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O mecanismo de conversão no âmbito do bail-in — 2024

CoverMCABAILIN

Introdução

Objetivos da publicação

Na sua qualidade de autoridade de resolução designada em Portugal, o Banco de Portugal encontra-se habilitado a aplicar um conjunto de medidas e de poderes em casos em que uma instituição de crédito se encontre em risco ou situação de insolvência (“FOLTF”, pela sigla inglesa de failing or likely to fail) e estejam verificados os critérios de interesse público, previstos na legislação aplicável, que justifiquem que seja evitada a sua liquidação.

Entre esses poderes, encontram-se os poderes de determinar a redução ou a conversão de instrumentos de fundos próprios e passivos elegíveis e de aplicar uma medida de recapitalização interna, também conhecida como bail-in.

Em 2023, a Autoridade Bancária Europeia (“EBA”) aprovou e publicou as Orientações n.º 2023/01 — “Orientações às autoridades de resolução sobre a publicação do mecanismo de conversão no âmbito da redução e conversão da recapitalização interna” (as Orientações da EBA”)1.

Estas Orientações fornecem às Autoridades de Resolução (“AR”) um enquadramento para a divulgação de informação sobre a forma como a redução e a conversão de instrumentos de fundos próprios e passivos elegíveis serão aplicadas, em caso de necessidade, i.e. sobre os mecanismos de implementação do bail-in.

As Orientações da EBA estabelecem, nomeadamente, o dever de as autoridades de resolução publicarem uma descrição genérica da sua abordagem à execução da redução ou conversão de instrumentos de capital e passivos incluídos no âmbito da recapitalização interna, desde as etapas preliminares até à execução final do mecanismo de conversão.

A presente publicação visa, portanto, descrever o mecanismo de conversão associado à medida de bail-in, no contexto do sistema bancário português, em cumprimento das Orientações da EBA.

Com isso, pretende-se contribuir para a previsibilidade do mecanismo de conversão, promover a transparência e um maior esclarecimento dos processos associados à medida de bail-in em Portugal e fomentar também a coordenação e o diálogo entre as partes envolvidas na aplicação dessa medida.

O mecanismo descrito nesta publicação e os procedimentos aqui previstos têm por referência um conjunto de pressupostos subjacentes à aplicação de uma medida de resolução com recurso à medida de bail-in. Importa salientar, contudo, que o Banco de Portugal não se encontra limitado à aplicação dessa medida nos moldes aqui descritos e que, na eventualidade de aplicar uma medida de resolução, irá adaptar e selecionar os critérios, termos e modos de implementação mais adequados à situação concreta. A presente publicação não vincula, portanto, o Banco de Portugal a implementar o mecanismo aqui descrito e a execução efetiva dos procedimentos de redução e de conversão pode, numa situação real, diferir do mecanismo apresentado nesta publicação.

Os conteúdos apresentados na presente publicação são também suscetíveis de ser atualizados, alterados e revistos para garantir que este documento se adapta a eventuais evoluções legislativas e à consolidação das práticas relativas ao exercício da função de resolução.

Divisão de competências no âmbito do MUR

No contexto do Mecanismo Único de Resolução (“MUR”), as Autoridades Nacionais de Resolução (“ANR”) participantes repartem as competências de resolução com o Conselho Único de Resolução (“CUR”)2, que é o responsável pelo funcionamento coerente e eficaz do MUR3.

Nesta divisão de competências, cabem ao CUR as funções de resolução4 relativamente a todas as instituições significativas e às instituições designadas de menos significativas5 nos casos em que estas integram um grupo transfronteiriço na União Bancária6. Além disso, compete também ao CUR exercer os poderes de resolução, mesmo quando a instituição visada é uma instituição menos significativa não integrada num grupo transfronteiriço, quando esteja em causa a aplicação de uma medida de resolução em que seja necessário o recurso ao Fundo Único de Resolução (“FUR”).

Por sua vez, as ANR são responsáveis pelas funções de resolução quanto a todas as instituições sobre as quais o CUR não é diretamente responsável, i.e. as instituições menos significativas que não integram nenhum grupo transfronteiriço7.

Sem prejuízo das competências atribuídas às ANR, compete ainda ao CUR, enquanto garante do funcionamento coerente e eficaz de todo o MUR, acompanhar também o exercício das competências exercidas diretamente pelas ANR, relativamente às instituições na sua esfera, podendo decidir, em qualquer momento, exercer diretamente todos os poderes previstos no Regulamento, relativamente a qualquer instituição8,9.

De acordo com o desenho institucional definido pelo RMUR, as decisões do CUR não têm caraterísticas de autoexecução e não produzem os seus efeitos, diretamente, na esfera das instituições. Pelo contrário, as decisões do CUR são dirigidas às ANR, que são as responsáveis pela sua implementação e execução.

Assim, ainda que o Banco de Portugal não seja o responsável pelas decisões de resolução relativas às instituições significativas portuguesas, as descrições constantes nesta publicação são também aplicáveis a estas, uma vez que o Banco de Portugal continua a ser o responsável pela implementação e operacionalização de qualquer medida de resolução em território nacional.

De notar, por último, que o CUR criou uma página com referências para as várias publicações nacionais, acompanhada de um documento de enquadramento, a fim de facilitar a consulta e proporcionar uma visão mais abrangente dos processos nos diversos países da União Bancária10.

A medida de recapitalização interna (bail-in)

O regime jurídico da resolução de instituições de crédito contempla quatro medidas de resolução11:

  • A alienação parcial ou total da atividade da instituição para um terceiro adquirente12;

  • A transferência parcial ou total da atividade da instituição para instituições de transição13;

  • A segregação e transferência parcial ou total da atividade para veículos de gestão de ativos14;

  • A recapitalização interna, mais comummente conhecida como bail-in15.

