as fases do ciclo financeiro. Assim, as características específicas do desenho ou a incorporação de cláusulas de isenção deste tipo de medidas devem ser definidas de forma a permitirem alguma flexibilidade, para que, por exemplo, em períodos de subida célere das taxas de juro, especialmente em países com predominância de crédito a taxa variável, não se tornem demasiado restritivas no acesso a crédito por parte das famílias. Esses elementos de flexibilidade são também uma ferramenta de política macroprudencial.

Referências

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O papel das caraterísticas das empresas na determinação das taxas de juro dos empréstimos bancários1

A partir de julho de 2022, o Banco Central Europeu (BCE) respondeu ao aumento rápido e significativo da inflação aumentando as taxas diretoras da forma mais célere que vimos desde a criação da área do euro. Observou-se um aumento consistente das taxas Euribor a 3 meses e a 1 ano (taxas de juro no mercado de crédito interbancário), tal como ilustrado no Gráfico 1.

O mercado de crédito às empresas é um dos principais canais da política monetária no Eurosistema, o que se deve à predominância de empréstimos a taxa variável e ao refinanciamento dos empréstimos a taxa fixa. Os bancos repercutiram o aumento dos seus custos de financiamento nas taxas de juro dos empréstimos às empresas. Entre junho de 2022 e julho de 2023, a taxa de juro média aplicada aos novos empréstimos às empresas em Portugal subiu de 3,0% para 6,6%, com a Euribor a 1 ano a aumentar de 0,85% para 4,14%. Apesar desta subida acentuada, as atuais taxas de juro dos novos empréstimos às empresas continuam a ser inferiores às observadas durante a crise da dívida soberana.

  1. Taxas de juro dos novos empréstimos às empresas e Euribor a 1 ano/3 meses  
    | Em percentagem

Fonte: BCE | Notas: A linha vermelha representa a média simples das taxas de juro aplicadas aos novos empréstimos às empresas portuguesas, enquanto a linha azul mostra a mediana da taxa de juro aplicada a estes empréstimos. A área sombreada a cinzento indica o intervalo entre os percentis 20 e 80 da distribuição das taxas de juro.

 

Ao longo do tempo, observou-se uma dispersão significativa das taxas de juro dos empréstimos em torno da média e da mediana, tal como apresentada pela área sombreada na figura 1 que está delimitada pelos percentis 20 e 80 da distribuição.

A taxa de juro dos empréstimos bancários reflete vários fatores, incluindo as caraterísticas dos mutuários, dos empréstimos e dos bancos, bem como o enquadramento macroeconómico e financeiro. Para avaliar o nível de risco das empresas, os bancos têm de analisar diferentes dimensões, incluindo caraterísticas estruturais, que podem depender da indústria e/ou da dimensão das empresas, e a sua situação financeira. Devem ser oferecidas taxas de juro mais elevadas aos mutuários de maior risco.

Estudos anteriores, como Santos (2013) e Bonfim et al. (2021), analisaram os fatores determinantes subjacentes às taxas de juro dos empréstimos bancários em Portugal. Tendo como referência informação entre junho de 2012 e fevereiro de 2013, Santos (2013) concluiu que os bancos estabelecem as condições de preço com base em características dos mutuários, como o risco da empresa (medido pela probabilidade de incumprimento) ou a dimensão. Às empresas com condições financeiras mais frágeis é exigida uma taxa de juro mais elevada. Bonfim et al. (2021) mostraram a importância das características dos bancos na determinação das taxas de juro dos empréstimos, com um foco especial no nível de capital dos bancos. Para o período de 2012 até 2019, os autores concluíram que os bancos melhor capitalizados são mais conservadores na determinação do preço dos seus empréstimos.

O presente estudo enquadra-se nesta linha de investigação, tendo por base informação adicional e mais granular relativa às empresas. Em particular, centra-se em três aspetos financeiros fundamentais das empresas: endividamento, liquidez e rendibilidade. Estes indicadores de solidez financeira são importantes para determinar a dispersão das taxas de juro observada na figura 1. Em períodos de alterações significativas no custo do endividamento, como por exemplo devido a uma maior restritividade da política monetária, o impacto destas alterações pode ser mais ou menos intenso em função da situação financeira das empresas. Estas alterações nos custos de financiamento podem também ampliar os efeitos na economia real tal como apresentado em Durante et al. (2022). Estes autores demonstram que o investimento de empresas altamente endividadas é mais reativo aos choques da política monetária. Do ponto de vista da estabilidade financeira, a forma como os bancos avaliam as diferentes caraterísticas financeiras das empresas é relevante para a sua própria estabilidade. Os bancos devem conseguir identificar as vulnerabilidades dos mutuários e fixar a taxa de juro em conformidade.

