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Intervenção do Administrador Luís Laginha de Sousa na Conferência ASWP/Serralves 2022 – Smart Growth: o Papel da Economia Circular
Muito boa tarde a todos.
Em meu nome e em nome do Banco de Portugal, quero começar por agradecer o convite para estar aqui hoje. Agradeço em particular à Associação Smart Waste Portugal, na pessoa do seu presidente, o Engº Aires Pereira.
É sempre um enorme prazer vir ao Porto e estar no Porto. E quando a vinda inclui um espaço como é o da Fundação Serralves, o prazer é redobrado.
Sei que tenho um desafio particularmente difícil, neste slot que me foi atribuído. E a dificuldade resulta não só de já termos tido um dia longo, mas também de já ter sido partilhada muita e muito relevante informação, por parte de todos os intervenientes anteriores. Acresce ainda a dificuldade que resulta do facto de as intervenções dos Bancos Centrais não serem propriamente associadas à capacidade de fazer vibrar as plateias.
Em condições normais, eu avançaria desde já para o tema da intervenção. No entanto, antes de entrar no tema propriamente dito, permitam-me que partilhe umas palavras que são um imperativo de consciência.
São palavras para expressar profunda solidariedade para com o povo ucraniano. E, através dele, a todos aqueles a quem é negado o direito de viver em Paz no seu próprio País. Esse viver em paz era algo que tínhamos como um dado adquirido na Europa Ocidental, mas a realidade recente veio demonstrar que afinal esse pressuposto não se verifica.
E tendo presente esta nota de solidariedade e os motivos que a justificam, fica por vezes a sensação de que tudo o resto perde relevância perante a magnitude, não só do que tem acontecido e está a acontecer na Ucrânia, mas também perante os riscos inerentes ao que ainda possa vir a acontecer.
Abstrairmo-nos da Guerra na Ucrânia, para falar de outros temas, quase sugere a imagem da Banda de Música a tocar no Titanic. No entanto, mesmo que seja difícil abstrairmo-nos do que se passa na Ucrânia, se nos socorrermos da perspetiva histórica, um dos ensinamentos que podemos retirar dessa perspetiva é que, independentemente das dificuldades da situação, foi sempre possível encontrar uma forma de as ultrapassar, ainda que muitas vezes com um custo avassalador.
É à luz desse foco no futuro que eu gostaria de acreditar que as notas que tenho para partilhar convosco possam fazer um pouco mais de sentido.
E quando se pensa em futuro, o desafio da sustentabilidade – e, em particular, o desafio ligado à dimensão ambiental da sustentabilidade – ocupa um lugar de destaque, senão mesmo o primeiro lugar, em termos de importância.
Exemplo dessa importância é o facto de esse desafio ser muitas vezes descrito como uma existential threat. E para lidar com esta “ameaça existencial”, a chamada “transição verde” tem vindo a ser cada vez mais universalmente aceite como sendo o caminho a seguir.
E é por isso que, especialmente desde a assinatura do Acordo de Paris sobre as alterações climáticas, há pouco mais de seis anos, quer o sistema financeiro, quer os Bancos Centrais, têm vindo a dedicar uma atenção crescente a este tema.
Para exemplificar esta atenção crescente, posso referir uma análise que a revista Economist apresentou recentemente, sobre as intervenções públicas dos banqueiros centrais. Os resultados obtidos indicaram que 29% das intervenções feitas em 2021 continham referências, mais ou menos extensas, ao tema das alterações climáticas. Para comparação, em 2007, o tema foi mencionado em apenas 1% das intervenções.
No entanto, este é um tema que não se esgota apenas nas palavras. Tal como acontece com qualquer atividade económica, que para ser desenvolvida, requer financiamento, a transição verde não só não é exceção, como ainda traz desafios de financiamento que raramente encontraram paralelo na história económica.
Refiro-me à ordem de magnitude, à variedade e à complexidade desse mesmo financiamento.
E por isso é também com muito gosto que venho aqui hoje abordar o tema de “como financiar a sustentabilidade”, enquadrando-o nesta conferência anual que se vai afirmando cada vez mais no panorama da sustentabilidade ESG em Portugal.
Para tentar aproveitar o melhor possível o tempo da minha intervenção, vou concentrar as mensagens em cinco pontos principais, necessariamente sintéticos.
Nos dois primeiros pontos irei recordar e realçar os traços essenciais daquele que é o problema maior que a todos preocupa na esfera da sustentabilidade. Refiro-me ao impacto das alterações climáticas. Mas também irei alargar um pouco mais o âmbito para outros temas que estão a evoluir de forma rápida e consistente na escala das preocupações.