A medida de bail-in contempla a aplicação, pela AR, do poder de redução, parcial ou total, do valor nominal de instrumentos de fundos próprios e de créditos da instituição de crédito objeto de resolução e a conversão, parcial ou total, de créditos em instrumentos representativos de capital.

Esses poderes são utilizados para absorver perdas da instituição e para restaurar o cumprimento dos requisitos de fundos próprios.

A medida de bail-in é, como são as restantes medidas de resolução, aplicada através de ato administrativo adotado pelo Banco de Portugal.

Para o efeito, a aplicação da medida assenta em dois vetores de atuação distintos por parte do Banco de Portugal, com efeitos jurídicos e contabilísticos produzidos por força da aplicação da medida de resolução:

  • Redução do capital ou de direitos de crédito (passivos) perante a instituição (emergentes de diferentes tipos de negócios jurídicos e de acordo com a sua graduação em insolvência), no montante necessário ao equilíbrio dos passivos e ativos da instituição, através da absorção, por parte do passivo, das perdas registadas no ativo, até que seja atingida a posição líquida de zero;

  • Conversão de direitos de crédito perante a instituição em instrumentos de capital, de forma a permitir que a instituição volte a cumprir com os seus requisitos de fundos próprios. Contabilisticamente, os passivos correspondentes a estes direitos de crédito são eliminados (total ou parcialmente), gerando a criação de reservas (uma vez que a conversão parte já de uma situação líquida neutra, após os efeitos da redução serem gerados), sendo por contrapartida dessas reservas que são emitidas novas ações (ou outros instrumentos representativos de capital).

Intervenientes no processo de implementação do bail-in

Banco de Portugal

O Banco de Portugal foi designado, em 201316, como a autoridade de resolução bancária em Portugal, e, nessa qualidade, a sua missão consiste em assegurar que, em face da ocorrência de desequilíbrios financeiros graves em grupos bancários ou em instituições de crédito, é preservada a estabilidade financeira, com o menor custo possível para o erário público.

O Banco de Portugal integra o MUR e está representado no Conselho Único de Resolução.

Como referido supra, de acordo com a divisão de competências instituída no âmbito do MUR, cabe ao CUR a responsabilidade direta na tomada de todas decisões de resolução para as instituições significativas estabelecidas em Portugal, bem como para qualquer instituição, mesmo que qualifique, nos termos da legislação relevante, como instituição menos significativa, quando esta esteja integrada num grupo transfronteiriço no âmbito da União Bancária ou quando a sua resolução inclua o uso do Fundo Único de Resolução.

Não obstante, de acordo com os artigos 18.º e 29.º do RMUR, a responsabilidade pela implementação de todas as medidas de resolução em Portugal, mesmo que incida sobre uma instituição cuja resolução é decidida pelo CUR, encontra-se na esfera de atuação do Banco de Portugal.

Conselho Único de Resolução

O CUR é a autoridade central de resolução da União Bancária, no âmbito do MUR.

A 1 de janeiro de 2016, o CUR tornou-se responsável pela adoção de decisões de resolução respeitantes às instituições abrangidas por este mecanismo e que estejam na sua esfera de atuação direta (Secção 1.2 supra). Estas decisões são dirigidas às ANR para que sejam implementadas perante as instituições.

Comissão do Mercado de Valores Mobiliários

A Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (“CMVM”) é a entidade reguladora e supervisora dos mercados de valores mobiliários e dos agentes que neles operam em Portugal. No contexto da aplicação de uma medida de bail-in, o Banco de Portugal e a CMVM colaboram para assegurar a eficácia dessas medidas.

Em resolução, o Banco de Portugal pode solicitar à CMVM que esta ordene às infraestruturas de mercado a suspensão ou exclusão da negociação de instrumentos financeiros, bem como a admissão ou readmissão à negociação de instrumentos, conforme necessário17.

O Banco de Portugal publica a decisão de aplicação de uma medida de resolução ou um aviso que resuma essa mesma decisão e respetivos efeitos ou pode solicitar a sua divulgação por outros meios incluindo o sistema de difusão de informação da CMVM18, caso as ações, outros títulos representativos do capital social ou instrumentos de dívida da instituição de crédito objeto de resolução se encontrem admitidos à negociação em mercado regulamentado.

Instituição objeto de resolução

Para efeitos da presente publicação, designa-se por "instituição objeto de resolução" a instituição de crédito sujeita a uma medida de resolução, no caso concreto desta publicação, na modalidade de bail-in.

À instituição objeto de resolução cabem também determinadas responsabilidades e competirá também a execução de determinadas diligências no contexto da implementação e operacionalização do bail-in.

Desde logo, cabe à instituição objeto de resolução fornecer às autoridades de resolução e ao avaliador independente19 as informações e os dados necessários para a tomada de decisões no âmbito da aplicação de medidas de resolução.

Além disso, é responsável por garantir a execução de todas as operações internas à instituição, associadas à implementação da medida de bail-in, o que poderá incluir, para além de um conjunto de movimentos contabilísticos, o apoio ao avaliador, a organização e o tratamento de informação, o estabelecimento de contactos permanentes com as restantes partes interessadas na resolução, entre outros.

Euronext Securities Porto — Central de Valores Mobiliários e Agência Nacional de Numeração

A Euronext Securities Porto é o nome comercial da Interbolsa — Sociedade Gestora de Sistemas de Liquidação e de Sistemas Centralizados de Valores Mobiliários, S. A., que é uma Central de Valores Mobiliários (“CSD” pela sigla inglesa de Central Securities Depository), conforme definido no Regulamento (UE) n.º 909/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de julho de 2014).