Além disso, o presente estudo investiga se a relevância das caraterísticas financeiras das empresas para a determinação da taxa de juro é variável no tempo e influenciada pelo enquadramento macroeconómico e financeiro. Este é um aspeto relevante atendendo aos vários eventos importantes que ocorreram na economia portuguesa, tais como o período subsequente à crise da dívida soberana, a pandemia de COVID-19 e o atual ciclo de restritividade da política monetária, e que a amostra em análise, abrangendo um período de tempo significativo, permite analisar.

1 Fontes de dados e estatísticas descritivas

A análise tem por base informação granular dos empréstimos bancários concedidos a sociedades não financeiras (SNF) em Portugal, entre julho de 2012 e dezembro de 2023. Para cada empréstimo, foi utilizada informação sobre o montante do empréstimo contraído, a taxa de juro, a maturidade, o estado de renegociação e a existência de garantias associadas, numa base mensal. Embora a maioria das operações consideradas respeite a novos contratos, algumas resultam de renegociações, sendo estas também consideradas na análise. Foi introduzida uma variável binária para identificar se, a partir de abril de 2020, um empréstimo teve uma garantia do Estado. Esse período inclui o da crise pandémica, durante o qual o Estado português implementou medidas específicas de apoio às empresas.

A análise teve por base os contratos associados aos sete maiores bancos em Portugal, que correspondem a 79% do total de novos empréstimos em 2023 e 86%, em média, se considerado todo o período da amostra. Dada a importância destes bancos em Portugal, a análise reflete os principais desenvolvimentos na fixação do preço dos empréstimos. Para ter em conta a importância das características dos bancos na fixação dos preços dos empréstimos, são utilizados dados ao nível do banco, com frequência trimestral. Ao nível dos bancos, as variáveis consideradas na análise foram o rácio de capital, o custo de financiamento2, o rácio de transformação e o total do ativo.

Esta análise inclui ainda informação ao nível da empresa disponível na central de balanços com frequência anual. Em relação aos indicadores financeiros, foram utilizadas as seguintes métricas: (i) uma medida de alavancagem representativa do endividamento das empresas, calculado como o rácio entre a dívida financeira e o total do ativo; (ii) uma medida de liquidez que corresponde ao rácio entre caixa mais depósitos e o total do ativo (em seguida, denominada por “caixa em relação ao ativo” por questões de simplicidade); e (iii) uma medida de rendibilidade, calculado como o rácio entre o EBITDA (resultado antes de depreciações e amortizações, juros e impostos) e o total do ativo. Estas variáveis correspondem a três dimensões fundamentais da avaliação financeira de uma empresa, relacionadas, de um modo geral, com a autonomia financeira, a capacidade para absorver choques de liquidez e a rendibilidade. Além disso, considerou-se a dimensão da empresa (representada pelo logaritmo dos ativos totais), que é habitualmente utilizada como proxy da assimetria de informação.

Tendo por base o período da amostra, em média, as microempresas correspondem a 26% e as pequenas empresas a 31% do montante total de novos créditos, o que confirma o papel dominante das micro e pequenas empresas na economia portuguesa. Neste período, o crédito foi maioritariamente direcionado para os setores da indústria transformadora (32%), do comércio (26%), da construção (9%) e do setor imobiliário (5%). A empresa média apresenta um rácio de alavancagem de 34%, um rácio de disponibilidades de caixa de 8,8% e um rácio entre o EBITDA e o ativo de 6,8%. No entanto, a heterogeneidade das caraterísticas dos mutuários considerados na análise é significativa.

O quadro 1 apresenta uma caracterização da amostra, tendo como referência as estatísticas descritivas de cada uma das variáveis utilizadas nesta análise

  1. Estatísticas descritivas

Variáveis

Média

DP

Mediana

Perc5

Perc95

Obs.

Empréstimo (loan)

 

 

 

 

 

 

Taxa de juro (%)

5,07

3,34

4,50

1,16

11,76

3 330 993

Montante (log, euros)

9,48

1,67

9,51

6,75

12,29

3 330 993

Maturidade (log, dias)

5,05

1,23

4,62

3,61

7,69

3 330 993

Garantia (binária)

0,44

0,50

0,00

0,00

1,00

3 330 993

Renegociação (binária)

0,03

0,18

0,00

0,00

0,00

3 330 993

Garantia do Estado (binária)

0,02

0,12

0,00

0,00

0,00

3 330 993

Mutuário (borrower)

 

 

 

 

 

 

Grandes empresas (binária)

0,07

0,25

0,00

0,00

1,00

3 330 993

Médias empresas (binária)

0,22

0,41

0,00

0,00

1,00

3 330 993

Pequenas empresas (binária)

