Todos os países europeus, através dos governos e reguladores, estão a criar condições de atratividade para as fintech e os projetos inovadores
Hélder Rosalino
Administrador do Banco de Portugal
Temos assistido, nos últimos anos, a mudanças muito significativas na oferta de serviços financeiros, fruto da disrupção tecnológica, da pressão sofrida pelos bancos para reduzirem custos, da mudança de comportamento dos consumidores e, especialmente, da entrada de novos intervenientes no sistema financeiro as chamadas fintech.
De acordo com estudos recentes, o investimento global em fintech aumentou de nove mil milhões de dólares em 2010 para mais de 30 mil milhões de dólares em 2017. As fintech surgiram em força e atraíram investimentos substanciais, apresentando-se como uma ameaça direta às instituições estabelecidas.
Depois da fase de negação (ainda com alguns seguidores), caracterizada pela ideia de que o sector financeiro é demasiado grande, complexo e protegido para ceder face a novos (e pequenos) concorrentes, os bancos têm vindo a reconhecer que as fintech oferecem oportunidades interessantes para estimular a sua própria transformação digital.
São já muitos os bancos que estão a criar plataformas de cocriação e colaboração com algumas startups financeiras, incorporando, de forma colaborativa, inovação e diferenciação nos seus modelos de negócio. Do mesmo modo, as fintech veem cada vez mais as instituições estabelecidas como possíveis parceiras.
Os bancos beneficiam da capacidade de inovação e disrupção das fintech, bem como da flexibilidade e custo mais reduzido das suas infraestruturas. As fintech beneficiam da solidez, reputação, conhecimento e da escala de negócio que os bancos lhes podem oferecer. Em consequência, o consumidor beneficia de produtos mais baratos, mais adaptados às suas necessidades específicas, mais flexíveis e de utilização mais ágil e conveniente.
De acordo com um inquérito recentemente publicado pela Autoridade Bancária Europeia, os bancos concordam que, desenvolvendo parcerias com fintech, conseguem, em geral, aumentar a sua oferta e receitas. Acreditam também que estas parcerias permitem não só manter os clientes existentes como também atrair novos clientes e diminuir custos.
Os resultados do estudo sugerem, ainda, que a área dos pagamentos pode ser a mais afetada com um impacto negativo na sua rentabilidade.
Em contrapartida, as áreas de banca comercial e de trading são aquelas onde existem mais oportunidades de aumentar receitas ou reduzir custos pela incorporação de soluções oferecidas pelas fintech.
Neste ecossistema de inovação, coloca-se a questão de saber qual deve ser o papel dos reguladores. A esta questão a Comissão Europeia respondeu, em março de 2018, com a apresentação de um Plano de Ação para as Fintech (For a more competitive and innovative European financial sector), tendo em vista promover a competição e, sempre que possível, incentivar a inovação no sector financeiro. Ao mesmo tempo, garantir em todas as circunstâncias a preservação da estabilidade financeira e elevados níveis de proteção dos investidores e dos consumidores.
Este plano de ação reforçou a importância que os reguladores europeus têm vindo a atribuir às fintech e procura criar um ambiente favorável (e controlado) para o seu desenvolvimento, de que são exemplo iniciativas como os Innovation Hubs e as Regulatory Sandboxes, já presentes em vários países.
De um modo geral, todas as jurisdições, através dos respetivos governos e reguladores, estão a criar condições de atratividade para a inovação financeira e para as fintech, reconhecendo que podem oferecer um importante conjunto de vantagens ao sistema financeiro e aos consumidores em geral.
Inspirados nas melhores práticas ao nível europeu e nas recomendações da Comissão Europeia, o Banco de Portugal, a Comissão de Mercado de Valores Mobiliários e a Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões, em parceria com a Portugal Fintech, lançaram, em conjunto, o “Portugal FinLab Onde a regulamentação encontra a inovação”.
Num enquadramento especial “laboratório de regulação para apoio à inovação” , o Portugal FinLab oferece uma visão integrada dos requisitos regulatórios necessários para a implementação de inovações tecnológicas financeiras, promovendo o diálogo direto e interativo dos reguladores com os inovadores, quaisquer que eles sejam.
Para os reguladores, a criação deste laboratório permite-lhes um acompanhamento regular, em ambiente controlado, dos novos projetos e dos seus promotores, aumentando o seu conhecimento sobre as dinâmicas de inovação e reduzindo a incerteza regulatória e eventuais barreiras ao desenvolvimento de novos negócios.
O Portugal FinLab será, acima de tudo, um canal de comunicação privilegiado entre os reguladores e as empresas, eficiente e vocacionado para projetos inovadores, que poderá representar uma vantagem competitiva para atrair empresas internacionais e terá como destinatário qualquer projeto que queira inovar no sector financeiro português, seja uma startup ou um incumbente.
Trata-se de uma iniciativa inovadora e, sobretudo, geradora de valor para o sistema financeiro nacional, que colocará Portugal no radar de investidores e inovadores de outras geografias.