No âmbito da resolução bancária, a Euronext Securities Porto pode atuar tanto como CSD emitente ou como CSD investidora.

Uma CSD emitente é uma CSD na qual os títulos são emitidos (ou depositados). Enquanto CSD emitente, a Euronext Securities Porto tem um papel crucial nas alterações dos registos dos instrumentos financeiros afetados pela medida de resolução, seja pela sua redução, conversão ou cancelamento.

Uma CSD investidora abre contas na CSD emitente para possibilitar a liquidação de transações de títulos entre sistemas. A Euronext Securities Porto pode atuar como CSD investidora em relação a títulos emitidos em outros mercados, seguindo as instruções da CSD emitente e propagando nos seus sistemas as alterações que resultem da aplicação da medida de resolução.

A presente versão da publicação assume um cenário em que a Euronext Securities Porto é a CSD emitente, na qual estão depositados os instrumentos relevantes, por ser esta a realidade mais observável em Portugal20,21.

Além das suas funções como central depositária de valores mobiliários, a Euronext Securities Porto atua como Agência Nacional de Numeração de Portugal, sendo responsável pela atribuição dos códigos ISIN (International Securities Identification Number), identificadores internacionais únicos atribuídos a cada título que deposita.

Agente pagador

Os agentes pagadores são intermediários entre entidades emitentes e as CSD. O seu papel é transmitir à CSD instruções do emitente — neste caso, a instituição sujeita à resolução — sobre as transações a serem realizadas nos seus instrumentos financeiros, que estejam depositados nessa CSD.

Algumas instituições bancárias portuguesas cumprem o papel de agente pagador das suas próprias emissões, enquanto outras dependem dos serviços de agentes pagadores externos.

Euronext Lisbon — Gestora de Mercados Regulamentados

A Euronext Lisbon — Sociedade Gestora de Mercados Regulamentados S. A. é uma sociedade gestora de mercados regulamentados, conforme definido na Lei n.º 35/2018, de 20 de julho.

A Euronext Lisbon permite a negociação de instrumentos financeiros, incluindo ações, obrigações, fundos e derivados. Tal como a Euronext Securities Porto, a Euronext Lisbon faz parte do Grupo Euronext. No contexto de um bail-in, a Euronext Lisbon atua como operador de mercado e é responsável por refletir nos seus sistemas os eventos corporativos22 que resultem das medidas tomadas pelas autoridades de resolução.

Para mais informações sobre os principais intervenientes, podem ser visitados os seguintes endereços e utilizados os seguintes contactos:

Elementos caraterizadores na aplicação da medida de bail-in

No caso de vir a ser necessário ao Banco de Portugal aplicar a medida de bail-in, perspetiva-se que o processo de execução dessa medida tenha por base os seguintes elementos caraterizadores:

  • Face à urgência das circunstâncias, perspetiva-se que a decisão do Banco de Portugal tenha por base uma avaliação provisória, nos termos previstos na lei23;

  • Presume-se que a instituição objeto de resolução é uma sociedade anónima, com sede em Portugal, e que as ações da instituição estão registadas em CSD portuguesa, nos termos da regulamentação em vigor;

  • Perspetiva-se que as perdas que será necessário absorver exijam a redução do capital próprio até à sua extinção;

  • Neste quadro, prevê-se que o Banco de Portugal determinaria a emissão de Instrumentos de Resolução Interinos (“IRIS”).

A decisão de resolução tem por base uma avaliação provisória

A decisão de colocar uma instituição em resolução, bem como a escolha da medida, é precedida de duas avaliações ao ativo, passivo e elementos extrapatrimoniais da instituição objeto de resolução.

Estas avaliações incluem os seguintes elementos24:

  • a designada “Avaliação 1”, que visa, no essencial, informar a declaração de que a instituição de crédito se encontra em risco ou situação de insolvência, a primeira condição para a resolução, focando, em particular, na sua situação de solvência e liquidez, nos termos do regime contabilístico e regulatório regular vigente;

  • a “Avaliação 2”, que é realizada a partir da situação financeira demonstrada na Avaliação 1, visa suportar e fundamentar a escolha da medida de resolução a aplicar e determinar, com rigor, as perdas que é necessário absorver, tendo em conta as medidas que se impõem face à situação da instituição. Ao contrário da Avaliação 1, foca-se no valor económico, e não apenas contabilístico, do ativo, passivo e elementos extrapatrimoniais25, a partir da qual a demonstração de posição financeira da instituição apresentará um determinado montante de perdas, a refletir nas demonstrações financeiras da instituição.

Estas avaliações são realizadas por uma entidade independente, nomeada pelo Banco de Portugal, a expensas da instituição objeto de resolução e de acordo com a regulamentação aplicável26.

Para efeitos da caraterização do processo de implementação da medida de bail-in e da presente publicação, assume-se, no entanto, como pressuposto, que, em razão da urgência das circunstâncias, da indisponibilidade de informação contabilística à data ou da impossibilidade de designar um avaliador independente, nos termos da legislação e regulamentação aplicável, não deverá ser possível realizar uma ou ambas as avaliações, em momento anterior à resolução, em condições que possa qualificar tais avaliações como definitivas e independentes — hipótese que se encontra expressamente prevista na lei27.

Neste caso, a decisão de resolução é baseada numa avaliação provisória, que pode ser realizada, quer pelo avaliador independente, quer pelo Banco de Portugal28.

Assim, o Banco de Portugal tomará as suas decisões, ao momento da resolução com base na avaliação provisória, incluindo as decisões quanto à redução do capital e de passivos e quanto à sua conversão.