0,37

0,48

0,00

0,00

1,00

3 330 993

Total do ativo das empresas (log, euros)

14,45

2,00

14,43

11,31

17,74

3 330 993

Alavancagem

33,89

26,16

33,22

0,01

68,58

3 330 993

Caixa em relação ao ativo

8,88

13,63

3,67

0,17

36,14

3 330 993

EBITDA em relação ao ativo

6,84

21,54

6,56

-6,84

25,58

3 330 993

N.º de relações bancárias

5,65

3,82

5,00

1,00

13,00

3 282 609

Idade das empresas (anos)

22,71

16,42

19,99

3,05

50,88

3 330 993

Probabilidade de incumprimento (SIAC)

4,21

5,84

2,13

0,16

15,25

3 328 733

Banco (bank)

 

 

 

 

 

 

Rácio de loan-to-deposits (%)

97,69

18,49

97,85

65,95

130,37

3 330 993

Rácio de fundos próprios totais (%)

14,47

3,26

13,97

9,85

20,10

3 330 993

Custo implícito do financiamento bancário (%)

1,22

1,00

0,97

0,08

3,16

3 330 993

Total do ativo dos bancos (log, euros)

24,70

0,53

24,70

23,63

25,33

3 330 993

Fonte: Banco de Portugal.

2 Fatores determinantes das taxas de juro dos novos empréstimos a empresas

A especificação de base utilizada nesta análise decompõe as taxas de juro cobradas às SNF tendo em conta as caraterísticas dos mutuários, dos bancos e dos empréstimos, controlando os efeitos fixos do banco, da indústria e do tempo:

IRi,j,b,t,q,y=β*borrowerj,y1+α*bankb,q1+γ*loani,t+θb+δk+Tt,y+εi,j,b,t{IR}_{i,j,b,t,q,y} = \beta*{borrower}_{j,y - 1} + \alpha*{bank}_{b,q - 1} + \gamma*{loan}_{i,t} + \theta_{b} + \delta_{k} + T_{t,y} + \varepsilon_{i,j,b,t}(1)

em que IRi,j,b,t,q,y{IR}_{i,j,b,t,q,y} corresponde à taxa de juro aplicada a um novo empréstimo ii, para um mutuário jj, dada por um banco bb no mês tt e trimestre qq do ano yyborrowerj,y1{borrower}_{j,y - 1} indica as caraterísticas do mutuário no ano y1y - 1, incluindo a dimensão da empresa e as medidas de alavancagem, liquidez e rendibilidade. São igualmente incluídos efeitos fixos para os setores de atividade (δk\delta_{k} para cada setor kk). bankb,q1{bank}_{b,q - 1} corresponde às caraterísticas do banco que concede o empréstimo no trimestre q1q - 1, incluindo o rácio de fundos próprios totais, o rácio entre os empréstimos e os depósitos, o custo implícito do financiamento dos bancos e a dimensão dos bancos. A especificação base inclui ainda efeitos fixos por banco (θb\theta_{b} para cada banco bb) que captam potenciais diferenças permanentes entre as taxas de juro aplicadas pelos bancos. loani,t{loan}_{i,t} controla as caraterísticas do empréstimo no mês tt, incluindo o montante do empréstimo contraído, a maturidade e três variáveis binárias que permitem identificar se o empréstimo tem garantia associada, se o empréstimo foi renegociado e se o empréstimo beneficia de uma garantia do Estado a partir de abril de 2020. TtyT_{ty}\ é um efeito fixo de mês/ano para captar choques macroeconómicos e financeiros comuns. Todas as variáveis explicativas contínuas são normalizadas utilizando a sua média e desvio-padrão.

As caraterísticas das empresas influenciam as taxas de juro dos empréstimos, tendo em conta os resultados apresentados na coluna 1 do quadro 2. As empresas com maior alavancagem deparam-se com uma maior restritividade das condições financeiras, sendo que o aumento em um desvio-padrão da medida de alavancagem (i.e., uma subida de 26 pontos percentuais (pp) face a uma média de 34%) resulta num aumento de 6,4 pontos base das taxas de juro. Em contrapartida, a liquidez e a rendibilidade das empresas contribuem para a redução dos custos dos empréstimos. O aumento em um desvio-padrão do rácio de disponibilidades de caixa, correspondendo a 13,6 pp face a 8,8% da média, conduz a uma diminuição de 17 pontos base nas taxas de juro aplicadas. De modo similar, o aumento em um desvio-padrão do rácio entre EBITDA e o ativo, correspondendo a 21,5 pp face a uma média de 6,8%, resulta numa diminuição de 3,7 pontos base das taxas de juro aplicadas. Além disso, a dimensão da empresa apresenta uma relação negativa com o nível da taxa de juro, com as empresas maiores a obterem empréstimos a taxas de juro mais baixas. As conclusões relativas às caraterísticas dos empréstimos e dos bancos estão em consonância com estudos anteriores de Santos (2013) e Bonfim et al. (2021).