No terceiro e no quarto pontos, irei abordar não apenas o que se pode esperar por parte do sistema financeiro, no contexto da profunda transformação económica que está já em curso, mas também o papel das políticas públicas, incluindo os seus limites.
Por último, como quinto ponto, vou também indicar o que podem fazer e o que estão a fazer os bancos centrais – e nomeadamente o Banco de Portugal – em matéria de sustentabilidade ESG e de alterações climáticas.
Começando pelo primeiro ponto – o problema que mais preocupa na esfera da sustentabilidade, precisamente as alterações climáticas. É já muito vasto o conjunto de análises e projeções que procuram escalpelizar e antever o impacto previsível das alterações climáticas e as implicações para a sociedade e para a economia.
Um dos ângulos mais aprofundados das análises é o da necessidade de dar resposta ao problema, resposta essa que implica ir ao ponto de inverter a tendência secular de aumento das emissões de gases com efeito de estufa e atingir a chamada neutralidade climática.
E abro um parêntesis para dizer que são já vários os Países, entre os quais Portugal, que têm assumido 2050 como o ano até ao qual deve ser atingido esse objetivo de neutralidade climática (ou carbónica, se considerarmos apenas as emissões de CO2).
Relativamente ao conjunto de análises que referi atrás, um dos documentos que merecem destaque é o mais recente relatório do IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change), que é a entidade científica de referência para as alterações climáticas, a funcionar na órbita da ONU. Sem menosprezar toda a riqueza de informação do relatório, há dois elementos, em particular, que justificam um sublinhado.
O primeiro desses elementos é o conceito de orçamento carbónico – ou orçamento climático.
A ciência tem como certo que, no tocante aos gases com efeito de estufa, o que é relevante é a sua concentração acumulada na atmosfera. Isto significa que é o stock, mais do que o fluxo anual de emissões, que é importante para determinar o ritmo e o grau do aquecimento global.
Partindo desta certeza científica, o relatório estima que, para viabilizar o limite de aumento de temperatura em 1,5°C, isso implica que o stock de gases com efeito de estufa na atmosfera não poderia aumentar mais do que cerca de 500 Gigatoneladas (Gt) relativamente ao valor acumulado até 2019.
Ou seja, o nosso orçamento climático comum, à escala planetária, é de 500 Gt.
Se este patamar for atingido, seria necessário assegurar emissões líquidas nulas para evitar que a temperatura global subisse mais do que 1,5°C. Com estes dados, a dimensão do desafio está perfeitamente clara: ao ritmo atual, que é de aproximadamente 59 Gt de novas emissões líquidas por ano, o orçamento climático irá esgotar-se já por volta de 2028.
O segundo elemento que gostaria de destacar do relatório do IPCC é a abordagem alargada que o relatório faz às formas de dar resposta ao desafio.
E nesta abordagem cabe, por exemplo, a remoção do dióxido de carbono da atmosfera, através de vias como a tradicional plantação de árvores ou diversas formas de captura e armazenamento de carbono.
Mas cabe também um contributo crucial ao nível de uma mudança real nos padrões de comportamento individuais e em formas concretas de funcionamento da sociedade e da economia. Se essa mudança acontecer, as estimativas apontam para a possibilidade de uma redução de 40 a 70% das emissões anuais, até ao horizonte de 2050.
Claramente, a ideia de economia circular, que nos traz aqui hoje, enquadra-se nesta mudança que é necessária para reduzir as emissões de GEE /GHG.
Como se não bastasse o desafio das alterações climáticas e da necessidade de evoluir para uma economia hipocarbónica, há um outro tema que tem vindo a crescer de importância e é esse tema que me leva ao segundo ponto que gostaria de partilhar convosco. É o tema da perda de biodiversidade.
A perda de biodiversidade foi considerada o terceiro maior risco global, em termos de impacto a dez anos, nos Surveys de 2021 e 2022 do Fórum Económico Mundial. A título de curiosidade, o primeiro dos riscos em 2021 foi o de um eventual fracasso da ação climática.
A perda de biodiversidade, para além de contribuir para o aquecimento global, afeta também a capacidade dos ecossistemas para prestarem um conjunto de serviços fundamentais à economia. É o caso do abastecimento de alimentos e matérias-primas ou dos chamados serviços de regulação dos ecossistemas, como a polinização.
Em relação à polinização, é uma atividade para a qual não existe um substituto tecnicamente viável. Estima-se que o valor económico da polinização possa ser de 5 a 8% do valor de mercado das culturas agrícolas globais.