No caso de ser realizada uma avaliação provisória na aplicação da medida de bail-in, que é, então, o cenário presumido para efeitos da presente publicação, será realizada uma avaliação independente e definitiva após a resolução, a qual apurará, a final e de acordo com os critérios previstos na legislação e regulamentação relevantes, os valores definitivos das perdas e das necessidades de recapitalização da instituição.

Com base nessa avaliação definitiva, o Banco de Portugal deverá então ajustar, se necessário e devido, as taxas de redução e conversão dos acionistas e credores afetados pela resolução, que haviam sido determinadas com base na avaliação provisória.

As participações sociais dos acionistas da instituição de crédito são extintas

A aplicação da medida de bail-in visa a absorção das perdas da instituição de crédito e o reforço dos seus fundos próprios29, na medida suficiente que lhe permita cumprir os requisitos para a manutenção da autorização para o exercício da sua atividade e obter financiamento de forma autónoma e em condições sustentáveis junto dos mercados financeiros, cumprindo as finalidades da resolução e restabelecendo a solidez financeira e a viabilidade a longo prazo da instituição de crédito30.

Para o efeito, e no âmbito do exercício dos poderes de redução ou de conversão de instrumentos de fundos próprios e créditos elegíveis31, necessariamente aplicados antes da aplicação da medida de bail-in32, o Banco de Portugal reduz o capital social da instituição de crédito, por amortização ou redução do valor nominal das suas ações ou títulos representativos do seu capital social33.

As perdas da Avaliação 2 determinam que credores são afetados e em que medida, sendo assumido, para efeitos da presente publicação e exposição, que as perdas que será necessário absorver exijam que todo o capital próprio é reduzido.

Em caso de redução total, que é, então, o cenário assumido para efeitos desta publicação, prevê-se que ocorra o cancelamento das ações e a sua exclusão da negociação em mercado regulamentado ou noutra forma organizada de negociação, de acordo com os procedimentos internos da CSD34.

Para assegurar que a instituição objeto de resolução cumprirá os requisitos para a manutenção da autorização para o exercício da atividade e para o seu financiamento autónomo e sustentável nos mercados financeiros, serão, por efeito da decisão de resolução, convertidos créditos em ações, no montante necessário ao cumprimento das exigências prudenciais.

Dado o requisito legal de uma sociedade anónima ter o seu capital dividido em ações35, e também a necessidade de assegurar que a instituição objeto de resolução cumpre os seus requisitos de fundos próprios, o que obriga a que o seu capital esteja integramente realizado, serão emitidas novas ações, sendo cada nova ação emitida por contrapartida das reservas de capital criadas aquando da conversão dos créditos elegíveis.

Os credores convertidos recebem Instrumentos de Resolução Interinos

Para efeitos da presente publicação, assume-se que a decisão de resolução terá por base — pelas razões enunciadas supra — uma avaliação provisória e que as taxas de redução e de conversão de instrumentos de capital e de passivos apenas serão determinadas, a título definitivo, com base em avaliação definitiva a obter ex-post. Na pendência dessa avaliação definitiva, assume-se que o Banco de Portugal determina a emissão de instrumentos financeiros especificamente criados no âmbito da aplicação da medida de bail-in, designados por IRIS.

Os IRIS serão, portanto, instrumentos emitidos pela instituição objeto de resolução e atribuídos no momento da resolução aos credores cujos créditos foram objeto de conversão, em vez das ações da instituição, que apenas serão atribuídas a esses credores na sequência da determinação definitiva das taxas de conversão, com base na avaliação definitiva. Nesse sentido, os IRIS serão valores mobiliários representativos de um direito potencial do seu titular a receber instrumentos representativos do capital social da instituição que foi objeto da medida de resolução, em número inicialmente indeterminado e que será fixado com a decisão final, do Banco de Portugal, quanto às taxas de redução e de conversão definitivas, com base na Avaliação 2 definitiva.

A utilização de IRIS no âmbito da aplicação da medida de bail-in está sujeita a ponderação a realizar pelo Banco de Portugal ao momento da aplicação de uma medida de resolução.

Os IRIS têm a potencialidade de mitigar as dificuldades que se colocam quando a medida é calibrada com base numa Avaliação 2 provisória e complementada, posteriormente, por uma Avaliação 2 definitiva, na qual é decidida a taxa de conversão final, que é, como se explicou, o pressuposto assumido nesta publicação.

Na ausência de instrumentos intermédios, os credores convertidos receberiam as novas ações emitidas pela instituição objeto de resolução, de acordo com as taxas de conversão apuradas nos termos da avaliação provisória, sendo que, nesse caso, qualquer revisão do montante de perdas a absorver e das necessidades de capitalização que resultasse da avaliação definitiva, a conhecer mais tarde, poderia implicar ajustamentos ao número ou ao valor das ações já entregues.

Existem dois cenários nos quais poderá ser necessário proceder a um ajustamento, por se verificarem diferenças entre as taxas de redução e conversão determinadas no momento da resolução e as taxas de redução e conversão finais, determinadas em momento posterior, após a conclusão da avaliação definitiva:

  • Caso ocorra uma conversão por excesso, no momento da resolução36, a parte correspondente dos créditos convertidos poderá ser restituída através da sua reposição ou aumento do valor nominal37;

  • Caso o nível de absorção de perdas e subsequente recapitalização previamente determinados se revelem insuficientes38 e seja necessário fazer uma conversão adicional, poderão ter de ser realizados ajustamentos nas ações já entregues, uma vez que será necessário converter e integrar novos credores na estrutura acionista.