A literatura baseia-se frequentemente em medidas representativas das condições financeiras das empresas, como seja a probabilidade de incumprimento, em vez de utilizar diretamente variáveis de natureza contabilística e financeira. Os resultados apresentados na coluna 2 do quadro 2 ilustram a forma como as taxas de juro respondem a alterações da probabilidade de incumprimento (PD, do inglês probability of default) disponível no SIAC (Sistema Interno de Avaliação de Crédito). Esta probabilidade de incumprimento é estimada utilizando um modelo interno de risco de crédito desenvolvido pelo Banco de Portugal e apresentado em Antunes et al. (2016). O aumento em um desvio-padrão da probabilidade de incumprimento leva a um aumento de 38,5 pontos base das taxas de juro, em linha com expetativas a priori quanto à relação entre o perfil de risco do mutuário e as taxas de juro.

Nesta análise, são estimadas especificações alternativas que funcionam como testes de robustez. No quadro 2, apresentam-se os resultados para diferentes especificações, incluindo efeitos fixos de banco*tempo (coluna 3) e efeitos fixos para o setor de atividade*tempo (coluna 4). Os efeitos fixos de banco*tempo permitem controlar a influência das variáveis bancárias nas taxas de juro dos empréstimos ao longo do tempo sem recorrer a controlos bancários específicos. Incluem-se efeitos fixos de indústria*tempo para verificar se os resultados do presente estudo não são impulsionados por tendências a nível da indústria.

As variáveis de controlo ao nível da empresa também foram expandidas para incluir o número de relações bancárias e a idade das empresas (coluna 5). Em estudos anteriores, foi demonstrado que o número de relações bancárias reduz o custo dos empréstimos (Bonfim et al., 2018). Além disso, a idade das empresas foi identificada como um fator determinante do financiamento das empresas, com as empresas mais jovens a serem mais suscetíveis a fricções financeiras (Cloyne et al., 2023). De acordo com os resultados desta análise, nem o número de relações bancárias nem a idade das empresas têm um impacto significativo no preço dos empréstimos.

Como teste final da robustez, a regressão de base é conduzida utilizando como variável dependente um diferencial (spread) entre a taxa de juro de cada empréstimo e o custo implícito de financiamento do respetivo banco (Quadro 2, coluna 6). Relativamente a todos os testes de robustez, os coeficientes para as variáveis a nível das empresas permanecem inalterados.

  1. Resultados da regressão

 

Base de referência (1)

PD (2)

Efeitos fixos banco*tempo (3)

Efeitos fixos setor*tempo (4)

Variáveis adicionais (5)

Spread (6)

Mutuário

 
 
 
 
 
 

Total do ativo (log)

-0,853***

-0,772***

-0,846***

-0,854***

-0,873***

-0,852***

 

(0,025)

(0,022)

(0,025)

(0,025)

(0,034)

(0,025)

Alavancagem

0,064***

 

0,066***

0,064***

0,061***

0,064***

 

(0,012)

 

(0,012)

(0,012)

(0,012)

(0,012)

Caixa em relação ao ativo

-0,169***

 

-0,165***

-0,167***

-0,174***

-0,168***

 

(0,013)

 

(0,013)

(0,013)

(0,013)

(0,013)

EBITDA em relação ao ativo

-0,037***

 

-0,037***

-0,034***

-0,042***

-0,037***

 

(0,007)

 

(0,007)

(0,007)

(0,007)

(0,007)

Prob. de incumprimento

 

0,385***

 
 
 
 
 
 

(0,016)

 
 
 
 

N.º relações bancárias

 
 
 
 

−0,015

 
 
 
 
 
 

(0,024)

 

Idade

 
 
 
 

0,009

 

 

 

 

 

 

(0,020)

 

Empréstimo

 
 
 

 

 
 

Montante (log)

-0,395***

-0,375***

-0,389***

-0,397***

-0,393***

-0,395***

 

(0,020)

(0,019)

(0,021)

(0,020)

(0,020)

(0,020)

Maturidade (log)

-0,759***

-0,759***

-0,760***

-0,759***

-0,769***

-0,758***

 

(0,013)

(0,013)

(0,013)

(0,013)

(0,013)

(0,013)

Garantia

0,403***

0,402***

0,439***

0,402***

0,394***

0,401***

 

(0,035)

(0,033)

(0,035)

(0,034)

(0,035)

(0,035)