Tudo o que referi, como creio será facilmente percetível, envolve matérias que ainda não são familiares para os bancos centrais, mas em relação às quais o caminho está a ser feito.
E apesar de a abordagem principal dos Bancos Centrais ser a de olhar para a realidade com o filtro das preocupações, sobretudo no sentido de identificar os potenciais riscos para a estabilidade financeira, há diversos elementos desta temática que se podem traduzir em oportunidades e benefícios relevantes para um país com as caraterísticas de Portugal.
Basta, por exemplo, ter presente que a nossa vasta zona económica exclusiva (ZEE) presta serviços efetivos de biodiversidade a toda humanidade. E se assim é, estes serviços podem e devem ter uma tradução em termos de compensação financeira.
Dentro desta mesma linha de raciocínio, e voltando ao tema das alterações climáticas, o potencial de captura de carbono da nossa ZEE pode ser uma enorme oportunidade. Sobretudo se o mercado de licenças de carbono se tornar cada vez mais desenvolvido e abrangente. Essa foi, aliás, uma das linhas de orientação que resultaram da COP-26.
Uma via crucial para contrariar a perda de biodiversidade é fomentar a possibilidade de os ecossistemas poderem ser também fonte de rendimento. E, já agora, que esse rendimento seja tanto maior quanto mais saudáveis estiverem os ecossistemas. Encontrar formas de atribuir o rendimento a quem preserva ou aumenta o capital natural e cobrar o preço adequado a quem utiliza e consome esse mesmo capital natural é o que a teoria económica sugere que seja feito.
Dito de outra maneira, e pensando por exemplo nos terrenos florestais do interior, se se reconhecer que é importante a sua preservação, talvez fosse interessante encontrar forma de remunerar quem preserve essas zonas. Porventura por contrapartida de um custo a suportar por atividades ou agentes económicos que consumam o capital natural.
No plano conceptual, lidar com estas questões é relativamente simples. No entanto, a operacionalização do conceito é tudo menos fácil e requer que estejam reunidas várias condições. Uma dessas condições, porventura a mais importante, é temos a capacidade de medir o capital natural.
E com esta nota gostaria de passar agora ao terceiro dos cinco pontos que referi inicialmente.
Trata-se do ponto relativo ao sistema financeiro. Mais concretamente, do que se pode esperar por parte do sistema financeiro, no contexto da profunda transformação económica que está já em curso.
Essa transformação é inevitável para que a economia possa percorrer o caminho da chamada transição energética, que é o caminho que nos pode levar até à neutralidade carbónica.
Isto significa que se este caminho envolve transformações muito alargadas e profundas, então seremos inevitavelmente confrontados com a necessidade de efetuar investimentos de grandes proporções. Investimentos esses que, para serem concretizados, terão que ser financiados.
Há várias abordagens que procuram quantificar este desafio, mas vou referir apenas duas, feitas por entidades de referência, como são o BEI (Banco Europeu de Investimento) e o FMI.
No caso do BEI, a estimativa que faz é no sentido de que a União Europeia vai necessitar de investimentos adicionais equivalentes a 2,1% do PIB, por ano se quiser alcançar o objetivo de reduzir em 55% as emissões de gases com efeito de estufa até 2030.
No caso do Fundo Monetário Internacional, as estimativas que o Fundo apresentou, e que até considerou conservadoras, apontavam para investimentos adicionais de 0,6 a 1% do PIB global em cada ano, para se conseguir atingir a neutralidade climática em 2050.
E convém ainda ter em conta três elementos em relação a estas duas estimativas:
- Trata-se de valores incrementais, ou seja, acrescem aos investimentos brutos para substituir o capital produtivo, que teriam de ser realizados de qualquer forma.
- Será um esforço a sustentar ao longo de décadas.
- Por último, tratando-se de valores globais, isso significa que para alguns países e setores o esforço terá que ser substancialmente maior do que para outros.
Perante valores desta ordem de grandeza, o investimento público tem certamente o seu lugar, mas deverá ser acompanhado por um volume maior de investimento privado.
E é aqui que se torna crucial a participação do setor financeiro, ao qual cabe viabilizar e canalizar esse investimento. Esta responsabilidade do setor financeiro privado, apesar de poder e dever ser encarada como uma enorme oportunidade, tem várias implicações. Não sendo possível abordar todas, vou salientar duas que me parecem especialmente relevantes:
- Em primeiro lugar, os contornos do investimento terão que ser ajustados. Tipicamente, os projetos de investimento sustentável lidam com tecnologias inovadoras, envolvem custos consideráveis em I&D, incorporam uma forte intensidade de capital e apresentam horizontes de concretização muito longos, não raramente ao longo de décadas.
