Autoridade Bancária Europeia inicia reflexão pública sobre tratamento dos riscos climáticos e ambientais em sede de requisitos de fundos próprios (Pilar 1)
Enquadramento
A Autoridade Bancária Europeia (EBA, na sigla inglesa) iniciou, no passado dia 2 de maio, uma reflexão pública sobre o tratamento prudencial das exposições relacionadas com objetivos ambientais em sede de requisitos de fundos próprios (ou Pilar 1).
O documento, que estará em consulta pública por um período de três meses (até 2 de agosto de 2022) e se encontra disponível no site da EBA, decorre do mandato que lhe foi atribuído no artigo n.º 501.º-C do Regulamento de Requisitos de Fundos Próprios (CRR) e no artigo 34.º do Regulamento de Requisitos Prudenciais para as Empresas de Investimento (IFR), segundo o qual esta autoridade deve avaliar se se justificará um tratamento prudencial específico para exposições relacionadas com ativos ou atividades substancialmente associados a objetivos ambientais e/ou sociais ou sujeitos a impactos de fatores ambientais e/ou sociais.
O tratamento prudencial dos fatores ESG (environmental, social and governance), sobretudo na dimensão climática e ambiental, insere-se no Plano de Ação da EBA sobre finanças sustentáveis e foi identificado como um dos vetores da estratégia europeia para o financiamento sustentável, em particular:
- no Plano de Ação da Comissão Europeia (Ação 8: “Incorporar a sustentabilidade nos requisitos prudenciais”);
- na Estratégia da Comissão Europeia para o financiamento da transição para uma economia sustentável;
- na revisão em curso do Regulamento (CRR3) e da Diretiva (CRD6) que regulam, entre outras matérias, a determinação de requisitos de fundos próprios aplicáveis às instituições de crédito.
Os riscos associados às alterações climáticas têm impacto sobre o setor bancário, podendo afetar a estabilidade financeira. Conforme reconhecido nos relatórios de 2018 e 2020 da Central Banks and Supervisors Network for Greening the Financial System, estas alterações constituem uma importante fonte de risco financeiro e refletem-se nos riscos prudenciais tradicionais, como seja o risco de crédito. É, assim, oportuno que as autoridades de supervisão e de regulação, no âmbito dos seus mandatos, avaliem se o atual quadro regulatório incorpora adequadamente estas novas fontes de risco ou se são necessárias adaptações (e quais) para preservar a robustez do quadro prudencial e, deste modo, promover a resiliência das instituições ao longo do processo de transição para uma economia mais sustentável.
Principais elementos do documento de consulta pública
O documento de consulta tem como objetivos (i) analisar em que medida o atual quadro regulatório relativo ao cálculo de requisitos de fundos próprios em sede de Pilar 1 contempla os riscos ambientais e (ii) auscultar o mercado sobre as suas expetativas, recolhendo sugestões que a EBA possa considerar no seu relatório final.
Não deixando de reconhecer a relevância das dimensões social e de governação das organizações, o documento da EBA centra-se apenas na vertente ambiental, uma vez que persistem acrescidas limitações de dados e de análises nas primeiras dimensões, por comparação com a gradual evolução das divulgações associadas aos fatores climáticos e ambientais, potenciadas pelos requisitos de divulgação introduzidos pelo Regulamento da Taxonomia. As exposições associadas a objetivos/impactos sociais serão consideradas nas próximas fases de elaboração do relatório final. Encontra-se igualmente prevista uma análise dedicada às empresas de investimento.
Com o intuito de avaliar a eventual necessidade de um tratamento prudencial específico em sede de Pilar 1, a EBA analisa de que forma as regras vigentes para o cálculo de requisitos de fundos próprios já consideram parâmetros que permitem captar os riscos financeiros associados aos fatores ambientais e até que ponto as metodologias atuais já contemplam alguma flexibilidade para a incorporação destes riscos. São exemplos de existência de elementos de flexibilidade a possibilidade de modelização interna de alguns fatores de risco, o recurso a ratings externos e a avaliação de colaterais e de instrumentos financeiros.
A EBA considera que potenciais ajustes das regras prudenciais terão de ser justificados com a manutenção de uma abordagem baseada no risco intrínseco das exposições, afastando a possibilidade de se justificar qualquer alteração apenas com recurso a argumentos de política económica e/ou ambiental.
O documento identifica também desafios que devem ser tidos em conta quando se avaliam riscos ambientais e se pondera uma eventual incorporação no quadro regulatório prudencial. Alguns prendem-se com a identificação e a mensuração dos fatores que permitem discriminar as exposições sujeitas a riscos ambientais mais elevados. Outro constrangimento tem que ver com a relativa escassez de dados quantitativos para uma correta mensuração das perdas que daí possam resultar.
Neste contexto, o documento da EBA explora adaptações específicas que poderão ser incorporadas para melhor refletir as considerações ambientais. Encoraja o debate de utilização de metodologias forward looking, que permitam considerar as especificidades dos riscos ambientais (elevada incerteza, não-linearidade e horizontes longos de eventual materialização) nos elementos estruturantes das atuais regras para cálculo de requisitos de fundos próprios (nomeadamente, a perspetiva de perdas históricas e horizontes temporais de mais curto prazo na calibração de parâmetros de risco).
Por fim, identificam-se as categorias de risco mais suscetíveis de serem impactadas pelos fatores ambientais, para as quais a análise é mais relevante (riscos de crédito, de mercado, operacional e de concentração).