Renegociação

0,306***

0,285***

0,239***

0,306***

0,313***

0,312***

 

(0,044)

(0,038)

(0,043)

(0,044)

(0,044)

(0,044)

Garantia do Estado

-0,898***

-0,906***

-0,863***

-0,850***

-0,900***

-0,904***

 

(0,040)

(0,039)

(0,039)

(0,038)

(0,041)

(0,040)

Banco

 
 
 

 

 
 

Rácio de loan-to-deposits

0,253***

0,238***

 

0,250***

0,251***

0,211***

 

(0,017)

(0,016)

 

(0,016)

(0,017)

(0,018)

Rácio de fundos próprios totais

0,224***

0,225***

 

0,224***

0,219***

0,218***

 

(0,016)

(0,015)

 

(0,013)

(0,016)

(0,016)

Custo implícito do financ. bancário

0,662***

0,614***

 

0,643***

0,672***

 
 

(0,045)

(0,045)

 

(0,045)

(0,045)

 

Total do ativo (log)

-0,796***

-0,795***

 

-0,796***

-0,823***

-0,956***

 

(0,039)

(0,038)

 

(0,040)

(0,040)

(0,036)

Num. obs.

3 330 993

3 328 733

3 330 993

3 330 993

3 282 609

3 330 993

R2

0,508

0,517

0,523

0,510

0,509

0,388

Efeitos fixos da indústria

Sim

Sim

Sim

 

Sim

Sim

Efeitos fixos do banco

Sim

Sim

 

Sim

Sim

Sim

Efeitos fixos do tempo

Sim

Sim

 
 

Sim

Sim

Efeitos fixos de banco*tempo

 
 

Sim

 
 
 

Efeitos fixos de indústria*tempo

 
 
 

Sim

 
 

Notas: + p < 0,1, * p < 0,05, ** p < 0,01, *** p < 0,001. Erros-padrão agrupados a nível das empresas. As variáveis explicativas contínuas são normalizadas. O número de relações bancárias, utilizado para os resultados da coluna 5, é calculado a partir do conjunto de dados da Central de Responsabilidades de Crédito de Portugal.

 

2.1 Decomposição da variação da taxa de juro média dos novos empréstimos a empresas

A presente secção analisa os fatores subjacentes à variação semestral da taxa de juro média ao longo do tempo, examinando a importância relativa de cada fator. A evolução da taxa de juro média entre o tempo tt e o tempo t+ht + h pode ser desagregada na variação média das caraterísticas dos empréstimos, dos mutuários e dos bancos, bem como em choques macroeconómicos e financeiros e variações na composição da amostra3. O impacto de choques macroeconómicos e financeiros comuns na variação média das taxas de juro é capturado pelas variações nos efeitos fixos. Esta componente comum pode representar mudanças na política monetária, flutuações na atividade económica ou alterações globais do risco de crédito associadas ao enquadramento macroeconómico.

 
  1. Decomposição da variação a seis meses da taxa de juro média | Em pontos percentuais

Notas: O gráfico apresenta, para cada mês, a decomposição da variação semestral da taxa de juro média (ponto cinzento) em diferentes fatores. A decomposição é efetuada mensalmente. Porém, para melhorar a legibilidade, só as informações relativas a janeiro, junho e dezembro são apresentadas.

 

Alterações no enquadramento macroeconómico e financeiro, medidas pelas variações dos efeitos fixos do tempo, são as principais determinantes da variação da taxa de juro média (Gráfico 2). Estes choques contribuíram significativamente para a redução das taxas entre 2013 e 2017, tendo um contributo relevante em 2014 (em dezembro de 2014, a taxa de juro média foi 1 ponto percentual inferior à registada seis meses antes, principalmente devido aos referidos choques). Durante a recente fase de maior restritividade, de junho de 2022 a janeiro de 2023, estes choques foram a principal causa da subida das taxas de juro, refletindo políticas monetárias mais rigorosas e expetativas mais baixas de crescimento do PIB. Em dezembro de 2022, a análise revela um aumento da taxa de juro média de 2,13 pp em comparação com a registada seis meses antes, sendo que 2 pp deste aumento decorrem do choque comum. Mais recentemente, este efeito desvaneceu-se.

De um modo geral, a evolução das variáveis bancárias conduziu a uma diminuição assinalável das taxas de juro até 2020, sobretudo devido à redução dos custos implícitos de financiamento dos bancos, permitindo-lhes oferecer taxas de empréstimo mais baixas às empresas. No entanto, desde o início de 2023, as variáveis bancárias têm contribuído para uma subida das taxas de juro. Em junho de 2023, a taxa de juro média aumentou 1,30 pp face a dezembro de 2022, sendo 0,40 pp deste aumento imputados a variáveis bancárias, principalmente ao custo de financiamento bancário mais elevado e à redução do balanço dos bancos.