São caraterísticas que requerem instrumentos que vão muito para além dos que são disponibilizados pelos tradicionais mercados de crédito bancário e de obrigações. São necessários instrumentos de capital, quase-capital, capital de risco e outras modalidades de financiamento menos correntes, sobretudo na Europa. - Em segundo lugar, é necessário assegurar uma boa avaliação dos riscos e oportunidades suscitados pela transição energética, de modo a colocar o pricing certo no financiamento. E, para isso, há um longo caminho a percorrer em termos de disponibilidade, qualidade, comparabilidade e custo dos dados. Que são um elemento crítico para uma boa avaliação dos riscos e das oportunidades que referi há pouco.
Esta é uma das áreas em que há latitude para intervenção das autoridades públicas, incluindo os bancos centrais. E esta referência permite-me fazer a ponte com o quarto ponto que queria partilhar convosco.
É o ponto relativo quer ao espaço de atuação quer aos limites das políticas públicas.
Creio que faz todo o sentido começar por referir aquele que é um papel insubstituível das políticas públicas. Trata-se da capacidade de lidar com as chamadas externalidades negativas. Entendidas aqui como as situações que resultam do facto de o custo privado de certas atividades ficar abaixo, ou mesmo muito abaixo, do seu verdadeiro custo social.
E para os economistas, as alterações climáticas ou a degradação do capital natural podem ser explicadas como sendo um problema de externalidades.
A forma de corrigir o problema das externalidades, apesar de poder ser baseada no funcionamento do mercado, só pode ser assegurada e liderada pelos poderes políticos, pelos governos. Porque são eles que têm a legitimidade para atuar e são também eles que dispõem dos instrumentos mais eficazes para esse efeito. Refiro-me, por exemplo, aos impostos sobre o carbono ou às licenças de emissão.
Estes exemplos devem existir em paralelo com uma regulamentação ambiental mais estrita, mas que seja bem calibrada e não penalize injustificadamente a atividade empresarial criadora de riqueza.
Os governos podem igualmente exercer uma função importante no incentivo às atividades ambientalmente sustentáveis. Por exemplo, recorrendo – de forma equilibrada – a subsídios orientados para a promoção da inovação “verde” ou a investimentos públicos em infraestruturas “verdes”.
Também não podemos ignorar os custos destas políticas – que são muito significativos e desiguais, além de estarem já bem visíveis. Por isso, para assegurar que a transição é compreendida e aceite pelos cidadãos, os governos terão que adotar políticas redistributivas que compensem os que são mais afetados pela transição climática. Sejam as famílias, as regiões ou até mesmo os países.
Apesar do papel incontornável dos governos e das políticas públicas, a dimensão dos desafios da sustentabilidade, das alterações climáticas, da perda de biodiversidade e da transição energética requer que todos se sintam convocados.
E naturalmente que os Bancos Centrais não podiam alhear-se deste tema. Por isso, deixei a última nota a partilhar convosco justamente para abordar o papel dos Bancos Centrais.
Gostaria de começar por referir que, desde há alguns anos, o tema da sustentabilidade e em particular o das alterações climáticas entrou pela porta principal dos Bancos Centrais. E nunca mais de lá saiu.
O momento decisivo para que os Bancos Centrais começassem a olhar muito a sério para o tema foi quando se tornou claro que fenómenos como o das alterações climáticas são uma importante fonte de risco para as instituições financeiras. Sejam elas bancos, seguradoras ou gestoras de ativos e de fundos de pensões.
Se, aos riscos associados às alterações climáticas, juntarmos os relativos à transição energética e à perda de biodiversidade, facilmente percebemos que todas estas questões afetam as economias e as sociedades de forma transversal e profunda.
Nessa medida, têm um impacto material sobre o mandato dos bancos centrais, em particular na esfera da estabilidade financeira, mas também no domínio da política monetária.
Os chamados riscos físicos e de transição, associados às alterações climáticas, podem comprometer a estabilidade financeira, desde logo ao induzirem a desvalorização de ativos. Quer esses ativos tenham sido diretamente financiados pelo sistema bancário, quer estejam dados como garantia de empréstimos, quer integrem as carteiras dos fundos de investimento, ou quer ainda estejam cobertos pelas seguradoras.
No caso concreto do Banco de Portugal, temos vindo a alocar cada vez mais recursos – humanos, técnicos e financeiros – para corresponder da melhor maneira possível ao mandato que nos foi confiado.
Tem sido dada uma especial prioridade a dois aspetos:
- Um é aprofundar o conhecimento sobre os riscos económicos e financeiros decorrentes das alterações climáticas.