Estes ajustamentos poderão, contudo, aportar instabilidade aos agentes afetados pelo mecanismo de conversão, além de comportarem significativos riscos operacionais. Esses inconvenientes poderão, portanto, ser mitigados/ultrapassados com o recurso a instrumentos intermédios, que integram no seu funcionamento a incerteza inerente ao hiato temporal entre as avaliações provisória e definitiva e conferem aos seus titulares uma potencial compensação célere e tangível pelos seus créditos convertidos.

A utilização dos IRIS pode ser ponderada, designadamente, quando houver um universo mais heterogéneo e numeroso de credores afetados ou em situações de maior incerteza sobre os resultados das avaliações.

Sublinha-se que o recurso a IRIS terá de ser ponderado e decidido pelo Banco de Portugal perante o cenário de resolução concreto e que a presente publicação não vincula o Banco de Portugal a nenhum modelo de atuação e, mais concretamente, não vincula o Banco de Portugal a utilizar o IRIS, mantendo-se a possibilidade de o Banco de Portugal decidir, perante um caso concreto, pela conversão direta dos créditos em ações.

A implementação da medida de bail-in

Na aplicação de uma medida de resolução, e em particular da medida de bail-in, distinguem-se, em termos gerais, quatro fases distintas:

  • Preparação para a resolução;

  • Execução da decisão de resolução;

  • Período durante o qual o mecanismo de conversão decorre;

  • Fim do procedimento de resolução.

A figura 1 ilustra, de forma simplificada, a sequência destas quatro fases, sinalizando os momentos-chave que ocorrem em cada uma das mesmas.

  1. Cronologia de Resolução

As seguintes subsecções enunciam, por ordem sequencial, as ações que se perspetiva que o Banco de Portugal execute durante a aplicação da medida de bail-in e as suas diferentes fases, pressupondo sempre o cumprimento satisfatório da ação anterior e a previsível evolução do cenário de crise.

Como acima se referiu, o Banco de Portugal não se encontra limitado à aplicação de medidas de resolução nos moldes aqui descritos e, na eventualidade de aplicar uma medida de resolução, irá adaptar e selecionar os critérios, termos e modos de implementação mais adequados à situação concreta.

Preparação para a resolução

Esta subsecção foca o período desde a deteção dos primeiros sinais de dificuldade na instituição de crédito e as ações que a AR empreende a fim de preparar o possível procedimento de resolução. Neste sentido, podem ser identificados os seguintes eventos ou ações principais:

1. A AR identifica a existência de dificuldades financeiras numa instituição de crédito, e aumenta o grau de monitorização sobre aquela instituição. Durante este período inicial, a Autoridade de Supervisão pode, entre outras medidas:

  • Aplicar medidas de intervenção corretiva39;

  • Requerer que a instituição em causa prepare e lhe entregue um plano de reestruturação40.

2. A Autoridade de Supervisão estará em contacto regular com a AR;

3. Iniciam-se os trabalhos internos para fazer face ao caso de crise;

4. A AR designa uma entidade independente para realizar as Avaliações 1 e 2 aos ativos, passivos e elementos extrapatrimoniais da instituição de crédito41;

5. A AR requer à instituição informação para a realização das Avaliações 1 e 2 e poderá, desde este momento, requerer uma proposta para o Plano de Reorganização de Negócio (“PRN”), pós-resolução42;

6. A AR atualiza os dados relativos à instituição de crédito e avalia a adequação do seu plano de resolução;

7. A AR recolhe os resultados da Avaliação 1 e é avaliado, em cooperação com a Autoridade de Supervisão, se a instituição está FOLTF. Em caso positivo, é determinado que a instituição está FOLTF, observando-se as ações seguintes43;

8. A AR realiza as notificações legalmente previstas44;

9. Em razão da urgência das circunstâncias, é realizada uma Avaliação 2 provisória à instituição objeto de resolução, sem prejuízo da realização da Avaliação 2 definitiva por parte do avaliador independente, em momento posterior45;

10. A AR recolhe os resultados da Avaliação 2 provisória e decide os vários elementos necessários à definição da estratégia de resolução a implementar;

11. A AR verifica o cumprimento das condições necessárias à aplicação de medidas de resolução46.

Execução da decisão de resolução

Esta subsecção foca o momento da determinação de medidas de resolução a uma instituição, pelo Banco de Portugal, cujos efeitos se produzem com a publicação da decisão de resolução, detalhando-se, de seguida, os seus conteúdos e as ações a realizar imediatamente após a publicação.

12. A deliberação do Banco de Portugal que coloca a instituição de crédito em resolução deverá conter, designadamente, os seguintes itens:

  • Informação sobre a instituição objeto de resolução;

  • Antecedentes que levaram ao risco ou situação de insolvência da instituição;

  • Medidas de intervenção corretiva aplicadas à instituição, se aplicável;

  • Descrição sumária dos resultados da Avaliação 1 e declaração de FOLTF;

  • Descrição sumária dos resultados da Avaliação 2 provisória;

  • Verificação quanto ao cumprimento das condições necessárias à aplicação de medidas de resolução;

  • Identificação dos poderes de resolução a exercer pelo Banco de Portugal, em conjunto com a medida de resolução47;

  • Eventual decisão sobre a suspensão de obrigações de pagamento ou de entrega emergentes de um negócio jurídico em que a instituição de crédito seja parte48;

  • Eventual decisão sobre a suspensão da negociação de instrumentos financeiros e sua operacionalização, incluindo49:

    • Fundamentação da decisão;

    • Âmbito de aplicação;

    • Data de referência para efeitos de identificação dos instrumentos e aplicação da medida;

    • Uma possível decisão sobre a suspensão do pagamento de transações não liquidadas;

  • Solicitação à CMVM para que ordene50:

    1. A plataforma de negociação a suspender a negociação dos instrumentos51;

    2. A CSD a suspender a liquidação dos instrumentos;

    3. A CSD a registar a redução do valor nominal dos instrumentos;

    4. A CSD a cancelar o registo dos instrumentos que tenham sido totalmente reduzidos52.

  • Termos da medida de bail-in, incluindo:

    1. Fundamentos para a escolha da medida;

    2. Montante de perdas a ser absorvidas pela redução de instrumentos de capital, outros instrumentos de fundos próprios e créditos elegíveis, nos termos da Avaliação 2 provisória;

    3. Montante de capital a aumentar pela conversão de instrumentos de fundos próprios e créditos elegíveis, nos termos da Avaliação 2 provisória;

    4. Créditos discricionariamente excluídas do âmbito do bail-in e justificação da respetiva exclusão53;

    5. Perímetro abrangido pela aplicação do bail-in, listando as classes de créditos afetadas pela medida;

    6. Valores a aplicar na mecânica do bail-in, nos termos da Avaliação 2 provisória, incluindo54:

      1. Taxas de redução aplicadas a cada classe de créditos;

      2. Taxas de conversão entre créditos e ações aplicada a cada classe de créditos.

      3. Valor nominal das ações a emitir;

      4. Taxas de troca entre créditos convertidos e IRIS aplicada a cada classe de créditos, de acordo com a sua posição na hierarquia de insolvência.

    7. Itens relativos ao tratamento dos instrumentos financeiros afetados pela medida, incluindo:

      1. Tratamento de juros corridos;

      2. Pagamento de juros, dividendos e transações não liquidadas;

      3. Indicação do agente pagador da instituição objeto de resolução, que irá transmitir instruções à CSD.

    8. Designação de novos membros para o órgão de administração da instituição objeto de resolução ou decisão justificada sobre a manutenção dos membros existentes55;

    9. Anexos, incluindo, designadamente:

      1. Lista de instrumentos reduzidos ou convertidos no âmbito da aplicação da medida;

      2. Lista de instrumentos afetados pela suspensão de negociação;

      3. Lista de instrumentos afetados pela suspensão de pagamentos;

      4. Termos e Condições do Programa de IRIS.

    10. Publicação e entrada em vigor da decisão.

13. A AR realiza as notificações legalmente previstas56;

14. A AR lança o procedimento de designação de uma entidade independente para realizar as avaliações independentes.

  1. Os temas específicos das transações não liquidadas e das ações fracionadas

A previsibilidade no funcionamento dos mercados é importante durante a aplicação de uma medida de resolução. Uma das formas de garantir essa previsibilidade, no caso concreto da medida de bail-in, poderá ser através da minimização dos desvios face às práticas de mercado existentes. Com efeito, para a CSD e para os mercados, a implementação do bail-in consiste na aplicação de um conjunto de ações semelhantes a certos eventos corporativos, bem definidos, que são aplicados noutros contextos em moldes iguais ou similares.

Nesta caixa clarificamos concretamente dois aspetos da execução por parte da CSD da decisão de resolução pelo Banco de Portugal.

Transações instruídas, mas não liquidadas

As transações instruídas, mas não liquidadas, conhecidas em inglês por “in-flight transactions”, são aquelas que foram iniciadas, mas cujo processo de transferência (ou “liquidação”) ainda não foi concluído.

No caso da aplicação da medida de bail-in, deve, em princípio, assegurar-se que todas as transações instruídas antes da data de efetivação da deliberação de resolução são liquidadas. Após essa liquidação, os efeitos da aplicação da medida de resolução deverão ser integralmente refletidos sobre esses mesmos instrumentos que estavam em processo de liquidação/compensação.

É geralmente reconhecido que a suspensão da liquidação pode ocorrer em vários contextos e na implementação de certos eventos corporativos, podendo facilitar este processo. Ao suspender a liquidação, a CSD evita, por exemplo, a conclusão de uma transferência de titularidade ordenada antes da decisão de resolução, mas apenas completada posteriormente. A suspensão da liquidação é um procedimento comum e conhecido do mercado para apoio a eventos corporativos regulares, pelo que a sua utilização pode também ser ponderada.

Ações fracionadas

Ações fracionadas são frações de uma ação inteira. Quando detentores de instrumentos de dívida convertida recebem, em contrapartida, ações de acordo com as taxas de conversão determinadas na decisão de resolução, poderá ser atribuído um número de ações superior ao número inteiro (por exemplo, 10 125 ações com valor nominal de 1€). Designam-se, então, ações fracionadas a fração que excede o número inteiro, neste exemplo prático 0,125.

De acordo com o Código das Sociedades Comerciais, em concreto, o n.º 3 do artigo 276.º, o valor nominal mínimo das ações ou, na sua falta, o valor de emissão, não pode ser inferior a 1 cêntimo. Estabelecer um valor nominal de cada ação reduzido, nomeadamente de 1 cêntimo, mitiga e, por vezes, elimina a possibilidade de serem criadas ações fracionadas. No entanto, importa reforçar que, tal como é possível observar-se no exemplo dado, mesmo com ações de valor nominal de 1 cêntimo, poderá ser inevitável obter um valor fracionado de ações.

Contudo, em Portugal, apenas é permitida a divisão do capital social de uma entidade num número inteiro de ações (n.º 6 do artigo 276.º do Código das Sociedades Comerciais). Há vários mecanismos para lidar com esta situação, nomeadamente, (i) arredondamento por defeito, (ii) arredondamento por excesso, (iii) arredondamento padrão, isto é, se a fração for maior ou igual a 0,5, utiliza-se o arredondamento por excesso, se for menor que 0,5, utiliza-se o arredondamento por defeito, e (iv) compensação/reembolso do montante correspondente à ação fracionária.