O papel da componente da empresa foi relevante em vários períodos de tempo. No início de 2013, as caraterísticas das empresas contribuíram para um aumento das taxas de juro de cerca de 0,16 pp. Durante o período da COVID-19, as caraterísticas das empresas voltaram a contribuir para uma subida das taxas de juro em 0,20 pp, realçando o impacto da pandemia nas condições financeiras das empresas. No entanto, em dezembro de 2020, ocorreu uma mudança e as caraterísticas das empresas contribuíram para uma diminuição das taxas de juro, embora esta redução tenha sido neutralizada por um efeito oposto das caraterísticas dos empréstimos. Antes do recente ciclo de maior restritividade no início de 2022, as caraterísticas das empresas contribuíram para uma queda da taxa de juro. O determinante mais importante da componente das empresas neste exercício é a variação da dimensão média das empresas que acedem ao crédito, ou seja, foi concedido mais crédito a empresas de menor dimensão, às quais são tipicamente cobradas taxas de juro mais elevadas. Apesar de as variáveis financeiras das empresas desempenharem um papel crucial na taxa de juro aplicada aos empréstimos, o seu impacto na flutuação média das taxas de juro é mínimo. Este impacto limitado pode resultar da variabilidade relativamente baixa das médias destas variáveis ao longo do período analisado no presente estudo.

3 Sensibilidade das taxas de juro às condições financeiras das empresas ao longo do tempo

As condições financeiras das empresas afetam a taxa de juro aplicada aos empréstimos. A presente secção explora a forma como a sensibilidade da taxa de juro às condições financeiras das empresas pode variar ao longo do tempo. Em tempos de expansão económica e de menor restritividade das condições financeiras, os bancos poderão ser menos restritivos na determinação da taxa de juro aplicada aos empréstimos, comparativamente a situações em que o enquadramento macroeconómico e financeiro é adverso. Para analisar este tema, a especificação base do modelo é modificada de modo a integrar parâmetros das variáveis financeiras que variem ao longo do tempo. A equação modificada é a seguinte:

IRi,j,b,t,q,y=βq*Leveragej,y1+αq*Cashj,y1Assetsj,y1+γq*EBITDAj,y1Assetsj,y1+μ*Xi,j,b,(torq1)+εi,j,b,t{IR}_{i,j,b,t,q,y} = \beta_{q}*{Leverage}_{j,y - 1} + \alpha_{q}*\fracCash}_{j,y - 1Assets}_{j,y - 1 + \gamma_{q}*\fracEBITDA}_{j,y - 1Assets}_{j,y - 1 + \mu*X_{i,j,b,\ (t\ \text{or}\ q - 1)} + \varepsilon_{i,j,b,t} (3)

em que os coeficientes estimados relativamente a alavancagem (leverage), caixa em relação ao ativo (Cash/Assets) e EBITDA em relação ao ativo (EBITDA/Assets) podem sofrer variações numa frequência trimestralq\ q. Os restantes regressores Xi,j,b,(torq1)X_{i,j,b,\ (t\ \text{or}\ q - 1)} são os mesmos da especificação de base (equação 1).

A sensibilidade da determinação da taxa de juro dos bancos às condições financeiras das empresas (pontos a azul) é apresentada no gráfico 3, onde também constam os parâmetros estimados na especificação de base (linha a vermelho). Ao longo do tempo, a sensibilidade oscila em torno do seu efeito médio, coincidindo num conjunto assinalável de períodos. No entanto, durante alguns períodos, a sensibilidade dos bancos aos indicadores de solidez financeira das empresas afasta-se do seu efeito médio, evidenciando que as estratégias de fixação de preços dos bancos variam ao longo do tempo.

 
  1. Sensibilidades das taxas de juro dos bancos | Em pontos percentuais

Painel A — Sensibilidade da taxa de juro à alavancagem, β̂q{\widehat{\beta_{q}

 

Painel B — Sensibilidade da taxa de juro a Caixa/Ativos, α̂q{\widehat{\alpha_{q}

 

Painel C— Sensibilidade da taxa de juro a EBITDA/Ativos, γ̂q{\widehat{\gamma_{q}

Notas: Cada painel mostra a correspondente sensibilidade das taxas de juro em diferentes momentos do tempo face à alavancagem (Painel A), liquidez (Painel  B) e rendibilidade (Painel C). A sensibilidade (pontos a azul) é estimada utilizando a equação 3. São mostrados os intervalos de confiança de 90%. A linha a vermelho mostra, para cada indicador financeiro, a sensibilidade estimada da versão estática (equação 1).