- O outro é procurar avaliar a exposição e a resiliência do sistema bancário português a esses riscos.
Ao nível da supervisão, justifica-se também assinalar duas iniciativas:
- Uma foi o facto de terem sido definidas as expectativas de supervisão sobre a gestão dos riscos climáticos pela banca, expectativas essas que foram alargadas ao conjunto das instituições bancárias a operar em Portugal.
- A outra iniciativa tem a ver com o teste de esforço climático às instituições bancárias de maior dimensão na área do euro, cuja realização está a ser preparada.
Para além das implicações para a estabilidade financeira e para a supervisão, as alterações climáticas e a transição energética afetam também um conjunto de variáveis macroeconómicas que são fundamentais para o enquadramento em que se concretiza a condução da política monetária.
Neste âmbito, o que o Banco está a fazer é participar ativamente no plano de ação definido pelo BCE para adaptar esse enquadramento (aperfeiçoamento dos modelos e das metodologias subjacentes à política monetária).
Há ainda duas outras áreas em que os bancos centrais não só podem, mas também devem contribuir.
- A primeira é a redução da sua própria pegada ecológica. Seja no domínio operacional, como qualquer outra organização, seja também na gestão das suas carteiras de ativos próprios. Ou até nos mecanismos e procedimentos para a emissão de notas e moedas, já que somos um dos Bancos Centrais que têm uma fábrica de notas, a produzir não só para Portugal, mas também para o exterior.
- A segunda área em que a contribuição do Banco assume também uma grande importância, é a função de investigação e aconselhamento dos governos no domínio económico e financeiro. Sobre este ponto, teria muitas referências a fazer.
Em relação a estudos já publicados, a outros que estão em preparação, aos variados contributos técnicos que têm sido prestados, ou até à participação ativa no projeto coordenado pela Agência Portuguesa do Ambiente, para avaliar a vulnerabilidade do território nacional às alterações climáticas no século XXI.
Mas para não me alongar em detalhes, deixo antes o convite a todos os interessados para visitarem o site oficial do Banco de Portugal onde podem encontrar uma secção dedicada a estas questões. A secção tem uma designação fácil de recordar, que é precisamente “Sustentabilidade”.
E com esta sugestão chego ao fim dos cinco pontos que tinha para partilhar convosco.
Antes de terminar, quero deixar, em jeito de conclusão, três notas finais muito breves. São três notas que resultam do receio de poder ter ficado a impressão de que uma grande parte do que eu disse ao longo da minha intervenção não está ligada ao tema deste ponto da conferência. Recordo que esse tema era: “Como financiar a sustentabilidade?”
Por isso, a primeira nota é para recuperar duas expressões que são dois dos “mantras” do universo das finanças corporativas (no sentido de corporate finance). Uma das expressões é a que refere que “quanto mais arriscada é a atividade, mais sólida deve ser a estrutura de financiamento”. A outra expressão é a que refere que “o nível de retorno está associado ao nível de risco”.
A conclusão que se retira da conjugação destas duas expressões, sendo óbvia, deve ser sublinhada. E é no sentido de que, perante os riscos e as oportunidades que estão associados às alterações climáticas, à transição energética e à perda de biodiversidade, é absolutamente crítico que se encontrem formas de incentivar o acesso a capital. Apesar de essa palavra, em Portugal, ser geradora de sentimentos muito negativos.
A segunda nota que queria deixar é para sublinhar que, apesar de serem incontornáveis as necessidades de financiamento que resultam do imperativo de fazer face aos riscos que referi há pouco, não é menos verdade que essas necessidades podem ser substancialmente mitigadas.
Seja através de um avanço na gestão do capital natural, seja pela incorporação das externalidades, negativas e positivas, nos preços dos bens e serviços. Seja ainda, e não menos importante, pelo fomento da economia circular, como tão bem nos lembra esta conferência.
A última nota é o que os anglo-saxónicos diriam como “very close to the heart”. É para realçar que as muitas e muito importantes decisões que os vários agentes económicos vão ter que tomar devem ser baseadas em dados sólidos e abrangentes.
Aí temos seguramente um caminho a percorrer, que é aliás um caminho comum a todos os nossos parceiros internacionais. E esse caminho é crucial para assegurar que estamos alinhados com a frase que consta no vitral do Instituto Nacional de Estatística e que traduz fielmente esta minha última nota.
É uma frase que diz “nos números, a prosperidade.”
E com isto termino, agradecendo uma vez mais a vossa atenção e o convite que me foi endereçado para estar aqui convosco.