Com vista a maximizar a previsibilidade de uma eventual decisão de resolução, bem como minimizar os desvios às práticas habituais de mercado sempre que possível, no quadro da aplicação de uma medida de resolução, a competente decisão poderá referir expressamente o modo de tratamento de ambas as situações descritas, se relevante, podendo uma das hipóteses ser as CSD utilizarem os mecanismos já previstos nos seus próprios regulamentos e habituais em mercado.

 

Período durante o qual o mecanismo de conversão é aplicado

Esta subsecção foca o período desde a publicação da decisão de resolução até à conclusão da Avaliação 2 definitiva e subsequente alocação das ações aos titulares de IRIS, contendo assim os passos necessários à implementação da medida. Neste sentido, perspetiva-se que o Banco de Portugal:

15. Monitorize as ações realizadas pela instituição objeto de resolução imediatamente após a produção de efeitos da medida de resolução, designadamente:

  • A emissão de novas ações junto da CSD, por contrapartida de reservas criadas na redução dos créditos e respetiva transferência para a conta de títulos do custodiante;

  • A emissão dos IRIS junto da CSD e respetiva transferência para as contas de títulos dos credores convertidos.

16. Mantenha um registo atualizado de titulares de IRIS enquanto estes são transacionados em mercados OTC;

17. Recolha os resultados da Avaliação 2 definitiva e determine, em decisão fundamentada e sujeita a publicação:

  • a taxa de conversão final das ações;

  • a data de suspensão da transação dos IRIS;

  • a data de início e fim do período de troca de IRIS por ações;

  • a data de alocação dos direitos de voto aos novos acionistas.

18. Durante o período de troca de IRIS por ações, consolide e avalie as declarações eletrónicas recebidas;

19. Na data prevista, ou quando atingida a totalidade de ações reclamadas, transfira as ações para as contas de títulos dos titulares de IRIS;

20. Findo o período de troca, poderá vender as ações não reclamadas e guardar a receita proveniente para posterior compensação dos titulares de IRIS que não reclamarem as suas ações dentro do prazo estipulado.

Fim do procedimento de resolução

Esta subsecção foca as ações subsequentes à implementação da medida, assegurando a finalização do procedimento. Neste sentido, perspetiva-se que o Banco de Portugal:

21. Estabilize uma versão final do PRN e monitorize a sua implementação por parte da instituição de crédito;

22. Recolha os resultados da Avaliação 3 e delibere sobre as compensações devidas, ao abrigo do mecanismo NCWO.

Anexo — Caraterísticas e operacionalização dos IRIS

Caso o Banco de Portugal venha considerar adequado o recurso a IRIS no âmbito da aplicação da medida de bail-in, perspetiva-se que o recurso a esses instrumentos siga o seguinte processo:

  • momento da resolução, a instituição visada emite dois instrumentos: (i) novas ações representativas do seu capital social, em número e valor correspondente à calibração das taxas de conversão determinadas, com base na avaliação provisória, e (ii) IRIS, valores mobiliários representativos de um direito potencial do seu titular a receber instrumentos representativos do capital social da instituição que foi objeto da medida de resolução, em número inicialmente indeterminado e que será fixado com a decisão final, do Banco de Portugal, quanto às taxas de redução e de conversão definitivas, com base na Avaliação 2 definitiva;

  • As novas ações da instituição objeto de resolução são entregues ao Banco de Portugal, que se responsabilizará pela custódia das mesmas durante a elaboração da Avaliação 2 definitiva e que se destinam a ser, posteriormente, entregues aos novos acionistas da instituição, i.e. aos credores convertido. A emissão de ações pela instituição, neste momento, de forma concomitante com a emissão de IRIS, justifica-se pela necessidade da instituição objeto de resolução ter ações emitidas e integralmente realizadas, a todo o momento, elegíveis para o cumprimento dos seus requisitos de fundos próprios;

  • Por sua vez, os IRIS são emitidos pela instituição objeto de resolução e atribuídos aos credores convertidos, que os recebem em vez de ações;

  • Numa segunda fase, após concluída a Avaliação 2 definitiva, os IRIS são extintos e os seus titulares recebem as ações da instituição objeto de resolução, já com base nas taxas de conversão determinadas, a final, com base na Avaliação 2 definitiva.

Neste contexto, e para efeitos da presente publicação, são assumidos os seguintes pressupostos do funcionamento dos IRIS:

  • Os IRIS são criados com a decisão administrativa do Banco de Portugal que aplica a medida de resolução, na qual se prevê que conste a previsão da sua utilização e funcionamento, juntamente com a conversão dos créditos em ações, que são emitidas pela instituição objeto de resolução juntamente com os IRIS;

  • O Banco de Portugal aprova igualmente o programa de IRIS a emitir, que contém a informação necessária para efeitos de conhecimento ao mercado das caraterísticas do instrumento, adaptadas ao caso específico;

  • Os IRIS são divididos em classes, correspondentes às classes dos créditos convertidos de acordo com a respetiva graduação em caso de insolvência, a fim de tornar possível a diferenciação entre as taxas aplicáveis a cada classe;

  • Cada unidade de IRIS tem um valor nominal de 1€ e cada credor recebe em IRIS o valor do crédito que detinha no instrumento convertido, independentemente da sua classe57;

  • Os IRIS não são instrumentos de capital, portanto não são contabilizados como instrumentos de fundos próprios principais de nível 1 (“CET1”, pela sigla inglesa de Common Equity Tier 1) da instituição objeto de resolução, que continuam a ser as ações, emitidas aquando da conversão dos créditos, conforme as taxas apuradas com base na avaliação provisória;