3.1 Determinantes da sensibilidade da taxa de juro às condições financeiras das empresas ao longo do tempo

A análise centra-se agora nos fatores subjacentes às sensibilidades trimestrais estimadas para diferentes momentos do tempo. As sensibilidades trimestrais β̂q{\widehat{\beta_{q} , α̂q{\widehat{\alpha_{q}\ γ̂q{\widehat{\gamma_{q} são regredidas face a medidas da atividade económica, calculadas a partir do crescimento do PIB (em termos homólogos), e às condições financeiras, medidas pela taxa de rendibilidade da dívida pública a 10 anos de Portugal e pela taxa Euribor a 12 meses. Estas taxas captam a principal evolução e o sentimento nos mercados financeiros, bem como as alterações na política monetária. Além disso, para identificar períodos de incerteza económica e política, aplica-se o índice desenvolvido por Ahir et al. (2022). Esta medida de incerteza visa destacar períodos e acontecimentos específicos, como o choque da COVID-19, que tiveram um impacto negativo na economia.

 
  1. Determinantes das sensibilidades variáveis no tempo

 

Alavancagem 𝛃̂𝐪{\widehat{\mathbf{\beta}_{\mathbf{q  
(1)

 

Caixa/Ativo 𝛂̂𝐪{\widehat{\mathbf{\alpha}_{\mathbf{q  
(2)

EBITDA/Ativo 𝛄̂𝐪{\widehat{\mathbf{\gamma}_{\mathbf{q  
(3)

(Interceção)

0,000

0,000

0,000

 

(0,132)

(0,121)

(0,109)

Crescimento do PIB (homólogo)

-0,104

(0,184)

-0,096

(0,171)

0,479*

(0,195)

Taxa de rendibilidade da dívida pública a 10 anos

0,058

-0,416*

-0,087

 

(0,113)

(0,162)

(0,141)

Euribor a 1 ano

0,455***

(0,110)

-0,323**

(0,097)

0,563***

(0,063)

Incerteza

0,277*

0,114

0,141

 

(0,113)

(0,122)

(0,116)

Num.Obs.

46

46

46

R2 ajust.

0,204

0.331

0,456

F

5,238

9.064

45,931

Nota: São utilizados erros-padrão robustos, + p < 0,1, * p < 0,05, ** p < 0,01, *** p < 0,001. As variáveis dependentes e explicativas são normalizadas.

Em tempos de maior incerteza económica e de maior restritividade das condições financeiras, avaliadas por uma taxa Euribor a 12 meses mais elevada, os bancos revelam uma sensibilidade acrescida a variações na alavancagem das empresas, dado entenderem que o endividamento de uma empresa se torna significativamente mais relevante para a determinação da taxa de juro dos empréstimos, devido ao risco acrescido de não reembolso do mesmo (Quadro 3, coluna 1). A sensibilidade à alavancagem aumentou durante o surto da COVID-19, um período de elevada incerteza económica, enquanto o aumento da sensibilidade no final de 2022 pode estar relacionado com a maior restritividade da política monetária (Painel A do Gráfico 3).

Durante períodos de condições financeiras gerais restritivas (indicadas por taxas de rendibilidade da dívida pública ou taxas Euribor a 1 ano elevadas), os bancos acompanham de forma mais próxima a capacidade das empresas para acomodarem um aumento do serviço da dívida. Um aumento da liquidez das empresas conduz a uma redução mais significativa dos custos dos empréstimos durante estes períodos comparativamente a períodos de menor restritividade das condições financeiras (Quadro 3, coluna 2). Observa-se que os bancos foram mais sensíveis à liquidez das empresas por volta de 2012–2014 e 2022–2023, períodos de maior restritividade das condições financeiras gerais, e menos sensíveis durante o período de taxas de juro baixas/negativas de 2015 a 2021 (Painel B do Gráfico 3).

Em tempos de abrandamento económico, a determinação das taxas de juro é mais sensível à rendibilidade das empresas (Quadro 3, coluna 3). Uma melhoria da rendibilidade das empresas traduz-se numa diminuição mais relevante dos custos dos empréstimos concedidos em períodos de menor crescimento económico. Esta evolução denota a importância do desempenho das empresas na redução dos custos dos empréstimos concedidos em períodos de choques económicos negativos. Além disso, durante períodos de maior restritividade das condições financeiras, indicadas por uma taxa Euribor a 12 meses mais elevada, os bancos reduzem a sua sensibilidade a variações na rendibilidade das empresas.

No painel C do gráfico 3, observa-se que, entre 2012 e 2020, o coeficiente estimado é negativo, indicando uma relação inversa entre a rendibilidade da empresa e as taxas de juro dos empréstimos durante este período. Desde 2021, as taxas de juro tornaram-se menos sensíveis à rendibilidade das empresas, com a sensibilidade a tornar-se mais frequentemente insignificante. É provável que este padrão decorra da perspetiva dos bancos de que, em períodos de maior restritividade das condições financeiras, as vulnerabilidades financeiras das empresas estão mais estreitamente associadas à sua alavancagem e liquidez do que à sua rendibilidade. Nestes períodos, os bancos podem também ser menos sensíveis à rendibilidade passada, dado que um aumento dos custos de financiamento pode ter um impacto negativo na atividade económica e deteriorar as perspetivas de rendibilidade das empresas no futuro.

4 Conclusões

Os resultados mostram que a taxa de juro aplicada aos novos empréstimos tende a ser mais elevada para as empresas mais endividadas e tende a ser mais reduzida para as empresas com maior liquidez e rendibilidade. Além disso, as taxas de juro praticadas pelos bancos parecem responder de forma mais significativa a variações da liquidez do que a variações da alavancagem ou da rendibilidade.

No que respeita aos determinantes da variação da taxa de juro média ao longo do tempo, o choque macroeconómico comum destaca-se como o principal determinante dessa variação, contribuindo de forma significativa para a diminuição das taxas dos empréstimos entre 2013 e 2017 e ao aumento entre junho de 2022 e meados de 2023. Os fatores específicos dos bancos foram relevantes para explicar a redução da taxa de juro média entre 2013 e 2017, devido sobretudo a uma diminuição dos custos de financiamento dos bancos. A partir de janeiro de 2023, a componente bancária tem sido fundamental para impulsionar a subida das taxas, refletindo o efeito desfasado dos aumentos das taxas diretoras do BCE nas variáveis bancárias, em especial o custo de financiamento implícito dos bancos portugueses. As alterações nas caraterísticas das empresas contribuíram para o aumento das taxas de juro aplicadas, nomeadamente durante vários acontecimentos macroeconómicos e financeiros, como a crise da dívida soberana, durante e após a crise da COVID-19, bem como no atual ciclo de maior restritividade das condições financeiras.

Além disso, os resultados apontam para que as sensibilidades da taxa de juro dos empréstimos relativamente às três caraterísticas financeiras das empresas variem ao longo do tempo. Em tempos de elevada incerteza ou de condições financeiras restritivas, os bancos tendem a atribuir mais relevância à alavancagem das empresas, resultando em taxas de juro mais elevadas comparativamente a períodos mais estáveis. Os bancos acompanham mais de perto a liquidez das empresas em períodos de condições financeiras restritivas. Além disso, durante períodos de abrandamento económico, a fixação da taxa de juro pelos bancos revela uma maior sensibilidade à rendibilidade das empresas, ao passo que, num contexto de taxas de juro elevadas, esta sensibilidade é inferior.

Os resultados do presente estudo indicam que, no atual contexto de taxas de juro elevadas, se espera que a liquidez das empresas atenue significativamente os custos do crédito. As empresas com mais liquidez encontram-se em melhor posição para fazer face ao ciclo de maior restritividade em curso e aos aumentos do serviço da dívida. Em particular, registou-se um aumento significativo da sensibilidade das taxas de juro à liquidez das empresas ao longo do último ano. As conclusões sublinham também a necessidade de acompanhar de perto a alavancagem das empresas. A reação das taxas de juro à alavancagem das empresas aumentou no período recente. Caso ocorra um choque económico, conducente a incerteza económica ou a uma maior restritividade das condições financeiras, as SNF com alavancagem substancial enfrentarão custos de financiamento mais elevados. Por último, a sensibilidade na fixação das taxas de juro à rendibilidade das empresas diminuiu recentemente, uma alteração que provavelmente se deve à diminuição das perspetivas de rendibilidade no futuro.

Referências

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Bonfim, D., Dai, Q., e Franco, F. (2018). “The number of bank relationships and borrowing costs: The role of information asymmetries”. Journal of Empirical Finance, vol. 46(C):191–209.

Bonfim, D., Queiró, L., e Farinha, L. (2021). “Heterogeneidade nas taxas de juro dos empréstimos: o papel do capital dos bancos”. Revista de Estudos Económicos, Banco de Portugal.

Cloyne, J., Ferreira, C., Froemel, M., e Surico, P. (2023). “Monetary Policy, Corporate Finance, and Investment”. Journal of the European Economic Association.

Santos, C. (2013). “Taxas de juro bancárias sobre novas operações de empréstimos concedidos a sociedades não financeiras – uma primeira apreciação de um novo conjunto de informação microeconómica”. Revista de Estudos Económicos, Banco de Portugal.


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Política Macroprudencial em diferentes fases do ciclo financeiro: o caso português

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