  • A taxa de troca de créditos para IRIS é 1:1 em todas as classes. Posteriormente, a taxa de troca58 de IRIS para ações é diferenciada por classe, garantindo que os credores comuns, se abrangidos pelos poderes de conversão, têm uma taxa superior e recebem proporcionalmente mais ações que os credores subordinados59;

  • É solicitado à CSD a atribuição aos IRIS de códigos ISIN, tendo cada classe de IRIS um ISIN diferente60, a fim de facilitar a sua identificação e processamento nos sistemas de liquidação e compensação, nomeadamente ao nível da CSD;

  • Uma vez que estes instrumentos são emitidos num contexto de resolução, assume-se que a emissão dos IRIS está isenta da obrigatoriedade de publicação de prospeto61;

  • A emissão de IRIS é acompanhada dos seus “Termos e Condições”, um documento para efeitos informativos, a aprovar pelo Banco de Portugal no âmbito da aplicação da medida de resolução, que detalha as várias caraterísticas necessárias ao cumprimento dos objetivos da resolução naquele caso em concreto62;

  • Os IRIS de cada classe são representados por um certificado-principal, previsto nos “Termos e Condições” do instrumento e que pode ser utilizado para emitir IRIS dessa classe em diferentes momentos do processo de resolução, se necessário;

  • Os IRIS são emitidos pela instituição objeto de resolução, mas não são visíveis na sua demonstração da posição financeira, uma vez que são um direito potencial às ações, estas sim já contabilizadas como capital próprio;

  • Os IRIS são depositados na CSD, tal como as ações. Não é expectável que a introdução de instrumentos intermédios imponha alterações substanciais ao procedimento normal das CSD, pelo que caso os instrumentos a ser reduzidos e convertidos estejam depositados em outras CSD europeias, admite-se que o processo será sincronizado conforme os procedimentos existentes entre a CSD portuguesa e a rede de CSD europeia e suportado pela comunicação entre autoridades de mercado europeias;

  • Os IRIS são automaticamente alocados a todos os credores convertidos no âmbito da aplicação da medida de resolução, não sendo necessária qualquer intervenção por parte destes para os receberem nas suas respetivas contas de títulos;

  • Durante o período de elaboração da avaliação definitiva, os IRIS são negociáveis em mercados de balcão (mercados OTC, pela sigla inglesa de over-the-counter), conferindo aos seus titulares a possibilidade de vender o instrumento para obter liquidez ou evitar tornar-se acionista da instituição objeto de resolução63;

  • Os IRIS são valores mobiliários escriturais, a fim de garantir a simplificação da transmissão, que pode ser feita por transferência entre contas de registo e maior facilidade na reconstituição da sucessão de titulares;

  • As transações são rastreáveis, de forma a permitir identificar a todo o momento os titulares de IRIS, que pode ser qualquer agente apto a adquirir instrumentos financeiros em mercados de balcão, tendo presente que o direito subjacente a este instrumento é o da aquisição, em número incerto, de ações;

  • Concluída a avaliação definitiva, o Banco de Portugal determina a taxa de conversão final das ações, juntamente com a data de conversão, e estabelece a data de suspensão da transação dos IRIS, para efeitos de operacionalização da sua troca pelas ações. Findo o prazo estipulado, a transação é suspensa e é aberto o período de troca dos IRIS pelas ações, durante o período estabelecido pelo Banco de Portugal;

  • A taxa de conversão final dos credores em acionistas é aplicada por classe e deve respeitar a posição desta na hierarquia de insolvência, garantindo que a conversão confere mais ações às classes de créditos comuns e menos às classes de créditos subordinados64;

  • A alocação de IRIS não prejudica que, caso ocorra uma conversão por excesso no momento inicial, a parte correspondente dos créditos convertidos seja restituída através da sua reposição ou aumento do valor nominal, nos seus termos e condições originais, com a decisão final65;

  • A alocação de ações pode depender da iniciativa dos titulares de IRIS, a quem cabe a responsabilidade de reclamar as ações a que tenham direito por meio de uma declaração eletrónica que contenha a sua identificação, prova da titularidade do direito, prova de que as aprovações regulamentares necessárias foram obtidas e instruções para a entrega efetiva dos instrumentos;

  • A alocação das ações implica a extinção dos IRIS e a transferência das ações do custodiante para a conta de títulos dos titulares, indicada por estes na declaração;

  • As ações não reclamadas são vendidas e a receita proveniente é guardada durante um período alargado, a fim de compensar titulares de IRIS que não tenham reclamado as suas ações dentro do prazo estipulado e contactem o Banco de Portugal posteriormente no sentido de solicitar aquele valor;

  • As ações, juntamente com os seus respetivos direitos, poderão não ser conferidas imediatamente após a entrega e aceitação das declarações, mas sim em conjunto, em data posterior ao fim do período de reclamação das ações, a determinar pelo Banco de Portugal, ou ainda no decorrer deste período, quando a totalidade das ações existentes sejam reclamadas;

  • O processo é concluído com o fim do período de resolução (decidido pelo Banco de Portugal, enquanto autoridade de resolução), com o qual terminam também os efeitos legais de suspensão dos direitos sociais dos acionistas convertidos, o que marca o regresso da instituição ao business as usual.

A figura 2 ilustra um exemplo de como seria o funcionamento dos IRIS ao longo do procedimento, partindo da estrutura do passivo de uma instituição hipotética antes da resolução, a sua troca por classes de IRIS negociáveis e posterior conversão para ações da instituição objeto de resolução, em que ocorreria uma conversão e redução parcial da classe de créditos subordinados e uma conversão total da classe dos créditos comuns.

  1. Funcionamento esquemático dos IRIS